Angola: Prisão para acusados de tentativa de golpe de Estado
16 de março de 2017O caso remonta a 30 de janeiro de 2016, quando 37 cidadãos angolanos, na sua maioria militares desmobilizados das Forças Armadas de Libertação de Angola (FALA), braço militar da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), durante a guerra civil, que terminou em 2002, foram detidos pela Polícia Nacional, por alegada tentativa de assalto ao Palácio Presidencial, na madrugada seguinte.
Mais de um ano depois, na noite desta quarta-feira (15.3), o juiz João António Eduardo ditou a sentença: condenou oito reús com penas que vão dos quatro aos dez anos de prisão por associação de malfeitores, posse ilegal de armas, atentado contra o Presidente da República, e coação contra o Presidente da República.
A pena maior, de dez anos de prisão, foi aplicada a Celestino Leonardo, considerado o líder dos 37 antigos militares. 28 arguidos foram condenados a um ano de prisão, mas, por terem passado um ano em prisão preventiva, foram absolvidos. Terão de pagar uma multa de cem mil kwanzas (cerca de 563 euros).
Outro réu foi classificado pelo tribunal como em situação de "alienação mental" e não foi julgado. "Está tido como um demente. É um caso à parte. O tribunal encontrou forma de não ser julgado, aliás, nem podia ser julgado com os demais porque não está em condições para ser ouvido em tribunal”, explica Salvador Freire, um dos advogados de defesa.
Defesa vai recorrer
A primeira sessão do julgamento arrancou quase 12 meses depois das detenções. Os reús eram, inicialmente, suspeitos apenas de crimes de associação de malfeitores e tentativa de golpe de Estado. Durante as investigações e auscultações, a justiça concluiu que alguns arguidos incorriam igualmente em crimes de falsificação de documentos, posse ilegal de armas e falsas declarações diante das autoridades.
Apesar de se mostrar satisfeita com o acórdão que iliba alguns dos seus constituintes dos crimes de que eram acusados, a defesa vai recorrer da decisão do juiz da causa ao Tribunal Supremo para ver os oito condenados em liberdade. A contar da data da sentença, os advogados têm cinco dias para interpor o recurso e impedir que o caso transite em julgado.
"Estamos parcialmente satisfeitos com a decisão saída deste tribunal. Mas vamos recorrer porque há algumas questões que carecem do nosso recurso. Há uma questão tida como associação de malfeitores e nós não estamos de acordo com esse termo”, afirma Salvador Freire.
Desde o início que a defesa refuta as acusações, afirmando que a única mobilização dos 37 cidadãos agora condenados tinha em vista uma manifestação pacífica para reclamar a não-inserção na Caixa Social das Forças Armadas Angolanas, "e não atentar contra o Presidente da República".
O Ministério Público considera que o grupo de acusados "era bastante organizado militarmente e que recrutavam os ex-militares" da UNITA "com o objetivo de atentarem contra o Presidente da República, José Eduardo dos Santos, e tomarem o poder pela força, com recurso a armas de fogo, catanas e ainda de métodos feiticistas".
Famílias em dificuldades
Freire garante que acredita na justiça angolana e na vitória da defesa: "Nós temos a plena certeza que vai acontecer. Há elementos suficientes que provam que nós vamos ganhar essa batalha”.
No entanto, o caso já trouxe consequências aos familiares dos réus. Depois de serem conhecidas as penas, Laurinda Maria, esposa de um dos condenados, não escondeu a tristeza no corredor do Tribunal Provincial de Luanda. À DW África contou que está a ter dificuldades em sustentar os seis filhos: "Estou a passar mal. Os rendimentos acabaram e já não consigo pagar a renda da casa”.
Na altura da detenção dos 37 cidadãos, a UNITA classificou o caso como uma "cabala". O porta-voz do "Galo Negro”, Alcides Sakala, negou qualquer ligação com a situação, realçando que o seu partido tinha já denunciado a criação do referido grupo, pelos serviços de inteligência de Angola.
Este é o segundo processo com alegações de golpe de Estado no espaço de dois anos. Em março do ano passado, 17 jovens foram condenados a penas entre dois a oito anos de prisão por crime de associação de malfeitores e de rebelião quando foram encontrados a ler o livro do norte-americano Gene Sharp intitulado "Da Ditadura à Democracia".
Os ativistas foram postos em liberdade através da Lei da Amnistia. Apenas Francisco Mapanda ou "Dago Nível Intelecto", condenado a 28 março por ter gritado em tribunal que o julgamento dos 15+2 era uma "palhaçada", continuou na prisão, onde permaneceu durante oito meses, cumprindo a totalidade da pena.