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A vida sob quarentena na Itália

Daniel Heinrich rk
10 de março de 2020

A Itália é o país mais atingido pelo novo coronavírus depois da China. Para conter o avanço do surto, o governo impôs restrições ao deslocamento em todo o país. Em muitas regiões, o turismo é o setor mais afetado.

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Mulher com máscara na estação central de Milão
Mulher com máscara na estação de Milão: após impor quarentena no norte, governo estendeu medida para todo o paísFoto: picture-alliance/dpa/Zuma/C. Furlan

Joachim Nischler é uma pessoa bastante ativa. O chefe do hotel Lindenhof, na pequena localidade de Naturno, no norte da Itália e próximo à fronteira com a Áustria, adora fazer caminhadas, trilhas de mountain bike e é guia certificado de ciclismo de corrida. Nas próximas semanas, terá bastante tempo para seus hobbies, pois está fechando o hotel por causa do surto de coronavírus, que já infectou mais de 113 mil pessoas no mundo e provocou mais de 4 mil mortes.

"Não temos mais nada para fazer. A situação é realmente muito triste, os hóspedes ou não vêm ou pedem estorno da reserva. Normalmente, temos de 50 a 60 reservas por dia. Agora, nenhuma – o que não nos permite cobrir as despesas fixas de jeito nenhum", descreve.

No final da semana passada, o Instituto Robert Koch (RKI, na sigla em alemão), agência governamental alemã para prevenção e controle de doenças, declarou também a região do Tirol do Sul, que faz parte da Itália, como área de risco para o coronavírus. O dono de hotel Nischler teme danos graves e de longo prazo para a economia local.

"Os funcionários do setor de turismo precisam ser demitidos e são os primeiros a sofrer com a crise. Em seguida, vêm os fornecedores e empresas de serviços que não recebem mais pedidos. Se todas essas pessoas passarem a comprar e consumir menos, o comércio também será afetado – e os hóspedes vão deixar de vir", diz.

E é exatamente com essa última realidade que é preciso calcular. Nesta segunda-feira (09/03), a Associação de Hotelaria e Gastronomia local divulgou em comunicado que a temporada de esqui no Tirol do Sul será cancelada antecipadamente por causa da crise do coronavírus. A partir de quarta-feira, restaurantes e operadoras de teleférico serão fechadas até, no mínimo, o dia 3 de abril.

Consequências do vírus para o cotidiano

A decisão da associação faz parte de uma longa lista de medidas drásticas que vêm sendo adotadas na Itália, onde nesta terça, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), havia mais de 9,1 mil casos confirmados e 463 mortes relacionadas ao coronavírus Sars-CoV-2. Oficialmente, trata-se do segundo país com mais mortes pelo vírus depois da China, onde o surto começou em dezembro do ano passado.

Ruas de Milão vazias
Ruas de Milão vazias: surto de coronavírus paralisou a metrópole financeiraFoto: AFP/M. Medina

Na semana passada, todas as escolas e universidades foram fechadas. Em seguida, o governo colocou grande parte do norte, o coração econômico do país, em quarentena. Nesta segunda, o governo expandiu as restrições ao deslocamento para todo o país. Os estabelecimentos de ensino devem ficar fechados até 3 de abril. Cinemas, teatros, museus, clubes esportivos e manifestações foram fechados ou cancelados. Quem violar as rígidas regras pode enfrentar até três meses de prisão e multas de 260 euros.

Daniela Zadra é diretora administrativa de resorts de tratamento de saúde em Meran, no Tirol do Sul. As decisões governamentais têm influência direta sobre a vida cotidiana, disse à DW. Operadores de "bares e restaurantes precisam afastar as mesas, garantindo que haja espaço de pelo menos um metro entre os clientes", afirmou.

O espresso típico italiano, tomado no bar, deve acabar por enquanto, diz Zadra, observando que também não é mais possível ficar de pé no balcão: "Nos escritórios, evitam-se grandes reuniões, muita coisa é feita por telefone ou e-mail", acrescenta.

Ajuda de Bruxelas

O primeiro-ministro italiano, Giuseppe Conte, vê na disseminação do coronavírus uma "emergência nacional". Em entrevista a um dos jornais mais importantes do país, o La Reppublica, ele disse, na segunda, que o bloqueio de mais regiões no norte do país não será a última medida para conter o vírus que causa a doença respiratória covid-19. "Para sair dessa crise, vamos usar todos os meios humanos e econômicos", afirmou.

Para solucionar problemas financeiros, Conte espera contar com a ajuda de Bruxelas, dizendo que as severas regras europeias de endividamento precisam ser afrouxadas para permitir margem de manobra financeira. A flexibilidade permitida pelas regras orçamentárias da União Europeia precisam ser completamente aproveitadas, disse.

Soldados controlam fluxo de veículos no norte da Itália
Soldados controlam fluxo de veículos no norte do país Foto: picture-alliance/ZUMA Press/LaPresse/C. Furlan

Que as medidas do governo não foram aceitas pacificamente em todas as regiões do país ficou evidente num comunicado do Ministério da Justiça italiano, emitido também na segunda-feira: como parte de suas medidas para conter o vírus, o governo restringiu, por decreto emergencial, o contato direto entre detentos e seus familiares em prisões.

A decisão causou várias rebeliões em diversas prisões italianas. Seis detentos foram mortos. Em algumas penitenciárias, houve incêndios intencionais. O sindicato dos funcionários de prisões relatou rebeliões em 27 instituições em todo o país.

"Quebrar a cadeia de infecção"

A localidade turística de Naturno está muito longe de vivenciar efeitos dramáticos do surto de coronavírus. O hoteleiro Joachim Nischler não observou nem uma corrida às compras nem grandes ataques de pânico entre a população local. No máximo, alguns hóspedes demonstraram forte insegurança nos últimos dias, conta.

"Uma senhora estava com tanto medo de ser infectada que nem desceu para a recepção. Ela não chegou a descer para jantar. Então, levamos a comida num carrinho até o quarto dela, fomos embora e ligamos para ela. Assim, garantimos que ela não teria contato conosco", diz.

O próprio Nischler vê as medidas do governo como positivas. Ainda faltam algumas semanas para o início da temporada de verão e os feriados de Páscoa. Até lá, para ele, vale a seguinte premissa: "Precisamos vencer o vírus, quebrando completamente a cadeia de infecção."

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