1. Ir para o conteúdo
  2. Ir para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW
MigraçãoTunísia

Tunísia: Milhares de migrantes "despejados" no deserto

Jennifer Holleis
19 de junho de 2024

Observadores dos direitos humanos afirmam que as autoridades tunisinas estão a realizar "expulsões coletivas" ilegais de migrantes, com fundos da União Europeia. Dizem que a prática está a tornar-se cada vez mais comum.

https://p.dw.com/p/4hE4Y
Grenze zu Tunesien: Afrikanische Migranten an der Grenze ausgesetzt
Foto: Yassine Gaidi/Anadolu/picture alliance

O medo existe, dia e noite, conta Mamadou, do Chade, que pediu à DW para não divulgar o seu nome completo por receio de represálias. Está na Tunísia há mais de 3 meses, mas o seu objetivo era chegar à ilha italiana de Lampedusa, com a ajuda de traficantes de seres humanos.

"Os agentes da Guarda Costeira tunisina tiraram-nos os telemóveis e o dinheiro, depois levaram-nos até à fronteira da Líbia, onde nos despiram e nos abandonaram", ralata.

Mamadou conta o que lhe aconteceu a partir do seu esconderijo: um olival. Para lá chegar, teve de caminhar cerca de 240 quilómetros pelo deserto. Este olival tornou-se um refúgio para cerca de 80.000 migrantes subsarianos que aguardam uma oportunidade para atravessar o Mar Mediterrâneo e chegar à Europa.

"Estou aqui há mais de 3 meses e estou a viver muito mal. A Tunísia não é o nosso objetivo. Não queremos ficar aqui. Só queremos passar", revela.

Lauren Seibert, investigadora da Human Rights Watch (HRW), disse à DW que o que Mamadou e outros migrantes viveram foi "uma expulsão coletiva ilegal". Algo que a Argélia, a Líbia e a Mauritânia fazem há anos, lembra a defensora dos direitos humanos. Mas na Tunísia o fenómeno é mais recente e parece ter-se tornado sistemático desde o ano passado.

Mamadou, do Chade, receia ser expulso para o deserto pelas autoridades tunisinas
Mamadou, do Chade, receia ser expulso para o deserto pelas autoridades tunisinasFoto: Khaled Nasraoui & Tarak Guizani

Como é usado o financiamento da UE?

"Não se trata de um fenómeno novo, apesar dos graves abusos que ocorreram durante estas expulsões e despejos no deserto, que continuam há muitos anos em todo o Norte de África por parte de muitos países", diz Seibert.

Recentemente, a organização investigativa Lighthouse Reports publicou um relatório sobre o aumento das chamadas "lixeiras do deserto", que conclui que a Guarda Nacional Tunisina estava no centro dessas operações, com grande parte do financiamento proveniente de países europeus.

"Agora, as expulsões parecem estar mais sistematizadas, em parte porque envolvem detenções urbanas e também porque implicam uma mudança na forma como os migrantes intercetados no mar são tratados", diz um especialista em migração tunisina que falou à DW sob condição de anonimato.

Desde o ano passado, a União Europeia (UE) tem celebrado parcerias em matéria de migração com o Egito, Marrocos, Mauritânia e Tunísia - acordos que incluem financiamento destinado especificamente a ser utilizado para reduzir a migração para a Europa.

Para muitos observadores, os recentes desenvolvimentos na política de migração da Tunísia são preocupantes, uma vez que o país se tornou um ponto de partida popular para os migrantes de África que desejam chegar à Europa.

Migrantes aquecem-se à volta da fogueira diante da sede da Organização Internacional para as Migrações (OIM), em Túnis
Migrantes aquecem-se à volta da fogueira diante da sede da Organização Internacional para as Migrações (OIM), em TúnisFoto: Chedly Ben Ibrahim/NurPhoto/picture alliance

Exigência: Fim de violações

A investigadora Lauren Seibert faz um apelo: "Trata-se de uma prática contínua e violadora dos direitos humanos praticada por quase todos os países do Norte de África e que tem de acabar".

Porém lembra que "com o aumento do financiamento da UE dedicado ao controlo da migração, que impede as pessoas de partirem do Norte de África em direção à Europa, isso só encoraja estas expulsões coletivas que são contrárias ao direito regional e internacional."

Em julho passado, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, anunciou uma parceria com a Tunísia no valor de mais de mil milhões de euros, que incluía assistência orçamental imediata e verbas para a gestão das fronteiras.

Embora o Presidente Kais Saied diga repetidamente que a Tunísia não se tornará num "ponto de passagem para os subsaarianos", os ativistas dos direitos humanos afirmam que as expulsões coletivas ilegais estão a aumentar.

"A Comissão Europeia declarou que não apoia este tipo de expulsões coletivas, mas na verdade existe uma linha clara que pode ser traçada entre o financiamento da UE e a continuação destas práticas", entende Seibert.

Tunísia: O novo ponto de migração para a Europa

Saltar a secção Mais sobre este tema