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Rafael Marques denuncia expropriação de terras em Angola

António Rocha9 de fevereiro de 2015

O jornalista Rafael Marques investiga o açambarcamentode terras por parte de dirigentes angolanos. O autor do livro "Diamantes de Sangue" diz já ter detectado, um pouco por todo o país, dezenas de situações irregulares.

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Foto: DW/P. Ndomba

O ativista angolano diz ter registo de casos de dirigentes que possuem 400 quilómetros quadrados de terra. Os casos de expropriação estão a ser publicados no site Maka Angola, que Rafael Marques mantém na internet, e serão também publicados no novo livro do jornalista, adiantou o próprio em entrevista à DW África.

O fenómeno do açambarcamento de terras por parte de dirigentes não é novo em Angola, lembra o ativista. O grande problema que se põe, sublinha, é que não existem medidas para impedir que os dirigentes se apropriem de centenas de milhares de hectares de terra.

DW África: Está atualmente a investigar casos de expropriação de terras por parte de dirigentes angolanos. Trata-se de um fenómeno novo em Angola?

Rafael Marques (RM): Não se trata de um fenómeno novo, mas é um caso que se agravou nos últimos dois anos porque os dirigentes passaram a registar em seu nome grandes extensões territoriais que ocupam comunas inteiras, municípios. Há aqui uma privatização efectiva de todas as terras aráveis de Angola para benefício dos dirigentes que são, por sua vez, os principais empresários, latifundiários e dirigentes desportivos do país. Isto é, para benefício dos dirigentes e das suas famílias. Estou a registar casos de dirigentes que têm 400 quilómetros quadrados de terra, como a família presidencial.

DW África: E não há como travar isso de forma legal?

RM: Não há como travar de forma legal porque o Presidente autoriza. A sua família é a principal beneficiária. Então, os outros dizem: se a família do Presidente tem direito a isso, nós também temos. O que é que isto está a causar? (E aqui falamos já na questão da diversificação da economia, que é extremamente dependente do petróleo.)

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No interior, as pessoas mais ou menos em algumas zonas sempre puderem viver independentes do Estado, por causa da agricultura de subsistência que lhes permitia ter produtos básicos para fazer a permuta ou para vender e comprar aqueles bens essenciais de que necessitam. Neste momento, com as expropriações de terra, ao invés de se potenciar a agricultura na verdade está-se a destruir também a agricultura de subsistência.

Estes indivíduos que ocupam estas grandes extensões de terra não produzem. Por exemplo, há uma filha do Presidente que tem inclusive guarda presidencial a guardar a sua fazenda de mais de dois mil hectares e que quer até ocupar um cemitério, zonas de rituais ancestrais. E o que fazem é utilizar [estes espaços] para festas de fim-de-semana, para ter lá uns animais como numa espécie de zoológico. Não há produção agrícola.

DW África: Essas investigações significam que está a caminho um novo livro, à imagem do que aconteceu com "Diamantes de Sangue – Tortura e Corrupção em Angola"?

RM: Sim, vou publicar um livro sobre a questão das terras em Angola e o açambarcamento de terras por parte da classe dirigente. Aquilo que podia ser a esperança para a diversificação da economia angolana, neste caso a agricultura, acaba por ser uma ilusão porque já não há terras disponíveis para fomentar a agricultura.

Rafael Marques
Açambarcamento de terras em Angola é o tema do novo livro de Rafael MarquesFoto: DW/J. Beck

Os fundos do petróleo que foram destinados ao fomento da agricultura também foram apropriados por estes mesmos dirigentes, alguns dos quais construíram mansões. Não há produção, não há criação de infraestruturas que permita dizer: roubaram, mas pelo menos estão a fazer alguma coisa boa. Roubaram, estão a fazer mal e vão continuar a roubar porque depois têm de repor e de sustentar aquela gente toda que lá está.

Importam trabalhadores do Brasil, de Portugal e de outros quadrantes, o que não se justifica porque não têm produção. Há toda uma zona do Cuanza Sul, por exemplo, que é ocupada por altos quadros da Sonangol. E na altura em que se distribuiu, o atual vice-presidente, Manuel Vicente, que ainda era diretor-geral da Sonangol, nesta zona ficou com mil hectares de terra e os diretores de outros departamentos também. Dividiram o país entre si. Obviamente, numa situação de mudança, estas terras terão de ser confiscadas porque isto é um abuso.

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