Em Mocímboa da Praia população vive sob grande tensão
6 de outubro de 2017Em Mocímboa da Praia, no norte de Moçambique, a situação ainda não está completamente tranquila. Na madrugada desta sexta-feira (06.10) ainda se ouviam disparos. Um ataque armado contra três postos da polícia, perpetrado por homens trajando roupas árabes, que começou na madrugada de quinta-feira (05.10.), teria resultado na morte de 14 atacantes e dois detidos, segundo a polícia.
De acordo com relatos de residentes, quase todo o comércio e serviço da vila, que está a cerca de 100 quilómetros da fronteira com a Tanzânia, estão encerrados e as ruas estão desertas.
A DW África entrevistou Albino Forquilha, ex-militar e especialista para a promoção da paz na FOMICRES, uma ONG que trabalha na área do combate à proliferação de armas.
DW África: Através desse tipo de ação armada, pode-se perceber se ela foi realmente perpetrada por extremistas, criminosos ou guerrilheiros?
Albino Forquilha (AF): Tudo ainda está a ser analisado porque de facto a maneira como os ataques foram conduzidos só pode ser o resultado de uma preparação minuciosamente feita. Pelo menos, é isso que nos chega como informação. Esse tipo de ataque não vem de indivíduos que aleatoriamente se entenderam e se lançaram nisso. Com isso, quero dizer que, de certa forma, há uma organização por detrás dos atacantes. Mas acho que é ainda muito prematuro dizer que de facto se trata de um grupo extremista já com algum nome ou se se trata mesmo de uma posição terrorista. Tenho a certeza de que isto será conhecido brevemente porque, para além de resultar em algumas mortes, existem rumores da ligação deste grupo com a milícia islâmica Al-Shabaab ou com alguma ramificação aos combatentes do Boko Haram. Penso que uma afirmação dessas é ainda sem alguma base, mas talvez faça sentido por aquilo que já acontece em África e também por estarmos próximos da zona da Somália onde Al-Shabaab tem estado a atuar.
DW África: Vamos então falar do que é conhecido oficialmente. A Polícia informa que dois atacantes foram detidos. Mas, para além da palavra Allah, eles não dizem mais nada. Isso não faz desconfiar que o ataque possa ter sido feito, por exemplo, por moçambicanos?
AF: Por isso é que estou a dizer que há toda uma especulação que se faz porque se dizem apenas duas ou três palavras. Pode ser uma tática para esconderem no início as suas respectivas identidades(...). Mas, de alguma forma, há uma língua que essas pessoas possam falar. Acredito que daqui a alguns dias eles vão falar. Agora, é verdade que não podemos afirmar taxativamente, mas temos a sensação de que poderemos estar perante alguma situação extremista. Pelos antecedentes, temos a informação de que algumas pessoas foram presas há alguns meses na mesma zona onde os ataques aconteceram por incitarem à violência contra a própria Constituição da República por ser laica e mais outros aspetos. Há inclusive especulações de que esses ataques aconteceram em reivindicação ou procura de resgate das pessoas que foram presas. Mas isto não é muito sustentável a ponto de ser tomado como base.
DW África: A atuação de grupos extremistas em Moçambique poderia atrair a proteção e apoio de países ocidentais como por exemplo os EUA? Será que Moçambique teria interesse em atrair esse apoio a qualquer custo?
AF: Eu penso que sim. Moçambique é um país estratégico do ponto de vista económico. Moçambique é um país rico em termos de exploração dos seus recursos. E Moçambique é um país que tem uma longa costa, que dá acesso a outras zonas do Médio Oriente, etc Tudo isso poderá interessar estrategicamente muitos outros países. Portanto, não devemos colocar de lado esta hipótese de apoio ou de proteção. Mas podemos ter no nosso país um Governo e, se calhar, este Governo na leitura dos outros não vai facilitar muito seus interesses económicos.