Rebeldes de Casamança ameaçam entrar na Guiné-Bissau
4 de fevereiro de 2021Os rebeldes de Casamança ameaçaram esta quinta-feira (04.02) entrar na Guiné-Bissau se sofrerem ataques das tropas senegalesas a partir de território guineense, acusando Bissau de se ter aliado ao Senegal.
"O ocupante estrangeiro senegalês resolveu assinar um acordo com as novas autoridades da Guiné-Bissau nas últimas semanas para utilizar o seu território e atacar as bases da resistência", acusou o comando do Movimento das Forças Democráticas de Casamança (MFDC) num comunicado.
A posição surge depois de, na quarta-feira, os independentistas de Casamança terem acusado o Exército do Senegal de estar a reavivar o conflito na região, ao lançar uma nova ofensiva militar na semana passada, após anos de trégua.
"A ala combatente do MFDC avisa que qualquer agressão do Exército senegalês a partir da república-irmã da Guiné-Bissau será considerada, nem mais nem menos, como uma declaração de guerra contra Casamança", advertiram.
Agressão ao Exército
Para o MFDC, tais ataques concederiam aos rebeldes legitimidade para perseguir "soldados senegaleses onde quer que se encontrem - até ao interior da Guiné-Bissau", consideram.
Segundo a imprensa senegalesa, desde 26 de janeiro ouvem-se tiros na zona de Ziguinchor - a principal cidade da região de Casamança - numa zona próxima da fronteira com a Guiné-Bissau.
Habitantes de aldeias no país (como Bergolen, Nhalom e Papia), contactados pela agência de notícias AFP, afirmaram ter ouvido, na quarta-feira, fortes explosões vindas do lado senegalês da fronteira, onde rebeldes mantêm as suas bases na floresta.
No final de janeiro, um alto funcionário militar disse sob anonimato à agência France-Presse que estavam "a operar no setor florestal de Bilass contra grupos armados".
O objetivo destas operações é "acompanhar e proteger a população para que esta possa levar a cabo as suas atividades tranquilamente", disse, acrescentando que os militares estão "ao mesmo tempo a lutar contra o tráfico ilegal de madeira e cânhamo indiano", explicou.
Os rebeldes do Movimento das Forças Democráticas de Casamança (MFDC) são acusados de envolvimento nesses tráficos, acrescentou o funcionário.
Mais de uma semana após o início da operação, o exército não divulgou qualquer balanço. No entanto, um do seu líderes negou ter perdido três soldados, como alegou o MFDC.
Últimos anos
A calma vivida na região nos últimos anos fez com que as pessoas regressassem às suas aldeias, abandonadas devido aos anteriores combates entre o exército e o MFDC, que há quase 40 anos trava uma guerra pela independência desta região, limitada a sul pela Guiné-Bissau e a norte pela Gâmbia.
A 28 de janeiro, o Exército anunciou a intenção de "neutralizar os elementos armados que se refugiaram" em Casamança e que aí levam a cabo "abusos contra a população".
Casamança já tinha experimentado um ressurgimento da violência no início de 2018, com o massacre de 14 homens que tinham ido buscar madeira perto de Ziguinchor. O exército tinha então prendido cerca de 20 suspeitos, que ainda estão à espera de julgamento.
As conversações de paz, tornadas ainda mais difíceis pelas divisões internas do MFDC, foram relançadas após a chegada ao poder do Presidente Macky Sall em 2012. Entretanto, não resultaram num acordo para pôr fim a um conflito que já causou milhares de vítimas civis e militares, devastou a economia e forçou muitas pessoas a fugir da região.
Casamança é uma faixa de território no sul do Senegal próxima da fronteira norte da Guiné-Bissau, e foi trocada por Portugal com a França no século XVII, passando a integrar o Senegal após a independência desta antiga colónia francesa, em 1960.
A integração é contestada pelos rebeldes - estimados entre quatro e cinco mil - que há 40 anos reclamam a independência de uma das regiões com mais recursos do país e considerada o "celeiro" do Senegal, com reservas de petróleo 'offshore' ainda inexploradas, mas que os independentistas consideram ter sido marginalizada em matéria de desenvolvimento.