Relação Angola - Rússia: Transição da ideologia ao dinheiro
3 de abril de 2019A independência de Angola foi conquistada também graças ao apoio da União Soviética e no tempo da guerra fria a cooperação militar com esse país permitiu ao MPLA, partido no poder, derrotar os seus inimigos e reafirmar o seu poder.
Mas o historiador José Milhazes, entendido sobre as relações entre os PALOP e a ex-União Soviética, hoje Rússia, lembra que no campo do desenvolvimento sócio-económico a cooperação foi pouco significativa porque a União Soviética não tinha formas de ajudar países como Angola noutros setores que não fosse no domínio militar, com a exceção do envio de médicos e a exploração de diamantes.
Mas as dinâmicas atuais determinam outras abordagens, entende Milhazes: "Penso que as relações irão aumentar mas noutras plataformas, primeiro Putin não está disponível a exercer a beneficiência do internacionalismo proletário, ou seja, a fornecer o que quer que seja gratuitamente. Está sim, interessado em cooperar no campo económico com interesses para ambas as partes. E penso que esta também é a posição de Angola e penso que esta nova abordagem das duas partes é mais eficaz."
Vale todo o tipo de investimentos?
E o Presidente de Angola iniciou uma visita a Rússia esta segunda-feira (01.04.). Em Moscovo, João Lourenço pediu maior investimento russo, deixando claro que há um espaço que não está a ser aproveitado pela Rússia.
A negociação da instalação de uma fábrica de armamento em Angola estaria na agenda do estadista angolano, algo que responderia positivamente a esta necessidade de investimento.
O analista angolano Manuel Muanza diz que "a indústria, armamentista ou não, cria empregos. E o interesse de Angola neste momento é que qualquer investimento deve criar emprego e para além disso há também os recursos que o Estado recebe por via dos impostos para o seu orçamento, penso que isto é importante. No caso a Rússia teria o interesse de ter a sua influência na região construindo aqui teria a possibilidade de influenciar os diferentes estados em relação ao que pretende para a região."
Angola é a aposta da Rússia em África?
Embora seja pragmático quanto ao assunto, Muanza lembra que o inconveniente da instalação de uma indústria armamentista é o perigo de fomentar a presença das armas e assim constituir um perigo para o ser humano.
Quanto aos interesses russos na cooperação, José Milhazes sublinha que "Putin tem um programa concreto para avançar os interesses da Rússia no continente africano, programa esse que é cada vez mais fundamental para a Rússia num momento em que sofre sanções por parte dos EUA e da União Europeia."
O historiador afirma ainda que "a Rússia está interessada em investir, e investe já, em setores como o petróleo, os diamantes e noutras áreas concretamente em Angola, como por exemplo nas pescas, onde poderá vir a haver investimentos já numa base comercial e não numa base ideológica como acontecia no tempo do Presidente José Eduardo dos Santos."
Mas quanto a Angola ser a grande aposta da Rússia como uma espécie de ponta de lança em África nesta nova nova abordagem russa Milhazes mostra-se reticente: "Não seria tão optimista, mas Angola tem um papel importante na estratégia russa em África, porque a Rússia como é sabido, tem interesses em outros países nomeadamente no Zimbabué e na República Centro-Africana, dai que Angola será um parceiro importante em África."
Mas Milhazes destaca o papel de João Lourenço no reforço das relações entre os dois países: "Devemos recordar que na direção de Angola, nomeadamente o Presidente João Lourenço é um homem que conhece bem a Rússia, viveu e estudou lá, e certamente que isso irá contribuir também para o restabelecimento de relações estreitas entre a Rússia e Angola, até porque esse parece ser o desejo de ambos os lados."