A queda do Muro de Berlim segundo uma alemã de 25 anos
27 de outubro de 2014Lembrar datas históricas nunca foi o meu forte, com exceção de uma: 1989, quando caiu o Muro entre as Alemanhas Oriental e Ocidental. Foi o ano em que nasci. Ao ser aberto o primeiro posto de fronteira para os cidadãos da Alemanha Oriental, eu tinha apenas seis meses. Enquanto a minha mãe via a notícia na TV, eu dormia nos braços dela, babando.
Tomei consciência pela primeira vez do Muro no jardim de uma casa, num bairro residencial em Recklinghausen, cidade na região do Vale do Ruhr onde cresci. Aquele pequeno pedaço de muro, que ali se encontrava, não conseguiu provocar em mim nenhuma emoção – com exceção, talvez, da perplexidade por algumas pessoas preferirem colocar um pedaço de concreto velho no seu jardim a plantarem umas belas flores.
"O Muro ainda está de pé"
Aos 16 anos, fiz um intercâmbio estudantil no Brasil. Já no primeiro dia na escola estrangeira, veio a pergunta: "O Muro ainda está de pé?" E: "Como é a vida na Alemanha Oriental?" Eu, que não falava português, olhei com ar pateta, espantada pelo fato de a Alemanha ter alguma coisa a ver com o Oriente. E de que muro a minha colega estava falando?
Ela continuou tentando e eu acabei entendendo: estava falando da República Democrática Alemã, a RDA. Eu respondi que não, que o Muro não existia mais. Por falta de conhecimento da língua portuguesa, como também da história do meu país de origem, não pude dizer mais.
Alguns anos mais tarde, fui então para a universidade. Uma colega mais próxima vinha de uma cidadezinha em Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental, bem á beira-mar. "Ah ótimo, praia!", pensei. "Sim, eu sou do Leste", disse ela. Fiquei intrigada, porque nunca havia pensado sobre isso. As categorias Alemanha Ocidental e Alemanha Oriental simplesmente não existiam para mim.
Na minha cabeça, a Alemanha sempre foi um só país. Quando conheço alguém que vem da antiga RDA, para mim, é como se tivesse crescido na Baviera ou na Baixa Saxônia. Existem, naturalmente, diferenças regionais. Falamos com diferentes sotaques e dialetos, vivenciamos coisas diferentes na nossa infância e nas nossas escolas. Mesmo assim, temos mais coisas em comuns do que diferenças.
"Não façam de conta que está tudo bem"
Infelizmente, nem todos os alemães são da mesma opinião. Principalmente aqueles que vêm do Leste: "Não façam de conta que está tudo bem" é o nome de uma recente publicação do Die Zeit, o maior semanário alemão. Diante disso, me sinto apanhada de surpresa. Ou seja, não está tudo bem?
Nessa série, jovens do Leste alemão escrevem sobre o que, em sua opinião, ainda está errado na Alemanha unificada. Ou melhor, o que os irrita nos alemães do Oeste: "Ah, você voltou à Alemanha das Trevas?", pergunta um colega ocidental ao amigo da antiga Alemanha Oriental, quando esse viaja um dia para a casa.
Outros reclamam da arrogância dos ocidentais, que mal conhecem o Leste, mas, mesmo assim, acham que sabem tudo. E outro acha que a reunificação seria somente uma via de mão única: "Quanto a ex-Alemanha Oriental pôde contribuir? Pouco."
Klaus Schröder, coordenador da rede de pesquisa SED-Staat (alusão ao SED, Partido Socialista Unitário da RDA) na Universidade Livre de Berlim, ocupa-se diariamente do tema. Em conversa com a DW, ele afirmou: "Muitos alemães do Leste dizem que os alemães do Oeste – principalmente os do estado da Renânia do Norte-Vestfália – não se interessam por nós. Eles não têm nenhum interesse em nossa história e histórias. E é assim mesmo." Percebo, então, que pertenço a um grupo de alemães bem ignorantes.
Reunificação: um sucesso para os jovens
Num quiosque na estação ferroviária central de Colônia, vejo um exemplar da principal revista juvenil da Alemanha,Neon. "78% dos jovens adultos acreditam no grande amor. Um a cada dois considera a justiça social como o principal objetivo da política. Uma a cada cinco mulheres depila as axilas. Assim somos nós!". Tudo isso a capa da revista me relata em cores berrantes: a publicação entrevistou mil jovens entre 18 e 35 anos sobre vários temas.
Entre eles, a reunificação alemã: 14% dos entrevistados disseram acreditar que a Alemanha do Leste e do Oeste são muito diferentes – em 2005, essa percentagem era mais do que o dobro. Respondendo a "O que acha da reunificação alemã?, 47% dos jovens afirmaram que ela teve êxito; há seis anos, a proporção era de somente 14%. E hoje apenas uma pequena parcela é da opinião de que a reunificação não funcionou de forma alguma: 4%.
Tão ruim ela não pode ter sido, penso eu, aliviada. A tendência mostrada por essa pesquisa é clara: estamos indo em frente. E poucos contestam, hoje, que a Alemanha seja uma unidade. Precisamos apenas esperar alguns anos, nos conhecermos melhor, reduzir as desigualdades entre Leste e Oeste e, em algum momento, aqueles ocidentais arrogantes pertencerão aos livros de história. Nós vamos, então, nos alegrar pela queda do Muro de Berlim e rir dos estranhos preconceitos que houve um dia.