Regresso da Total virá com "fatura" para Moçambique
15 de fevereiro de 2023O presidente-executivo da petrolífera TotalEnergies considera que o regresso às obras em Cabo Delgado, no norte de Moçambique, não pode ser apressado e vai depender dos custos de exploração de gás natural. Citado pela agência de informação financeira Bloomberg, Patrick Pouyanne alertou que, se os custos aumentarem, a gigante francesa deverá esperar.
As declarações surgem poucos dias depois de o líder da TotalEnergies ter visitado a província de Cabo Delgado e encomendado uma análise independente da situação na região, para decidir se a empresa retoma o projeto interrompido devido à insegurança. Falámos com Rui Mate, economista do Centro de Integridade Pública (CIP), sobre o significado destas declarações do presidente-executivo da TotalEnergies.
DW África: O que significam estas declarações do responsável máximo da gigante francesa?
Rui Mate (RM): Pode-se perceber que há um jogo entre os interesses da Total e do Governo de Moçambique. Há dias, notícias que foram divulgadas tanto pelo nosso Governo como pela Total diziam que o projeto deveria reiniciar em pouco tempo, que era preciso fazer alguns estudos que pudessem viabilizar esse retorno. Agora, a empresa vem falar sobre os custos. O CIP já vinha alertando para esta questão. O retorno da Total vai ser acompanhado por um processo de inclusão de custos de segurança que não estavam previstos no processo inicial. E esses custos podem estar acima das projeções iniciais, significando que os ganhos que Moçambique terá também vão ser reduzidos, porque esses custos vão ser sempre recuperáveis dentro daquilo que é o contrato. Há aqui provavelmente uma tentativa de pressionar o Governo moçambicano no sentido de ceder no processo de revisão do contrato para incluir esses custos de segurança.
DW África: Isto quer dizer que se os custos aumentarem a TotalEnergies poderá desistir do projeto?
RM: Não acredito que vá desistir. Vejamos que, apesar da paralisação, houve atividades e processos que continuaram na Total. O processo de reassentamento, por exemplo, teve seguimento e envolve custos - muito altos. O que é que estaria a fazer uma multinacional como a Total, que tem pensadores, que tem analistas de projetos e riscos, a continuar com um processo de reassentamento se não tivesse interesse nenhum em dar continuidade ao projeto? A Total tem interesse, no entanto, houve este problema da guerra, que não estava lá na equação deles. Agora que veem necessidade de um retorno, esse problema pode também constituir uma oportunidade para maximizar os seus ganhos.
DW África: No contexto em que a Total encomendou um estudo sobre a situação de Cabo Delgado, nomeadamente a questão da segurança, e o responsável máximo da Total declara que não há muita pressa, qual é a sua análise?
RM: A Total está a fazer um jogo em que mostra claramente que tem interesse em dar continuidade a este projeto, porque é viável. Para o seu retorno, já contratou uma empresa independente que virá dar este aval, dizer 'as condições para o retorno, os riscos associados, são estes e aqueles, vão precisar de garantir isto'. E isto vem com uma fatura e é esta fatura que já está a ser preparada para os moçambicanos estarem atentos.
DW África: Deverá ser o Governo moçambicano a assumir estes custos?
RM: Vai ter de ser o Governo de Moçambique a assumir estes custos. É esta a mensagem de fundo que está a ser passada: os custos de segurança vão ter de ser suportados pelo Governo de Moçambique. Até agora, o Executivo não conseguiu estabilizar a zona, embora a situação tenha melhorado.