Reivindicações sociais e políticas levam angolanos às ruas
19 de março de 2021A primeira marcha convocada pelo grupo de ativistas aconteceu a 3 de outubro de 2020 e desde então aconteceram outras duas. Passados quatro meses, desde a última realizada a 11 de novembro, consideram que nenhuma das reivindicações levantadas foi "atendida por quem de direito".
Assim sendo, os ativistas dizem que veem-se "compelidos a sair novamente às ruas" e partem para a quarta "Marcha pela cidadania, pelo fim do elevado custo de vida e por autárquicas em 2021".
Dito Dalí, um dos ativistas envolvido na organização, em conversa com a DW África, garantiu que estão "focados" nos seus objetivos e que medidas como a revisão pontual da constituição não vão "distrair a sociedade”.
DW África: O que está a ser preparado para a Marcha da Cidadania em Luanda este sábado?
Dito Dalí (DD): Nós estamos a preparar a manifestação para exigirmos um conjunto de reivindicações, ou seja, um conjunto de reformas. O local da concentração é no cemitério da Santana às 10 horas, com partida ao meio dia, com direção ao Largo da 1º de Maio. Onde estaremos a protestar até que o Presidente da República atenda as nossas exigências. Caso contrário, as manifestações não irão parar.
Haverá manifestações também em Benguela, Huambo, Lubango, Namibe, entre outras províncias assim como também na diáspora. Há angolanos também que saíram à rua para protestar porque o problema todos nós. Quer os que estão dentro e fora de Luanda. Estaremos todos, nesse dia, unidos para lutarmos pelos direitos de todos nós.
DW África: Esta será a quarta marcha que convocam desde outubro de 2020. As reivindicações são as mesmas e não têm sido atendidas ou o país continua a dar mais motivos para continuarem os protestos?
DD: No ano passado, por exemplo, o Presidente da República convocou aquela reunião da juventude e é sinal de que estão a par das nossas exigências e têm estado a acompanhar. Então, entendemos que vamos continuar a protestar. Eles não podem se fazer de fingidos, como se não estivesse a acontecer nada. Vamos continuar até que tenhamos as coisas resolvidas. Podem vir com essas políticas para distrair a sociedade – como, por exemplo, a revisão da Constituição – para "arrastar" o nosso foco. Nós não estamos preocupados com a revisão da Constituição. Temos um foco e as nossas exigências são claras, temos estado a publicar em manifestos e eles sabem aquilo que nós queremos.
DW África: Um dos vossos objetivos continua a ser exigir a calendarização das eleições autárquicas. Que outras reivindicações vão levar às ruas?
DD: Sim, estamos a exigir que haja a institucionalização das autarquias locais em 2021 porque Angola é o único país da região da SADC [ Comunidade de Desenvolvimento da África Austral] que não institucionalizou as autarquias locais. O segundo ponto tem que ver com a revisão da legislação eleitoral. Angola tem uma legislação eleitoral que praticamente é uma armadilha, favorece o partido no poder e não atende os interesses dos angolanos. Mais do que exigir a revisão pontual da Constituição, o correto é que haja reforma na legislação eleitoral.
Estamos a exigir também a destituição do presidente da Comissão Nacional Eleitoral (CNE), Manuel Pereira da Silva "Manico". Foi nomeado para presidir a CNE num processo fraudulento e o próprio tem processos no tribunal. Esse indivíduo não é uma figura idónea para conduzir a CNE.
Outra das nossas reivindicações prende-se com o afastamento do diretor do Gabinete do Presidente da República, Edeltrudes Costa, envolvido em escândalos de corrupção. Tendo João Lourenço iniciado uma luta contra a corrupção, não pode permitir que o seu diretor do gabinete – a desviar fundos públicos – se mantenha no seu gabinete. Desviou dinheiro para Portugal, dinheiro esse que serviu para comprar apartamentos, carros de luxo e outra parte foi destinado aos "Panamá". Enquanto isso; temos pessoas a morrer à fome em Angola, pessoas a morrer nos hospitais, por falta de equipamentos.
E, claro, também o custo de vida que temos em Angola. O Presidente deve criar políticas públicas funcionais e concretas para reduzir o custo de vida no país. Um saco de arroz hoje em Angola custa 17 a 20 mil Kwanzas, não podemos aceitar isso. Não se entende.
DW África: Os protestos em Angola têm sido, alguns deles, marcados por violência e repressão por parte das forças de segurança. Estão a precaver-se para evitar que esse cenário se repita?
DD: Da nossa parte apelamos às autoridades que cumpram com as leis. Tal como manda a Constituição da República, a manifestação não carece de autorização. Carece simplesmente de comunicação. Nós já notificámos as autoridades e apelamos a que as forças de defesa e segurança apareçam para proteger os manifestantes e não para brutalizar. Se voltarem a brutalizar, a massacrar, a matar, a responsabilidade voltará a recair sobre a cabeça do Presidente da República. Os poderes estão concentrados numa só figura e é ele que orienta os seus subordinados e que determina o que as forças devem ou não fazer.
Esperamos que cumpram com a lei e nós vamos continuar a monitorar as forças de defesa e segurança nas manifestações. Caso a polícia venha a brutalizar, prender as pessoas, haverá sempre uma equipa que fará o registo no local e esperamos que as autoridades cumpram com a lei e respeitem.