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Waldemar Bastos denuncia "perseguição" do regime de Angola

João Carlos (Lisboa)23 de junho de 2016

Em entrevista à DW África, músico diz que tem sido vigiado pela polícia secreta angolana, que já o abordou várias vezes em tom de intimidação.

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Foto: DW/J. Carlos

Waldemar Bastos, músico angolano radicado em Portugal, decidiu desabafar em forma de denúncia contra atos que classifica como atropelos à liberdade artística. Numa nota colocada na sua página no Facebook, lamenta, por exemplo, o facto de muitas vezes lhe fecharem as portas para fazer espetáculos em Angola por não ser militante do partido no poder.

Músicos de intervenção e críticos como Waldemar Bastos - que nunca aceitaram fazer campanha a favor do MPLA - também não têm espaço na rádio e na televisão públicas. “Foram poucas ou nenhumas as vezes em que me deixaram cantar no meu país”, refere o músico, natural de Mbanza Congo.

É com serenidade que Waldemar Bastos reafirma ser alvo de perseguições. Tanto ele como a família: a mulher, que está em Angola, e os dois filhos a viverem, respectivamente, em Inglaterra e nos Estados Unidos. O músico reitera que tem sido vigiado, “todos os dias, palmo a palmo, pela polícia secreta e ‘bufos’, ao serviço do regime no poder em Angola”. E isto, sublinha, “não é de agora”.

“Sempre sentimos isso. Não é um filme, há dados. Tanto em Angola como em Portugal. E não só”, afirma. “Sempre fui paciente, humilde, tentei sempre fazer ver que apenas quero fazer a minha arte. Este desabafo é um desabafo da alma”.

Intimidação "em todo o lado"

Na nota informativa que colocou há dias na sua página do Facebook, com o título “Somente a verdade nos libertará. Chega de falácia”, o músico sublinha que a perseguição de que tem sido alvo não se prende apenas com a falta de oportunidades para dar espetáculos no seu país natal.

“Onde vou atuar, há presença, há intimidação, e ultimamente vamos considerar mesmo [que houve] algumas abordagens de ‘bufos’ ou de coisas do género”, diz Waldemar Bastos. Abordagens que, segundo o músico, são feitas “em tom de advertência”. E a perseguição “é nítida em todo o lado”.

“Na literatura, há quem diga que é ódio por estimação”, diz Waldemar Bastos quando questionado acerca dos motivos por trás da “perseguição” de que diz ser alvo. “Mas não sei o porquê deste foco na minha pessoa ao longo de tantos anos”, ressalva.

Waldemar Bastos
Waldemar BastosFoto: Waldemar Bastos

“Inclusivamente, já pedi audiências a membros do Governo e foi-me dito que não havia nada. E eu perguntei: se não há nada, porque é que não posso trabalhar?”, questiona o músico.

Marginalizado em Angola

Waldemar dos Santos Alonso de Almeida Bastos nasceu em 1954 na cidade de Mbanza Congo, município do Zaire, de onde saiu aos 28 anos de idade com destino a Portugal para escapar à guerra civil.

Apesar de ser amado pelo povo angolano, Waldemar lamenta o facto de só artistas militantes do MPLA, partido no poder, terem espaço para atuar em Angola: “Atuam em tudo quanto é festa, têm todo o tipo de regalias”.

“Claro, de vez em quando, chamam aristas estrangeiros, para limpar a cara. No meu caso concreto e de outros artistas que cantam música popular, somos marginalizados”, sublinha o músico.

Waldemar Bastos diz que foi Deus que lhe deu talento para cantar para o mundo e para os angolanos. E, assim sendo, continua de pé a vontade de subir ao palco em Angola. “Quem não gosta de cantar para o seu povo?”, pergunta, imaginando um futuro em que haja “respeito pela liberdade de pensamento artístico” e em que “as pessoas possam de facto cantar, expressar-se livremente” em Angola.

Um futuro que, para já, não é possível, segundo o músico angolano. “Estive lá [em Angola], tentei dois, três anos, em 2011, 2012 e finais de 2014 e vi que o impedimento era total”.

Apelo ao regime

A publicação da nota em jeito de denúncia no Facebook trouxe ao músico uma sensação de liberdade por ter conseguido expressar “uma profunda dor que trazia na alma que se refletia em toda a família”.

[No title]

Em nome da paz, Waldemar Bastos pede que deixem de o perseguir em salas de espetáculos. Reafirma que tudo o que disse “é, honesto, sincero e verdadeiro”, mas adianta que não quer transformar este seu desabafo em alarido.

Entretanto, promete, na altura certa, revelar mais desenvolvimentos. Esta sexta-feira (24.06), revendo a sua já longa carreira, Waldemar Bastos canta “Angola e o mundo à volta da fogueira” num concerto único no âmbito das celebrações dos 60 anos de existência da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.

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