Alemanha começa a contestar heróis de 2014
19 de junho de 2018A preocupação virou medo. Os alertas da imprensa esportiva alemã sobre o ambiente interno, focado demasiadamente no retorno de Manuel Neuer e na polêmica que envolveu Ilkay Gündogan e Mesut Özil, dúvidas táticas quanto à proteção defensiva e a falta de poderio ofensivo se mostraram justificados na estreia da Alemanha na Copa de 2018.
A derrota da Nationalelf para o México ligou o sinal de alerta entre os jogadores e na imprensa alemã, que elevou o tom na crítica. Os medalhões Toni Kroos, Thomas Müller, Mesut Özil e Sami Khedira, peças fundamentais no tetracampeonato mundial no Brasil e bastiões do grupo na Rússia, não escaparam das críticas por suas atuações. Alguns já começam a ter sua titularidade questionada.
O treinador Joachim Löw está no comando da seleção alemã há 12 anos – sem contar os dois anos como assistente de Jürgen Klinsmann – e era praticamente incontentável. É quase tanto tempo quanto a chanceler federal Angela Merkel está no poder. Agora, porém, Löw não está sendo mais poupado pela mídia, especialistas e ex-jogadores. Sua condução da preparação para o Mundial e, especialmente, a escolha dos convocados e a teimosia com certos jogadores na equipe titular levantaram questionamentos mais explícitos.
Até poucas semanas atrás, muito também respaldado pelos sucessos frente à seleção alemã, a impressão era de que Löw conseguiria consertar as deficiências táticas mostradas nos amistosos preparatórios e que – passada a turbulência em torno da foto tirada por Gündogan e Özil com o presidente da Turquia, Recep Tayyp Erdogan – o foco e a mentalidade vencedora da equipe seriam restauradas. Não foi o que ocorreu, e a confiança em Löw deixou de ser unanimidade.
As críticas tímidas pela não convocação de Leroy Sané, do Manchester City, tornaram-se mais presentes e claras com a atuação desorganizada contra o México. As críticas vão desde lacunas excessivas na composição defensiva, na falta de empenho de certos jogadores, especialmente as principais estrelas, e a teimosia de Löw na escalação. O principal apelo? Pela saída de Özil – um dos medalhões e protegidos do treinador da seleção alemã.
"Löw precisa fazer mudanças em duas posições", disse o ex-jogador Stefan Effenberg. "Fiquei especialmente decepcionado porque a Alemanha sabia exatamente como o adversário iria jogar. Löw deveria colocar Gündogan no lugar de Khedira, além de deixar Özil no banco e pôr Marco Reus."
Outra lenda do futebol alemão, Lothar Matthäus, inclusive chegou a afirmar que "Özil não se sente bem vestindo a camisa da seleção da Alemanha". Nas estatísticas, o meia do Arsenal deu 72 passes na partida contra a seleção mexicana e apenas dois foram para o centroavante Timo Werner.
O ex-goleiro Oliver Kahn, agora comentarista na emissora pública ZDF, criticou o caos defensivo da equipe. "Khedira e Kroos recebem claramente pouca ajuda no centro, tanto de Julian Draxler de um lado, quanto de Müller do outro", disse. Em resumo, Kahn apontou uma "inconsistência" na defesa e afirmou que os zagueiros Mats Hummels e Jérôme Boateng "estão muito retraídos" – um problema evidente já nos jogos preparatórios.
Ainda no campo, após o jogo, Hummels teceu as críticas mais veementes e diretas. "Jogamos que nem contra a Arábia Saudita [amistoso antes da Copa], mas contra um adversário melhor", explicou, "Nós apontamos os problemas. Nossa defesa não é boa, é preciso dizer isso bem claramente. Eu e Boateng ficamos com frequência sozinhos lá atrás. Se nós entrarmos em campo assim novamente, vai ser motivo para preocupação."
O tabloide Bild elencou 11 pontos que Löw precisa melhorar. A manchete nesta terça-feira (19/06): "De agora em diante, não há mais desculpas." Nas questões táticas, o diário citou a melhoria na cobertura e no apoio ao setor defensivo; maior comunicação e sintonia entre os jogadores e ajuste no equilíbrio entre os setores; diminuição no número de bolas perdidas; aceleração no meio-campo e verticalização dos passes. Além disso, o Bild pediu pelo fim de cadeiras cativas na equipe, exigiu a volta da mentalidade vencedora e que Löw seja mais enérgico, recupere a forma de Müller e coloque Reus no time titular.
O tema Reus foi alimentado pelo próprio jogador – e sem querer. Em entrevista, o atleta deixou escapar que estava definido há semanas que não seria titular contra o México e cometeu uma leve gafe. "Assumimos que o torneio é muito longo e que eu jogaria especificamente nos jogos importantes...", disse Reus, antes de interromper e se corrigir. "O jogo [contra o México] obviamente foi importante."
No dia seguinte à derrota contra o México, a imprensa não teve acesso à seleção alemã, e a coletiva de imprensa desta terça-feira foi postergada devido a uma reunião emergencial entre os jogadores.
Neuer conversou com jornalistas alemães e aproveitou para negar os rumores sobre uma ruptura interna entre as gerações de jogadores campeões mundiais no Brasil e aqueles que conquistaram a Copa das Confederações em 2017, mas admitiu que houve discussões acaloradas.
"Nós somos os nossos maiores críticos", salientou. "Conversamos bastante sobre o que temos que fazer. Todo jogo agora é uma final. Precisamos mostrar aquilo que nos fez sermos tão fortes no passado. Importante é que estejamos unidos, que joguemos seguindo um padrão e que implementemos 100% as especificações [do treinador]."
A Nationalelf tem os duelos com Suécia e Coreia do Sul para evitar um fiasco que tem se repetido com frequência nos últimos Mundiais – a eliminação de um atual campeão já na fase de grupos. Nas últimas quatro Copas, apenas o Brasil, em 2006, superou a primeira fase como detentor do título: em 2002, a França sucumbiu perante Dinamarca, Senegal e Uruguai; em 2010, a Itália alcançou a façanha de não vencer Paraguai, Eslováquia e Nova Zelândia; em 2014, a Espanha foi superada por Holanda e Chile.
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