Reações mistas à morte de José Eduardo dos Santos
8 de julho de 2022Numa nota da presidência, o chefe de Estado sul-africano, Cyril Ramaphosa, reconheceu a assistência material e militar prestada pelo MPLA e dos Santos à luta de libertação sul-africana. "No final, através dos sacrifícios do povo angolano e da liderança inabalável do Presidente Dos Santos, a liberdade amanheceu numa África do Sul democrática", lê-se no documento.
Em Moçambique, o Presidente Filipe Nyusi endereçou uma mensagem de condolências ao seu homólogo angolano, João Lourenço, pela morte do seu predecessor.
"Ele será sempre um ícone da luta pela independência económica de Angola, artífice da paz e pela integração regional dos países da SADC de que foi um dos fundadores. O seu legado ficará registado para sempre de forma indelével nos anais da história de Angola e de África", disse Nyusi.
O Secretário Executivo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), Zacarias da Costa, registou com "consternação" a morte do ex-Presidente José Eduardo dos Santos nesta sexta-feira (08.07), em Barcelona.
Para da Costa, trata-se de uma "grande perda para Angola e, também, para o mundo da Língua Portuguesa".
O Presidente cabo-verdiano, José Maria Neves, afirmou hoje que Cabo Verde está "de luto". "Cabo Verde perde um grande amigo e um líder africano que sempre contribuiu para o crescimento económico e espiritual destas ilhas", afirmou das Neves.
Para o Presidente da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, José Eduardo dos Santos foi um "líder ímpar" e "grande panafricanista". "Não é só a Guiné-Bissau, é toda a África que está de luto", disse.
Em declarações prestadas hoje à DW África, o histórico do MPLA, Mário Pinto de Andrade afirmou que José Eduardos dos Santos era uma "um homem de boa sensibilidade e de bom senso", que governou país no contexto conturbado da Guerra Fria, "mas conseguiu fazer as alianças internas necessárias para preservarmos a nossa independência, que foi duramente conquistada".
Para Mário Pinto de Andrade, "o grande legado [de JES] foi o facto de ter trazido a paz, a reconciliação nacional e o início de um caminho de desenvolvimento económico e social [para Angola]".
O Movimento Popular para a Libertação de Angola (MPLA) manifestou igualmente "profunda consternação" pela morte de dos Santos. O partido do ex-Presidente anunciou que suspendeu toda a sua atividade política até ao fim do luto nacional de cinco dias, decretado pelo Presidente João Lourenço. Horas mais atrde, o chefe de Estado aumentou o luto para sete dias.
O maior partido da oposição, a UNITA, cancelou o comício que tinha previsto para sábado em Luanda e exprimiu sentimentos de pesar aos familiares e amigos de José Eduardo dos Santos. Em Angola corre atualmente a fase pré-eleitoral da campanha para as eleições gerais de 24 de agosto.
MPLA suspende atividade política
O porta-voz do MPLA, Rui Falcão, adiantou que o partido, "além de acompanhar o programa de Estado", irá ter um programa próprio de homenagem ao ex-Presidente, sem adiantar pormenores.
As reações em Angola são mistas. O jornalista angolano Reginaldo Silva elogiou o ex-Presidente por ter alcançado a paz, mas lamentou que tivesse perdido a oportunidade de melhorar a vida dos angolanos e deixasse fugir os recursos públicos para bolsos privados.
Silva que conheceu José Eduardo dos Santos em Brazaville (Congo) em 1974, ainda antes da independência, afirmou que "ninguém pode ser indiferente" ao seu legado, por ter alcançado a paz, em 2002, na sequência da morte de Jonas Savimbi, líder da UNITA.
Lamentou, no entanto, que o Presidente não tivesse sabido agarrar a oportunidade de tornar Angola no país "que todos desejavam", apesar de ter tido todos os recursos, sobretudo a paz, mas também recursos financeiros. Silva, apontou ainda a corrupção endémica durante a longa presidência de dos Santos.
Paz e corrupção
O jornalista considera que a morte do seu ex-líder poderá ter um impacto negativo para o MPLA, devido às relações tensas entre o presidente do partido e Presidente de Angola, João Lourenço, e as filhas mais velhas do ex-chefe de Estado.
Tchizé dos Santos, uma das suas filhas, escreveu nas redes sociais que "os pais nunca morrem" e "vivem para sempre" nos filhos. Exigiu ainda que o corpo do pai fosse retido no hospital para fins de autópsia por considerar a morte suspeita.
O antigo Presidente da Angola estava há duas semanas internado nos cuidados intensivos de uma clínica em Barcelona. Neste período, Tchizé dos Santos apresentou uma queixa junto da polícia da Catalunha, que visava investigar alegados crimes de tentativa de homicídio e omissão do dever de assistência, por pessoas próximas do antigo Presidente, nomeadamente Ana Paula dos Santos, ex-mulher de José Eduardo dos Santos e mãe de três dos seus oito filhos.
A antiga eurodeputada socialista portuguesa, Ana Gomes, disse à Rádio Observador que José Eduardo dos Santos: "Não era incapaz, mas optou pela cleptocracia". Gomes acrescentou que José Eduardo dos Santos começou por ser uma promessa de democracia no final da guerra civil, mas "que essas promessas foram frustradas".
Artigo atualizado às 22h17 do dia 08.07.22