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A reviravolta no caso Battisti

Thiago Resende de Brasília
18 de dezembro de 2018

Italiano é pivô de um imbróglio jurídico com repercussões políticas que se arrasta desde 2007. Poupado por Lula, ele teve extradição decretada por Temer, antecipando decisão que Bolsonaro também prometera tomar.

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O italiano Cesare Battisti
O italiano Cesare Battisti foi condenado à prisão perpétua na Itália por quatro assassinatos cometidos nos anos 1970Foto: picture alliance//dpa/AP Photo/S. Izquierdo

O italiano Cesare Battisti, ex-membro de uma guerrilha de esquerda condenado por assassinatos em seu país, é pivô de um imbróglio jurídico com repercussões políticas que se arrasta desde 2007, quando ele foi preso com documentos falsos no Brasil.

Poupado pelo ex-presidente Lula em seu último dia de mandato, em 2010, Battisti teve na última sexta-feira sua extradição assinada por Michel Temer, antecipando uma decisão que o presidente eleito Jair Bolsonaro já havia dito que também tomaria. 

O governo argumenta que, por ser um ato de cunho político, o atual presidente tem poder para rever o caso. A defesa de Battisti, por outro lado, questiona a reviravolta no processo e recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para impedir a prisão do ex-membro do grupo terrorista de esquerda Proletariados Armados pelo Comunismo (PAC).

Não é necessário, porém, esperar o julgamento desse recurso para que a extradição seja efetivada. Battisti está foragido. A Polícia Federal (PF) procura pistas de onde o italiano estaria escondido.

Ele foi condenado à prisão perpétua na Itália por quatro assassinatos cometidos nos anos 1970. Mas, de acordo com termos do acordo de extradição firmados com o governo brasileiro, Battisti não poderá cumprir mais do que 30 anos na cadeia – pena máxima prevista na Constituição do Brasil.

"Estamos em contato com a Itália. Nós já tomamos todas as providências legais e logísticas para o procedimento de extradição. Para o STF, o presidente tem o poder de rever seus próprios atos amparados com juízos estritamente políticos", disse o Coordenador-Geral de Extradição e Transferência de Pessoas Condenadas do Ministério da Justiça, Rodrigo Sagastume.

A ministra da Advocacia-Geral da União (AGU), Grace Mendonça, também reforça a tese de que a extradição "é um ato de natureza política e do presidente da República", sendo, portanto, possível uma mudança de deliberação.

Mas a defesa de Battisti, que nega os crimes, alega que a decisão de Temer fere direitos fundamentais, como a segurança jurídica, pois o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva já havia negado em 2010 o pedido de extradição. A solicitação feita pela Itália chegou a ser autorizada pelo STF em 2009, mas os ministros disseram que a palavra final é do presidente da República.

"Ele [Battisti] se estabeleceu no Brasil com intuito de aqui permanecer com a garantia de uma decisão presidencial. Isso não pode ser alterado ao sabor de mudanças políticas", argumenta o advogado Igor Tomasaukas, que diz não manter mais contato com o foragido por uma "decisão pessoal" do próprio italiano.

No ano passado, o ministro Luiz Fux, do Supremo, havia impedido que Battisti fosse extraditado por meio de uma decisão liminar (provisória). Na quinta-feira passada, o próprio ministro revogou esse ato e determinou a prisão do italiano, considerando ainda que o presidente da República teria poder para reverter a decisão de Lula.

Um dia depois, Temer assinou o decreto de extradição do ex-membro do grupo terrorista.

Na avaliação do advogado internacional Maurício Ejchel, apesar de não haver nenhum fato novo no processo, tudo ocorreu dentro da legalidade. "O que havia eram perdões judiciais por parte de Lula, mas que agora não são mais vigentes", disse.

Essa ideia, contudo, não é unanimidade entre juristas. Alguns entendem que o caso se encerrou em 2010 e não poderia ser revisto.

"No momento em que Lula decidiu [pela não extradição], isso não se torna um ato jurídico perfeito? Qual o fato novo? Isso [a decisão de Temer] pode ser interpretada como ilegal, porque o Estado de Direito garante a estabilidade", questiona uma professora de Direito Internacional da Universidade de Brasília (UnB) que prefere não ser identificada por receio de ataques e críticas de militantes de direita.

A AGU discorda dos questionamentos e diz que o ministro do Supremo reforçou o poder de o presidente, ao analisar todo o contexto do caso, reavaliar ou não a decisão sobre a extradição.

O Ministério da Justiça informou que, até o momento, não foi relatada a possibilidade de Battisti ter fugido do país. Quando ele for encontrado, a pasta não deve divulgar o local exato de entrega do extraditado às autoridades italianas por razões de segurança.

Em outubro de 2017, Battisti foi detido na fronteira entre Brasil e Bolívia com dólares e euros em espécie não declarados. Desde então, o presidente Michel Temer passou a discutir e expressar a intenção de extraditar o italiano.

"Há meses essa discussão vem sendo colocada, mas sempre aguardamos a decisão do Supremo. E, agora, o presidente pôde exercer sua competência constitucional", defende a ministra da AGU.

Futuro ministro do governo Bolsonaro, Sergio Moro disse que foi acertada a decisão de Temer e que o asilo concedido pelo governo Lula se deu por motivações político-partidárias: "Os países têm que cooperar entre eles contra a criminalidade. O senhor Cesare Battisti foi condenado por homicídio na Itália, que é um país com Judiciário forte e independente e não cabe ao Brasil ficar avaliando ou não o mérito da condenação."

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