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Angola: "Se inflação continuar, teremos convulsões sociais"

António Cascais
13 de junho de 2023

À DW, economista angolana diz que valorização do dólar face ao kwanza é decisiva no aumento de preços e continuidade dos protestos.

https://p.dw.com/p/4SWzA
Angola Luanda Kwanza
Foto: DW/V. T.

Em Angola, o aumento nos preços dos combustíveis foi a "gota que fez transbordar o copo", gerando várias manifestações nos últimos dias, num contexto económico já bastante complicado para os angolanos com menor poder de compra.

A DW África questionou a analista angolana de política e economia internacional Emília Pinto para entender melhor as manifestações num momento de fragilidade económica, marcado pelo aumento de preços.

A analista Emília Pinto
A analista Emília PintoFoto: privat

Há uma luz no fundo do túnel para melhorar a qualidade de vida e o poder de compra dos cidadãos? Segundo a analista, enquanto durarem os processos de registros sobre quem deve, ou não, receber as subvenções e do Estado, e enquanto o dólar valorizar-se frente ao Kwanza, ainda teremos "convulsões sociais".

DW África:  O aumento nos preços dos combustíveis foi a "gota que fez transbordar o copo", numa situação económica já bastante complicada para os angolanos com menor poder de compra?

Emília Pinto: Essas manifestações acontecem porque o aumento nos preços [dos combustíveis] representou um "elemento surpresa" para as pessoas. Não houve uma comunicação antecipada e a informação chegou como uma novidade, pois faltavam poucos dias para a entrada em vigor. Foi esta "novidade", portanto, que gerou alguns alaridos.

DW África: Houve um problema de comunicação por parte do Governo?

EP: Houve a questão de que o Estado [forneceria] subsídios de combustíveis a alguns setores para que [o aumento] não se refletisse nas famílias. Mas, no setor do agrícola, todos os que são produtores, ou que, de alguma forma, trabalham com a produção ou a transformação de elementos da cesta básica, esses intervenientes económicos teriam este tal subsídio, à semelhança dos taxistas.

Mototaxistas em protesto no Namibe
Mototaxistas em protesto no NamibeFoto: Adilson Abel Liapupula/DW

[Agora, sobre os protestos dos mototaxistas,] eu acho que é mais uma questão de falta de calma, porque, claro, as pessoas vão receber este "subsídio", esta "subvenção". Mas, de alguma forma, precisam estar cadastradas, identificadas.

[Por outro lado,] é preciso que haja uma certeza por parte do Estado de que aquela pessoa faz parte do setor que vai se beneficiar da subvenção. Até terminarmos os registros e que se identifiquem todos estes intervenientes, ou agentes económicos, vamos continuar a ter alguns constrangimentos, mas eu acho que não é uma questão de se preocupar.

DW África: O Governo vai, portanto, conceder apoios e compensações aos setores mais vulneráveis e afetados pelos aumentos, é isso?

EP: Indústrias transformadoras e que trabalham principalmente com agricultura, ou seja, elementos que fazem parte da cesta básica, vão receber a subvenção. E, com esta subvenção, não vão sentir diretamente aquela perda do poder de compra, porque não haverá subida substancial dos preços.

Automóveis fazem fila para abastecer em Angola
Automóveis fazem fila para abastecer em AngolaFoto: Borralho Ndomba/DW

DW África: Mas, em termos gerais, como é que os angolanos com pouco poder de compra sentem a subida dos preços neste momento, como se está em termos de inflação?

EP: A subida dos preços que se regista atualmente no mercado angolano não se deve muito ao aumento nos preços dos combustíveis, mas sim pelo aumento da inflação cambial – e essa, sim, pode complicar.

DW África: Quer dizer a desvalorização do Kwanza?

EP: Exatamente. E isso porque a maior parte da matéria-prima utilizada na indústria angolana vem toda de fora, é importada. Automaticamente, [muitos] terão mais dificuldades para trazer a matéria-prima, e mais dificuldades em a desalfandegar em território nacional. Então, são estas as dificuldades que vão se refletir nos bolsos dos cidadãos.

Segundo a economista, o dólar valorizado é o principal fator para o aumentos dos preços, inclusive dos alimentos (foto de arquivo)
Segundo a economista, o dólar valorizado é o principal fator para o aumentos dos preços, inclusive dos alimentos (foto de arquivo)Foto: DW/J. Beck

DW África: E se refletem nos preços da carne, dos legumes, dos alimentos básicos, digamos?

EP: Exato. Já se consegue sentir o Kwanza desvalorizado, pouco ou nada se consegue adquirir, e isso nos mercados formal e informal.

DW África: Espera-se aumento da convulsões sociais, ou há já uma "luz no fundo do túnel?"

EP: Ainda não vamos sentir "esta luz no fundo do túnel" [risos]. Enquanto durarem os processos e registos de identificação sobre quem merece, ou não, as subvenções; e enquanto o dólar valorizar-se frente ao Kwanza, ainda vamos ter estas "convulsões sociais".

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