Sudão: 4 manifestantes mortos e um país em suspenso
10 de junho de 2019No Sudão, um segundo dia de "desobediência civil" foi cumprido esta segunda-feira (10.06) no Sudão, em resposta ao apelo do movimento de protesto pela crescente repressão dos generais no poder, que já causou mais de 100 mortes na última semana. No domingo, primeiro dia da campanha nacional de "desobediência civil", mais quatro manifestantes morreram.
A agência France Press refere que, apesar do clima tenso, três opositores sudaneses que tinham sido presos na sequência da onda de repressão militar, foram libertados esta segunda-feira, segundo noticiou a televisão estatal. Entretanto, um deles diz ter sido deportado contra a sua vontade de Cartum para Juba, capital do Sudão do Sul, segundo apurou a AFP.
De acordo com o porta-voz da coligação Forças de Consenso Nacional, Mohamed Ziauddin, a desobediência civil teve uma adesão de mais de 90% da população, tendo deixado as ruas da capital Cartum desertas. Vários relatos de cidadãos confirmaram o caos que se vive em Cartum, capital do Sudão.
"A situação não é normal, está tudo fechado. Não consegui encontrar pão nem nada para comer a não ser estes vegetais. A vida quotidiana paralisou", conta com preocupação um cidadão anónimo.
"Tenho-me estado a preparar desde ontem. Já consegui alimentos suficientes para uma semana de modo a poder participar nos atos de desobediência civil. Espero que todos participem", relata Mustafa Ahmed al-Shaikh, residente em Cartum.
Entre as iniciativas desta campanha de "desobediência civil" está a convocação de uma greve geral. Assim sendo, a maior parte do comércio e instituições públicas não abriram portas este domingo. Também os transportes públicos não estão a funcionar. Em vários bairros da capital, as forças de segurança dispararam tiros para o ar e usaram gás lacrimogéneo para dispersar manifestantes.
Transição difícil
O Conselho Militar de Transição já reagiu, afirmando que o "fecho das estradas" e as "barricadas" que estão a ser levadas a cabo no país pelos manifestantes são ilegais e estão a "privar os cidadãos de terem acesso a uma vida normal". Por isso, a segurança será reforçada, anunciou o General Jamaleddine Omar, membro do Conselho Militar.
"O Conselho Militar decidiu reforçar a presença das forças armadas para restabelecer a vida normal e assegurar a segurança das pessoas desarmadas, abrir as estradas, facilitar a circulação das pessoas e dos transportes públicos e privados e proteger as instalações estratégicas e os mercados".
Por seu lado, o povo, garante um sudanês, que preferiu manter o anonimato, "não quer este Governo". "O povo não pode ser governado pela força. Não estou a dizer isto, nem como membro da oposição, nem como apoiante do Governo, mas está claro que o povo não quer este Governo. Como pode ver, as ruas estão vazias e as lojas fechadas. Eu pessoalmente quero um governo civil".
O apelo da oposição à desobediência civil surge depois de, na semana passada, as forças militares terem destruído o acampamento que há dois meses estava colocado em frente à sede do Exército do Sudão, causando dezenas de mortos.
Vários manifestantes mortos
Números divulgados pelo Comité dos Médicos, um dos sindicatos da oposição, dão conta que a escalada de violência das forças militares sobre os manifestantes fez já, desde a passada segunda-feira, 118 mortos. O Ministério da Saúde fala em apenas 61.
Durante o fim de semana foram também denunciadas as detenções de três dos líderes da oposição. As denúncias surgiram poucas horas depois dos seus encontros, em Cartum, com o primeiro-ministro etíope. Abiy Ahmed deslocou-se ao Sudão com o objectivo de restabelecer o diálogo entre a oposição e a junta militar que dirige o Sudão desde a queda do presidente Omar al-Bashir a 11 de abril, mas sem sucesso.