Quais os perigos do colapso da barragem no sul da Ucrânia?
7 de junho de 2023"Dezasseis comportas, o edifício da central hidroelétrica e o dique entre o prédio e a eclusa estão destruídos. A central não poderá ser restaurada", avalia Ihor Syrota, diretor da empresa ucraniana Ukrhydroenergo, a que pertencem as instalações em Kakhovka.
Segundo Kiev, a destruição coloca quase 80 localidades sob risco de inundação, com um total de 42 mil potenciais vítimas.
Situada no sul da Ucrânia, a central de Kakhovka foi ocupada pelos russos logo no início da guerra, a 24 de fevereiro de 2022. Em outubro, de acordo com dados dos serviços secretos ucranianos, foi "completamente minada" pelas forças armadas russas.
"Estamos ocupados com a retirada dos habitantes das áreas inundadas. No momento, está a ser evacuado o bairro Ostriv, na cidade de Kherson", comunicou o primeiro-ministro Denys Schmyhal na plataforma de mensagens Telegram. Segundo ele, comboios especiais estão a transportar os atingidos para Mykolaiv.
Dados da proteção civil indicam que, até à tarde desta terça-feira (06.06), 1.300 habitantes haviam sido retirados por equipas de resgate, polícias e voluntários. Na margem direita do rio Dnipro, na região de Kherson, sob controlo de tropas ucranianas, a situação não é crítica, pois a área é mais elevada do que na margem oposta.
Enchente avança rapidamente
As autoridades ucranianas alertam que a água que jorra da barragem destruída poderá levar consigo minas deixadas pelas tropas russas até localidades alagadas.
"As barricadas de minas que o inimigo ergueu na margem esquerda foram destruídas pela água. As minas explodem descontroladamente e estão a boiar a toda a largura do rio", informou na televisão Nataliya Gumenyuk, porta-voz das forças de defesa do sul.
Volodymyr Kovalenko, autarca de Nova Kakhovka, situada a apenas cinco quilómetros da central e sob ocupação russa, relatou à imprensa nacional que a cidade está em vias de ser inundada rapidamente: "A devastação pela torrente de água é grande".
A marina, o clube de iates, o jardim zoológico e o parque municipal já estariam submersos. Devido à ocupação, porém, é difícil obter informações; além disso, as conexões de Internet estão interrompidas.
As tropas de Moscovo na área ocupada de Kherson afirmam não haver riscos para os moradores das localidades na margem do Dnipro: "Segundo informações da defesa civil, abaixo da hidroelétrica, a água subiu de dois a quatro metros, o que não representa perigo para as cidades maiores a jusante", afirmou o autoproclamado "chefe de governo" da zona de Kherson sob ocupação russa.
Perigo de falta de água potável
A operadora Ukrhydroenergo calcula que, dentro de quatro dias, toda a água do reservatório já tenha fluído para o Dnipro. Totalizando cerca de 18 mil milhões de metros cúbicos, esse volume terá consequências catastróficas para a região.
"O reservatório de Kakhovka esvaziar-se-á muito depressa. O resultado será solo devastado, com lama e centenas de plantas e animais mortos. Além disso, provocará falta de água potável e seca em todo o sul da Ucrânia, que é abastecido com a água do reservatório", explica o diretor do Centro Ecológico Nacional da Ucrânia, Ruslan Hawryluk.
Também o ecossistema de pântanos e ilhas na zona inferior do Dnipro desaparecerá com a enchente. E igualmente perigoso é o óleo de motor dos blocos da central.
"As turbinas e os transformadores contêm 450 toneladas de lubrificantes. Não sabemos exatamente quanto óleo escapou, mas partimos do princípio que sejam mais de 150 toneladas. Devido à grande inundação, esses óleos vão depositar-se em diferentes sítios ao longo do rio, e acabarão por chegar ao Mar Negro", antecipa o diretor da Ukrhydroenergo.
O ministro ucraniano do Meio Ambiente, Ruslan Strilets, referiu-se a um "ecocídio": A destruição da barragem seria "um ato bárbaro" e "uma verdadeira catástrofe humanitária", privando até um milhão de cidadãos do acesso a água potável.
Medo de acidente nuclear
A destruição da central hidroelétrica não terá impacto sobre o sistema de energia ou a estabilidade do abastecimento de eletricidade da Ucrânia. Contudo, as autoridades ucranianas alertam para riscos relativos à central nuclear de Zaporíjia, ocupada pelas tropas russas, onde a água dos tanques de refrigeração provém da represa de Kakhovka.
"Há uma lista detalhada das medidas necessárias se o nível de água no reservatório diminui, incluindo instruções para o pessoal da central nuclear, a fim de garantir a segurança", confirma Petro Kotin, presidente da estatal ucraniana Energoatom.
O Ministério da Energia de Kiev assegura que especialistas da Energoatom mantêm sob observação permanente o nível da água dos tanques de refrigeração.