Tradições e biodiversidade de Bijagós retratadas em série
16 de setembro de 2014A apresentação da série "No Reino Secreto dos Bijagós" começou com o episódio "Os Escultores dos Espíritos", co-produzido e co-realizado por Noémie Mendelle e Luís Correia, da LX Filmes.
O fascínio pelo sagrado, mas também pela natureza motivou a produção desta série, apoiada pela Fundação Calouste Gulbenkian.
De acordo com Luís Correia, este "é um projeto que começou há cerca de dois anos e, na altura, contou com o apoio do programa Próximo Futuro."
O realizador conta como foi concebida a série: "Cada episódio vai abordar o património dos Bijagós de um ponto de vista diferente, desde aquele que apresentamos hoje, que é a relação com o imaterial, com os espíritos, até outro que vai estar mais ligados a questões de biodiversidade e conservação que são também desafios importantes para o arqupélago que é uma reserva da biosfera."
A ideia inicial de documentário ganhou outro formato e mobilizou outros apoios devido à complexidade do património existente.
Foi necessário antes um conhecimento prévio da realidade nos Bijagós, precisa Noémie Mendelle, do Instituto Escocês de Documentários.
Mendelle descreve Bijagós como "uma sociedade codificada e complexa. Na primeira abordagem parece tudo muito simples, a relação entre eles, entre os Bijagós e a natureza. Mas pouco a pouco a gente começa a entender a complexidade do que eles estão ali a fazer."
O paradoxo do desenvolvimento
A originalidade do seu património torna Bijagós uma das sociedades mais singulares e únicas. Na realidade, citando o preâmbulo da apresentação, "entre os Bijagós permanece uma visão do mundo em que homens, natureza e espíritos formam um sistema cooperativo onde tudo está interligado".
No entanto, diz Luís Correia, pela sua fragilidade, o desenvolvimento necessário constitui ao mesmo tempo uma ameaça: "Nós temos neste momento nos Bijagós uma cultura, um povo, que viveu relativamente preservado e isolado do mundo. E neste momento, desde há cerca de 15-20 anos, que começou a haver um contacto que vai ter consequências e impactos muito fortes."
O realizador português diz que "o desenvolvimento é positivo, mas a verdade é que o desenvolvimento implica um outro tipo de práticas e relacionamentos - implica educação, por exemplo, ir à escola, implica o dinheiro que vai chegar por causa do turismo e vem o emprego."
Luís Correia diz "que isso é bom porque os jovens anseiam ter melhores condições de vida". Mas há um outro lado: "O paradoxo é que, para que isso aconteça, os jovens vão ter de sair das aldeias e de alguma forma vão ter de abandonar as práticas tradicionais."
Mas isso pode trazer também consequências negativas, considera o português: "Se os mais jovens sairem das aldeias provavelmente não haverá pessoas para trabalhar o campo e assegurar a sustentabilidade dos mais velhos. Portanto, há uma espécie de ruptura nesse ciclo que é natural e há uma impulsão dessa organização social."
Participação guineense é justa e necessária
O realizador guineense, Sana Na N’Hada, que colabora na série na qualidade de produtor associado, é um dos defensores dos Bijagós.
Tal como ele, o jovem bijagó Adão Lopes Correia, que colabora com a equipa, quer criar uma associação de defesa daquele património cultural. "Para nós é importante que este projeto não seja feito por dois estrangeiros na Guiné-Bissau. É importante que o Sana, enquanto cineasta guineense e produtor, esteja associado ao projeto."
O mesmo acontece com Adão Lopes, que, enquanto bijagó, "tem uma ONG e a ambição de criar qualquer coisa para a defesa do património cultural dos Bijagós que esteja também ligada ao projeto. Nós queremos fazer este filme com eles e não vê-los ao longe."
Entre os desafios, a aposta é concorrer em festivais internacionais, como revela Noémie Mendelle.
Entretanto, a equipa ainda procura financiamento e novos parceiros para continuar a filmar por mais um ano os outros três episódios.
Além da Fundação Gulbenkian, a obra conta até então com os contributos de várias instituições portuguesas, entre as quais a Fundação Portugal-África, bem como da UNESCO, Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura.