Recuo de tribunal: "A ala de Ossufo Momade fica em vantagem"
28 de março de 2024O Tribunal Judicial de Maputo voltou atrás na decisão e rejeitou a providência cautelar submetida por Venâncio Mondlane que exigia a anulação de decisões tomadas pelo líder da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), Ossufo Momade, sob o argumento de estar fora do mandato.
O deputado do maior partido da oposição já reagiu sublinhando que "nada está perdido". Mondlane alega que o tribunal não teve em conta o depoimento das testemunhas de ambas as partes e avança que vai recorrer.
Em entrevista à DW, o politólogo Ricardo Raboco considera que a decisão pode "reanimar" a ala pró-Ossufo Momade, que fica "em vantagem na corrida ao congresso" do partido, agendado para maio e em que deverá ser escolhido um novo líder.
DW África: Como avalia este recuo do Tribunal Judicial de Maputo?
Ricardo Raboco (RR): Já era previsível. A partir do momento em que Venâncio Mondlane submeteu as duas providências cautelares, tendo uma sido respondida, numa primeira instância, a seu favor, o que se pôde logo antever foi um conjunto de batalhas jurídicas – antevia-se que a própria RENAMO iria recorrer da decisão que foi tomada em primeira instância. Agora, esta decisão não é final, pois é passível de recurso. Mesmo assim, parece-me uma decisão extemporânea em virtude do acordo que já houve na semana passada, em sede do tribunal.
Ao mesmo tempo, é uma decisão que pode reanimar uma ala pró-Ossufo Momade, que se sentiu de alguma maneira derrotada, humilhada por conta da decisão que foi tomada numa primeira fase e que praticamente colocava Ossufo Momade e toda a estrutura da RENAMO como simples figuras decorativas. Sendo assim, eles ficarão tecnicamente em vantagem nesta corrida para o congresso.
DW África: Acha que a decisão do Tribunal Judicial de Maputo fortalece a quezília interna dentro do partido?
RR: O conflito está instalado. Quando se tomou a decisão de que o presidente da RENAMO tinha de abdicar de tomar decisões estruturantes, a ala pró-Ossufo Momade anuiu, mas não se sentiu derrotada. Tanto é que tentou reagir nas redes sociais, procurando vilipendiar a imagem de Venâncio Mondlane e de todos os seus apoiantes.
DW África: Entretanto, Venâncio Mondlane já reagiu, afirmando que vai recorrer. Acha que este recurso terá pernas para andar? Poderá haver uma nova reviravolta?
RR: Enquanto a decisão não transitar em julgado, todas decisões são passíveis de recurso. Mas isto não é benéfico para a RENAMO. Por isso, haverá eventualmente um acordo entre as partes.
Na verdade, o pano de fundo desta clivagem é a não realização do congresso [da RENAMO]. Agora, uma vez em que já existe um acordo para a realização do congresso, esse acordo deveria implicar que as partes se abstivessem doravante em usar as instâncias judiciais para resolver um problema político.
DW África: O facto de o tribunal voltar atrás na sua decisão poderá dar azo a especulações, por exemplo, de alguma interferência na Justiça?
RR: Em princípio, não. A rapidez com que se tratou este caso é salutar. Há muitos casos que estão há dez ou mais anos a aguardar julgamento. A celeridade neste caso é uma lufada de ar fresco e mostra que, na verdade, os tribunais estão justamente aqui para servir os cidadãos e as instituições. Agora, se a resposta é favorável a uns ou outros, isso será certamente sempre objeto de grandes debates.