Presidente da Sala da Paz ameaçado de morte em Nampula
17 de outubro de 2018Em Nampula, continuam a surgir denúncias de ameaças a figuras envolvidas no processo de votação nas eleições autárquicas da última quarta-feira (10.10), que conduziu à vitória da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), o principal partido da oposição.
À semelhança de jornalistas e gestores das rádios católicas Watana e Encontro, também parceiras da DW África, o presidente da Sala da Paz, António Mutoa, diz estar a receber ameaças de morte e de sequestro da sua família.
Indivíduos desconhecidos acusam a organização de financiar as rádios para contribuírem para a derrota da FRELIMO nas autárquicas de 10 de outubro. "Disseram que eu, já que não me comunico [por desligar sempre telefone], vão buscar os meus filhos e a minha esposa e daí eu poderei aparecer. Não sei para onde me querem levar", contou em entrevista à DW África.
António Mutoa, que é também diretor-executivo da Solidariedade Moçambique, organização que preside à Sala da Paz, apela à consciência aos políticos. "Os votos que estão sendo expressos são da população moçambicana, é a vontade popular e essa consciência tem de ficar patente", sublinha.
"O povo já disse basta"
"O que eu aconselho, se é o partido FRELIMO que nos manda intimidar, é que o povo já disse basta e o que nós queremos é aquilo que nós queremos", acrescenta o presidente da Sala da Paz.
Apesar de estar quase sempre incontactável, temendo novas ameaças, António Mutoa afirma que está seguro e a trabalhar. Diz que não precisa de segurança policial porque já deixou de confiar na polícia. E promete que não vai vergar na sua missão de trabalhar para garantir que os processos eleitorais no país sejam livres, justos e transparentes.
"Se me ameaçam a mim é porque toda Sala da Paz fica ameaçada, mas a organização continuará a desenvolver o seu papel, porque a Sala da Paz não está a favorecer ninguém. Ainda agora estamos a espalhar a organização para todo o país em 2019 [nas eleições gerais]", assegura.
Intimidação pós-eleitoral
António Muajerene, académico e observador eleitoral em Nampula, entende que o clima de intimidação pós-eleitoral resulta da debilidade das instituições. "Nós já nos habituámos a que depois de cada processo eleitoral, invariavelmente, temos tido situações de conflitos pós-eleitorais.
E lembra que não é um fenómeno recente: sejam eleições gerais ou autárquicas, "há reedição de um ambiente de tensão e isso é caracterizado pela debilidade das instituições que deviam assegurar a legitimidade dos processos".
Para Muajerene, o problema está também no facto de haver quem não se sinta preparado para a alternância política na governação em Nampula. "O contexto monopartidário que vivíamos no passado faz com que isso predomine em determinadas mentes, em situações em que o poder está a ser ameaçado de situações de alternância", explica.
"Há normalmente caça às bruxas e isso tem sido visto em quase todos os processos eleitorais, o que faz com que os espaços da liberdade e exercício da cidadania sejam constrangidos, o que implica, não só as ameaças, mas ativistas e, neste caso, também padres que são ameaçados directamente", lembra ainda o observador eleitoral.