Será o fim do visto CPLP em Portugal?
22 de março de 2024A autorização de residência em Portugal para pessoas nacionais da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), muitas vezes designado por "visto CPLP", entrou em vigor em 2023, durante a governação de António Costa, e permitiu a entrada em Portugal de milhares de imigrantes oriundos dos países africanos de língua portuguesa.
Mas pouco tempo depois das eleições legislativas de 10 de março, que deram a vitória à Aliança Democrática (AD), uma coligação que junta sociais-democratas (PSD), centristas (CDS-PP) e monárquicos (PPM), este visto passou a ter os dias contados. A Agência para as Migrações, Integração e Asilo (AIMA), que substituiu o extinto Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), anunciou na sua página online que este tipo de autorizações é aceite apenas até 30 de junho.
Anúncio inesperado
O estudante são-tomense Merlander da Costa foi à AIMA, em Lisboa, tratar do título de residência e foi informado, para sua surpresa, que o visto CPLP terminaria em junho.
"Há pessoas com vistos da CPLP a trabalhar em Portugal. E se [o visto] acabar têm de arranjar solução para isso [para a pessoa não ficar] sem documento", disse à DW.
Nos primeiros três meses, após a entrada em vigor do visto CPLP, em março de 2023, foram atribuídas mais de 150 mil autorizações de residência.
Também Darling Barbosa, imigrante são-tomense, conta que ficou cerca de três anos à espera de documentos para obter residência em Portugal e lamenta o fim do visto CPLP, que nestes últimos meses facilitou a entrada no país de muitos africanos lusófonos.
"Quando cheguei, para adquirir documentos, demorou dois a três anos. Então, como eles estão a chegar já com o visto [CPLP], é muito bom porque conseguem ter estabilidade no trabalho", comentou.
Darling Barbosa entende que o novo Governo português deveria manter o visto CPLP. No entanto, a Comissão Europeia já tinha questionado Portugal por causa deste tipo de autorização, estabelecida à luz do Acordo de Mobilidade entre os pares da CPLP. A Comissão chegou a abrir um processo contra o visto CPLP, porque entendeu que o referido procedimento não estava em conformidade com as regras europeias.
Decisão "precipitada"
Miguel Fortes, presidente da Associação Caboverdiana do Seixal, que tem ajudado muitos imigrantes a conseguirem o processo de legalização, considera "precipitada" a decisão de suspender este visto.
"A AIMA deve fazer um registo total dos imigrantes que estão cá ao abrigo deste visto e depois dos 150 mil que já estão com essa tal residência de um ano, para poder dizer também como fica o futuro destas pessoas em Portugal", considerou.
O dirigente associativo diz que, até então, faltou informação pública adequada. E, na qualidade de advogado, sustenta que a decisão da AIMA não é vinculativa.
"Não tenho os estatutos da constituição da AIMA para saber se a AIMA tem essa competência de [determinar] o fim desse visto. Ou se [deve] devolver essa competência ao próximo Governo, à Assembleia da República, para revogar essa lei", comentou.
O jurista reforça que "qualquer decisão tomada por quem está a dirigir a AIMA nessa matéria de concessão e atribuição de visto é ilegal, porque essa concessão e essa atribuição tem uma base legal, aprovada na Assembleia da República", afirmou.