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"A decisão do povo não conta na Guiné-Bissau"

Delfim Anacleto
4 de dezembro de 2023

Analista diz que o derrube da Assembleia Nacional Popular da Guiné-Bissau desrespeita a vontade dos eleitores que a elegeram a 4 de junho. E duvida que seja possível ir contra a decisão do Presidente Sissoco Embaló.

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Parlamento da Guiné-Bissau
Foto: DW/B. Darame

O Presidente Umaro Sissoco Embaló dissolveu hoje o Parlamento, depois de tiroteios na capital Bissau,na sexta-feira passada, na sequência da detenção e tentativa de libertação do ex-ministro da Economia e Finanças e do secretário de Estado do Tesouro.

O analista político Diamantino Lopes considera que a dissolução do Parlamento volta a mergulhar o país numa crise política profunda e desrespeita o voto dos eleitores guineenses que, a 4 de junho, foram chamados a escolher os deputados da Assembleia Nacional.

Em entrevista à DW, Diamantino Lopes acrescenta que a decisão de Umaro Sissoco Embaló é ilegal.

DW África: Com a dissolução do Parlamento, que futuro se espera na Guiné-Bissau?

Diamantino Lopes (DL): Mergulhamos em mais uma crise política, que de certo modo vai minar a expetativa do povo. Saímos de eleições [em junho] e hoje já não temos Parlamento, nem Governo. Vamos voltar à estaca zero. É uma frustração total.

Era de esperar, considerando os eventos políticos que a antecederam. No próprio processo eleitoral vislumbrava-se essa expetativa e parecia que a decisão do povo não contava. Portanto, acabamos por chegar à conclusão de que as eleições não servem para nada neste país.

Diamantino Lopes, sociólogo
Diamantino Lopes: "Mergulhamos em mais uma crise política, que de certo modo vai minar a expetativa do povo" Foto: Iancuba Dansó/DW

DW África: A Assembleia Nacional iniciou funções em julho. Ou seja, em menos de um ano o Parlamento é dissolvido. Isso encontra suporte na lei da Guiné-Bissau?

DL: Legalmente, essa decisão não tem enquadramento, visto que, nos primeiros 12 meses de funcionamento do Parlamento, o Presidente não pode dissolver o Parlamento. Mas foi isso que aconteceu, à revelia da Constituição da República. Todos nós sabemos disso.

DW África: Após o anúncio da dissolução do Parlamento, o presidente da Assembleia Nacional, Domingos Simões Pereira, disse que vai continuar a conduzir as sessões do Parlamento. Acha que isso vai ser possível? 

DL: Acho que não terá nexo. Isso poderia funcionar se houvesse apoio de todas as bancadas. Mas há muito tempo que o MADEM-G15 (Movimento para a Alternância Democrática) apela à queda do Parlamento, não é de hoje. Só não pediam nessa data, o partido pediu a data legal - junho do próximo ano. Portanto, o MADEM-G15 já estava preparado para a queda do Parlamento.

Sendo assim, o presidente da Assembleia Nacional não estará em condições de dirigir as sessões só com a bancada do PAI - Terra Ranka. Se houvesse um entendimento global de todas as bancadas parlamentares em com a decisão não é legal, talvez pudesse haver aqui um equilíbrio. Mas nessa perspetiva, não vejo a possibilidade e sustentabilidade dessa tentativa de prosseguir com os trabalhos sem a cooperação de todas as bancadas.

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DW África: O Presidente dissolveu o Parlamento com alegações de que os acontecimentos da semana passada configuravam uma tentativa de golpe de Estado. Esta justificação faz sentido?

DL: Na minha leitura, não compreendo até que ponto isto poderia serum golpe de Estado. Estou a recolher informações para compreender por que é que aquele evento seria um golpe de Estado. Eu não compreendi a dinâmica político-militar que se vislumbra por aí. Mas, no fundo, acho que essa situação era superável se houvesse bom-senso. O certo é que começámos mal e, quando as coisas não começam bem, também não terminam bem.