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Portugal combate MFG

João Carlos (Lisboa)5 de fevereiro de 2016

A mutilação genital feminina, praticada em 50 países de África, Ásia e Médio Oriente, por vezes também é importada para países ocidentais. Em 2015, Portugal introduziu uma lei que a criminaliza. Terá sido o bastante?

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Foto: picture-alliance/dpa/Unicef/Holt

Assinala-se no sábado, 6 de fevereiro, o Dia Internacional da Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina (MGF). Esta prática que arruína a vida de crianças e mulheres acabou por aparecer também em países que a desconheciam por completo, devido à imigração e à chegada de requerentes de asilo. É o caso da Alemanha e da Inglaterra, mas também de Espanha e Portugal, como referem alguns estudos.

Em 2015 entrou em vigor em Portugal a lei que criminaliza a mutilação genital feminina. Mas a lei só por si não basta para precaver a prática. Especialistas dizem que a informação e a sensibilização dos cidadãos, com o apoio das associações de imigrantes, são essenciais para a prevenção contra a MFG, considerada uma das formas de violência contra as mulheres ao abrigo da Convenção de Istambul para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica.

Prática oculta

O artigo 144 – A do Código Penal português estabelece que "Quem mutilar genitalmente, total ou parcialmente, pessoa do sexo feminino (…) é punido com pena de prisão de 2 a 10 anos".

Sensibilisierungskampagne gegen weibliche Genitalverstümmelung Guinea-Bissau
A Guiné-Bissau leva a cabo campanhas de sensibilização contra a MGF, que constitui um crime no paísFoto: DW/Projeto Djinopi

A lei nº 83 de 2015, que criminaliza a MGF, entrou em vigor em setembro do ano passado. Mas até hoje não são conhecidos em Portugal casos de condenação ou processos em fase de investigação pela Justiça portuguesa. A DW África falou a propósito com a presidente da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género, Fátima Duarte, que explica:

"A prática, como se diz, é oculta". Duarte diz que os casos que têm vindo a lume são de pessoas que "são levadas aos seus países para que a prática seja aí levada a cabo". Foi o que aconteceu num caso "que veio a lume salvo erro há uns dois ou três anos. Um emigrante, neste caso guineense, levou duas sobrinhas, salvo erro, ainda crianças, à Guiné-Bissau, e ali acabou por ser detido, uma vez que, como se sabe, a mutilação genital feminina neste momento também já é criminalizada na Guiné-Bissau."

50% de prevalência na Guiné-Bissau

Antes da alteração do Código Penal em Portugal, os poucos casos em adolescentes que, por via indireta, chegaram ao conhecimento dos tribunais, aconteceram fora do território nacional e acabaram por ser arquivados. Fátima Duarte diz que se admite que a prática ainda possa ser levada a cabo em território nacional, mas salienta que "não temos evidências dessa circunstância".

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), a Guiné-Bissau não é considerada dos países de risco elevado desta prática. Tendo uma população imigrante com forte peso em Portugal, a Guiné-Bissau situa-se nos 50 por cento ao nível de prevalência global da MGF, precisa a investigadora do Observatório Nacional de Violência e Género, Dalila Cerejo. "Portanto, esbarra no limite daquilo que é a taxa nos países considerados de prevalência baixa a moderada".

Guinea-Bissau - Imam-Ausbildung
Entre as medidas tomadas pela Guiné-Bissau contra a MGF está a formação de imãsFoto: TARGET

Juventude já rejeita a prática

Os dados do Observatório referidos por Dalila Cerejo dizem que, em Portugal, o número de mulheres em idade fértil, ou seja, entre os 15 e os 49 anos, que terão sido submetidas à prática da MGF, situa-se nos 5.246. Para além do período fértil, estima-se que 6.576 mulheres com mais de 15 anos de idade a viverem em território nacional tenham já sido submetidas a essa prática.

Do ponto de vista científico, há em Portugal mulheres, meninas e crianças oriundas dos países onde se pratica a MGF que foram vítimas deste ato de violência de género, afirma Dalila Cerejo, da equipa da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, coordenadora do primeiro estudo sobre a prevalência da MGF - "Mutilação Genital Feminina: Prevalências, Dinâmicas Socioculturais e Recomendações para a sua Eliminação" - apresentado em 2015: "E o que percebemos é que nos indivíduos mais jovens, tanto os rapazes como as raparigas, já há uma forte e assertiva condenação da prática. E isso para nós já é um bom sinal".

Não se tem atuado só na frente penal. A expetativa da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género e os parceiros envolvidos no combate à MGF está precisamente nos resultados da prevenção. Entre outras ações, implica a formação de profissionais de saúde, dos agentes policiais e um trabalho mais eficaz de sensibilização junto das comunidades imigrantes, principalmente nas áreas de maior concentração de população oriunda de países onde a prática da MGF está enraizada, sobretudo nos distritos de Lisboa, Setúbal, Porto e Faro.

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Objetivo: erradicação

Segundo Fátima Duarte, "tem havido aqui, quer na Escola Superior de Enfermagem de Lisboa, quer também num pólo em Setúbal, cursos de pós-graduação para pessoal de enfermagem e pessoal médico, para que eles possam detetar casos de mutilação genital feminina e possam servir, digamos, de preventores do risco. A grande expetativa será que a mutilação genital feminina não venha a ser praticada".

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