A hipocrisia do pacifismo oficial
9 de abril de 2003"Nós, alemães, somos contrários à guerra, mas temos uma indústria de armamentos. Agora, a coisa se torna interessante. Quase diariamente o governo federal alemão expressa sua condenação do ataque americano ao Iraque. Da mesma maneira como a maioria das pessoas aqui no país. Mas o que se omite à população é que a Alemanha já está envolvida há muito nesta guerra: com peças de armamentos e tecnologia made in Germany..."
Com tais palavras, a apresentadora do programa Monitor, Sonia Mikich, introduziu o polêmico tema abordado na mais recente documentação jornalística sobre o assunto veiculada pela emissora ARD, a principal de direito público do país. O Monitor é um programa de alto prestígio, um magazine político de orientação esquerdista, que se tornou conhecido principalmente ao descobrir diversos escândalos de corrupção e incompetência na administração pública.
Contribuição alemã
Sonia Mikich chamou a atenção para o fato de que a legislação alemã vigente proíbe o fornecimento de equipamentos militares a qualquer país envolvido numa guerra ofensiva, como é o caso dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha no Iraque. Ao contrário da Suíça, que já suspendeu o fornecimento de todo tipo de equipamento bélico suíço aos dois países, o governo alemão prefere ignorar o assunto, afirmou Mikich.
No entanto, se fosse retirada a contribuição tecnológica alemã, os países da coalizão militar contra Saddam Hussein teriam tido enormes dificuldades de realizar seus ataques precisos contra as forças iraquianas, segundo relatam os jornalistas Volker Happe, Kim Otto e Monika Wagener na documentação preparada para o Monitor.
Técnica convencional
A técnica militar convencional da Alemanha está presente na maioria dos sistemas de armamentos dos Estados Unidos. De acordo com as informações pesquisadas pelo Monitor, o tanque de guerra americano Abrams, seu canhão de 120 milímetros e a munição correspondente foram desenvolvidos na Alemanha.
O know-how militar alemão estaria presente também – em maior ou menor quantidade – em quase todos os demais equipamentos utilizados pelas Forças Armadas americanas no Iraque: metralhadoras MP5, pistolas MK23, munição de fumaça e de sinalização, os chamados Fast Attack Vehicle, os blindados leves, o sistema de blindagem Stryker, as pontes escamoteáveis FS B2, os sistemas de direcionamento de mísseis, o sistema de pontes Wolverine, entre outras coisas.
A contribuição alemã não é só de armas e munição, mas também de equipamentos paralelos, de tecnologia avançada, que os tornam mais precisos e mortais. Como os sensores de raios infravermelhos, que dirigem os mísseis disparados por caças F15 e helicópteros Apache para o seu alvo final.
Cliente mais importante
Os EUA foram o mais importante cliente da indústria armamentista alemã nos últimos anos. Desde 1996, afirmou o Monitor, as exportações de armas e equipamentos bélicos para os Estados Unidos aumentaram consideravelmente – com a devida autorização oficial do governo alemão. O volume dos negócios é bilionário.
Mas o que foi até agora legal, tornou-se ilegal com o início da guerra do Iraque, afirmou o jurista Volker Epping, professor de Direito Constitucional da Universidade de Hanôver, em entrevista concedida ao Monitor.
Os autores da reportagem não vêem, contudo, nenhuma perspectiva de suspensão das exportações para os Estados Unidos por determinação do governo social-democrata e verde. Afinal, são muito grandes os interesses econômicos envolvidos nas cooperações bilaterais do setor. Entre outras coisas, elas buscam o desenvolvimento conjunto de diversas armas e equipamentos bélicos: o sistema de defesa antiaérea RAM Block 1, o fuzil XM 29, o sistema de intercâmbio de dados MIDS, um simulador de vôos militares, a munição de precisão XM 395, além de componentes para veículos de desembarque.