Ruandeses pedem que Maputo respeite estatuto do refugiado
19 de julho de 2021"Para mim, a aproximação de dois países africanos é sempre boa, mas é preciso que se respeite a convecção de genebra e os direitos dos refugiados", disse esta segunda-feira (19.07) à Lusa o presidente da Associação dos Ruandeses Refugiados em Moçambique, Cleophas Habiyareme.
Em causa está a aproximação, nos últimos meses, entre os governos de Moçambique e do Ruanda, que disponibilizou um contingente de mil homens para apoiar as forças de Maputo no combate ao terrorismo que afeta a província moçambicana de Cabo Delgado desde 2017.
Para Cleophas Habiyareme, a chegada de forças destacadas pelo executivo de Kigali a Moçambique "não assusta" a comunidade ruandesa que se refugiou no território moçambicano, mas é preciso garantir que Maputo "continue a respeitar o estatuto dos refugiados".
"As tropas ruandesas chegaram, mas nós não temos medo disso, desde que Moçambique respeite a convenção que assinou. Se há problemas, nós podemos ir para outro país", frisou Cleophas Habiyareme.
Segundo dados da agremiação, Moçambique conta com, pelo menos, 4.000 refugiados ruandeses, parte dos quais fugiram daquele país devido a alegada perseguição a opositores e intelectuais exilados pelo regime do atual Presidente, Paul Kagamé.
Desaparecimento de crítico de Kigali
Em março, a Associação dos Ruandeses Refugiados em Moçambique denunciou o desaparecimento do jornalista ruandês Ntamuhanga Cassien, que se encontrava exilado na ilha de Inhaca, Maputo, em circunstâncias não esclarecidas.
Segundo a associação, Cassien terá sido levado "por oito indivíduos desconhecidos que se apresentaram como agentes da Polícia da República de Moçambique (PRM)", num grupo que incluía outro cidadão do Ruanda "que se expressava na mesma língua local do visado".
As autoridades moçambicanas têm-se demarcado de uma eventual detenção do jornalista, considerando que o caso continua sob investigação.
Ntamuhanga Cassien, 37 anos, foi jornalista e diretor da rádio cristã Amazing Grace, em Kigali (capital ruandesa), trabalhando agora como comerciante em Moçambique.
Dizia-se vítima de perseguição política como outros críticos do regime do Presidente Paul Kagamé.
Direitos humanos
Fugiu da prisão no Ruanda em 2017, depois de ter sido condenado em 2015 a uma pena de 25 anos de prisão por conspiração contra o Estado, cumplicidade com terrorismo e homicídio - sentença na altura contestada por organizações de defesa de direitos humanos.
Líder do Ruanda desde 1994, a Kagamé é atribuído o desenvolvimento do país após o genocídio de tutsis daquele ano, mas o chefe de Estado é também acusado de limitar a liberdade de expressão e de reprimir a oposição.
A organização Human Rights Watch (HRW) acusou no final de março as autoridades ruandesas de estarem a limitar a população que recorre à Internet para se expressar no país, depois de restringirem a liberdade de expressão nos órgãos de comunicação social.
A restrição de liberdades tem também sido denunciada e condenada por outras organizações como a Repórteres sem Fronteiras e a União Europeia (UE).