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A denúncia criminal contra Temer nas mãos da Câmara

2 de agosto de 2017

Enquanto grande maioria da população quer que processo contra o presidente avance, gravidade das acusações fica em segundo plano no cálculo dos deputados após governo reagrupar forças e distribuir bondades.

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Michel Temer
Temer foi denunciado por corrupção passivaFoto: REUTERS/U. Marcelino

Mais de um ano depois da sessão que decidiu pela abertura do processo de impeachment contra a ex-presidente Dilma Rousseff, o plenário da Câmara federal deve se reunir nesta quarta-feira (02/08) para decidir o futuro de mais um ocupante do Planalto. O impeachment não era um feito inédito na democracia brasileira, mas desta vez a missão será histórica: os deputados vão decidir pela primeira vez se um presidente da República deve ser processado criminalmente.

Tal como sua antecessora, Michel Temer pode ser afastado até a conclusão de um julgamento. Seria o fim de um governo que começou turbulento e que tem ampla rejeição entre a população.

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Mas as semelhanças com Dilma param por aí. Enquanto pouco antes da votação da petista havia a certeza disseminada no meio político de que se tratava do seu fim, são poucos no caso de Temer que asseguram que esta quarta-feira deve marcar o fim da linha para o peemedebista, apesar da gravidade da denúncia criminal. O presidente é acusado de corrupção passiva.

Como em outros momentos de turbulência do governo Temer, este deverá ser apenas mais uma etapa da luta pela sobrevivência. Ao contrário do que ocorreu nos dias que antecederam a votação de Dilma, não está ocorrendo nenhuma grande debandada de partidos da base aliada ou um "efeito manada" entre deputados que farejaram alguma fraqueza do governo.

O placar

Os placares preliminares elaborados por jornais brasileiros com base em enquetes com deputados mostram que nem a oposição nem o governo parecem ter votos suficientes para forçar uma decisão clara. O jornal O Estado de S. Paulo, por exemplo, aponta que 190 deputados devem votar pela denúncia e 110 contra. Outros 213 não revelaram o voto ou estão indecisos.

No entanto, o governo conta com uma vantagem: não precisa realmente reunir 172 votos a seu favor. Esses votos podem ser contados a partir de abstenções ou ausências. Para que Temer se salve, basta que a oposição não consiga os 342 votos necessários para a continuidade da denúncia.

Não há dúvidas de que a oposição ainda não contava com esse número na noite de terça-feira. O problema imediato para o Planalto continua sendo conseguir reunir o quórum mínimo para iniciar a votação. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), determinou que o escrutínio só deve começar com pelo menos 342 deputados presentes.

O governo propagandeia ter votos suficientes para barrar a denúncia – as estimativas vão de 220 a 260 votos –, mas está claro que o Planalto deve enfrentar problemas para encher o Plenário caso a oposição boicote a votação para tentar conseguir mais tempo.

Caso a votação ocorra de fato, será uma questão de observar o tamanho do apoio ao presidente. Mesmo que a oposição não consiga 342 votos, Temer ainda precisa reunir um número expressivo de apoios para demonstrar que pode conseguir sobreviver a uma eventual segunda denúncia – espera-se que o Ministério Público ainda apresente acusações por obstrução à Justiça ou lavagem de dinheiro – e que, caso sobreviva, ainda seja capaz de entregar algumas reformas.

A consultoria política Eurasia aponta que, no caso de Temer reunir menos de 200 votos, os deputados devem abandoná-lo em uma segunda votação.

Duelo de forças

Segundo pesquisa Ibope, 81% dos brasileiros querem a aceitação da denúncia. Os cálculos de muitos deputados, no entanto, passam longe da questão do conteúdo e gravidade das acusações.

Desde que a denúncia chegou à Câmara, no final de junho, a discussão sobre a permanência de Temer vem sendo dominada por um duelo de forças entre oposição e governo e os interesses políticos dos deputados. Durante o recesso parlamentar, foram poucos os deputados que debateram publicamente o mérito das acusações. Até mesmo a leitura da denúncia no plenário, em 29 de junho, ocorreu em uma sessão esvaziada, com apenas dez deputados presentes.

Originalmente, o Planalto pretendia liquidar a votação ainda na primeira quinzena de julho. Já a oposição forçou um adiamento para depois do recesso, apostando que fatos novos iriam desgastar o governo e espantar mais deputados da base, como se o escândalo da JBS não fosse o suficiente.

Só que não ocorreram muitos fatos novos durante o recesso. A esperada segunda denúncia do procurador-geral, Rodrigo Janot, ainda não veio, assim como a especulada delação do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Nesse período, Temer teve tempo de sobra para se reagrupar, expandindo as táticas já colocadas em prática na Comissão de Constituição de Justiça (CCJ) da Câmara, que fez a análise prévia da denúncia. Na ocasião, 36 dos 40 deputados que votaram a favor do governo foram agraciados com 134 milhões de reais em emendas.

No total, Temer acabou reservando 4,1 bilhões de reais para os deputados desde que o escândalo da JBS veio à tona. Também foram distribuídos cargos e atendidas demandas de bancadas. Os episódios provocaram acusações de que o governo estava simplesmente comprando votos e que os deputados estavam dispostos a negociar.

Parte da oposição também demonstrou fraqueza e indecisão em amealhar votos pelo afastamento, levando até mesmo ao surgimento de acusações de jogo duplo.

A ex-deputada Luciana Genro, do esquerdista PSOL, chegou a dizer que o PT não está realmente interessado na queda de Temer e que a sigla que comandava o Planalto prefere que o peemedebista "sangre" até 2018 para preparar a volta de Lula ao governo. Alguns deputados da oposição também parecem rejeitar a acensão de Rodrigo Maia à Presidência e o fortalecimento do DEM, que é uma sigla adversária em seus estados.

Também no período de recesso, nenhuma figura da oposição parece ter se destacado como grande estrategista, tal como aconteceu na votação de Dilma, quando Eduardo Cunha assumiu o papel de articulador. A linha de frente contra Temer acabou sendo ocupada pelo PSOL e a Rede, que, apesar de barulhentos, não têm influência suficiente.

Temer também contou com uma trégua das ruas. As lideranças dos movimentos de direita que promoveram os protestos contra Dilma decidiram desta vez apoiar o presidente ou não se empenharam nas convocações. Já os protestos organizados pela esquerda petista e de sindicatos ligados ao partido se converteram várias vezes em comícios do ex-presidente Lula, e não em ações efetivas contra Temer, o que pode ter impedido uma adesão maior.

A composição da Câmara que vai votar a denúncia é a mesma que decidiu pelo afastamento de Dilma. Também é a mesma que conta pelo menos 180 deputados que são alvos de inquéritos ou ações penais no Supremo Tribunal Federal – sendo que 60 estão na mira da Lava Jato.