Alemanha quer atrair mais mulheres para as Forças Armadas
30 de julho de 2023O gabinete do chanceler federal da Alemanha, Olaf Scholz, adotou uma série de medidas nesta semana para garantir a igualdade entre os gêneros e atrair um número maior de mulheres para as Bundeswehr, as Forças Armadas alemãs.
As propostas visam alinhar alguns procedimentos dentro das Bundeswehr, com o recente reforço das leis que asseguram oportunidades iguais dentro do governo, de modo geral.
O governo vê a necessidade de aumentar o contingente da Bundeswehr e ampliar suas capacidades militares em reação á guerra provocada pela Rússia na Ucrânia.
"As mulheres estão subrepresentadas na Bundeswehr", afirmou o porta-voz do governo alemão, Steffe Hebestreit, na última quarta-feira (26/07).
Segundo a definição do governo, a representatividade ocorre quando o percentual de mulheres excede 20%. As autoridades de defesa, por sua vez, querem que as mulheres ocupem ao menos a metade das profissões no contingente médico da Bundeswehr.
Nos dois casos, os números estão abaixo do desejado. De acordo com os dados do governo, as mulheres são somente 9,5% do total da Bundeswehr e 45% dos médicos militares.
Se excluídas as funções civis de apoio, a Bundeswehr possui 180 mil membros em todos os setores. Destes, quase 24 mil são mulheres. Dados militares revelam que a parcela feminina aumentou, ao mesmo tempo em que o contingente diminuía progressivamente desde o fim da Guerra Fria.
O governo entende que aumentar a participação de mulheres nas Forças Armadas é uma forma de contribuir para a Agenda de Desenvolvimento Sustentável 2030 da ONU. Segundo Hebestreit, "o empoderamento de meninas e mulheres" é um dos pilares dessa agenda.
Reforço ao alistamento
As reformas se concentram primeiramente nos salários, tanto dos militares da ativa quanto dos que estão na reserva, e visam ainda melhorar os serviços de apoio às crianças, idosos e de familiares com problemas de saúde.
Se a melhora nos salários e a oferta de serviços trouxer alívio ao tipo de trabalho doméstico não remunerado do qual elas ainda tendem a assumir a maior parte, o governo espera que isso possa criar uma abertura ou um incentivo para que elas adiram á força de trabalho, o que inclui trabalhar nas Forças Armadas.
Embora as novas provisões não signifiquem um novo caminho rumo à paridade de gênero, elas se somam aos outros esforços nesse sentido em outros departamentos e no setor provado. Alguns partidos políticos, por exemplo, decidiram lançar 50% de candidaturas femininas e masculinas nas eleições.
O Bundestag (Parlamento alemão) reforçou leis que possibilitam o acesso das mulheres a posições de liderança nas empresas.
"Mundo masculino"
Quando formam fundadas as Forças Armadas da antiga Alemanha Ocidental, em 1955, as mulheres foram barradas. Isso somente viria a mudar em 1975 e, mesmo assim, elas eram limitadas ao contingente médico.
Mesmo após a abertura de todas as funções militares às mulheres, em 2001, o departamento médico continuou sendo o setor com o maior número de participação feminina.
Já do outro lado do muro, na ex-Alemanha Oriental (República Democrática Alemã, RDA), a situação era diferente. O caráter socialista do país se orgulhava de garantir igualdade de oportunidades para mulheres e homens. O Exército, fundado em 1956, permitia participação total da sociedade.
A grande diferença era que os homens eram alistados e as mulheres podiam aderir voluntariamente. As que o fizeram, cumpriam, na maioria, funções administrativas e médicas.
A maioria dos países possui os mesmos desafios do que a Alemanha em termos de representatividade feminina nas Forças Armadas, segundo um relatório do Parlamento britânico de 2021.
Segundo o documento, as mulheres eram somente 11% do contingente regular do Reino Unido. Esse percentual, porém, era um recorde histórico para o país, segundo o Ministério britânico da Defesa, mas ainda ficou aquém da meta de chegar a 15%. O objetivo é chegar a 30% até 2030.
Nos Estados Unidos, onde a luta contra o preconceito de gênero nas Forças Armadas já vem de muito tempo, mais de 17% do pessoa da ativa era composto por mulheres em 2021, segundo o Departamento de Defesa, e a tendência é de aumento.
No início do mês, o presidente Joe Biden indicou a almirante Lisa Franchetti para liderar o grupo do Estado-maior americano. Se for confirmada pelo Congresso, ela se tornará a primeira mulher a entrar no círculo mais alto das Forças Armadas.
Competição no mercado de trabalho
As medidas adotadas pela Bundeswehr para atrair um número maior de mulheres não é somente uma questão de igualdade de oportunidades. Isso tudo se encaixa junto a novas demandas por melhoras generalizadas nas capacidades militares da Alemanha.
O Ministério da Defesa alemão busca se recuperar de décadas de cortes e reduções. O ministro, Boris Pistorius, anunciou o objetivo de acrescentar 20 mil soldados até 2031. Este é um dos elementos da Zeitenwende, ou seja, a mudança nos tempos anunciada por Scholz em reação a invasão russa da Ucrânia. O último reforço das leis de paridade entre os soldados, segundo documentos do governo, está em linha com esses esforços.
Trata-se, porém, de um desafio. Em termos de recrutamento, a Bundeswehr compete com outras instituições do governo e com o setor privado pelo mesmo pool de candidatos.
O envelhecimento populacional gera escassez de profissionais em vários setores daforça de trabalho. Os militares enfrentam "uma tarefa cada vez mais difícil, juntamente com todos outros empregadores", afirmou à DW uma porta-voz do Ministério da Defesa.
"Ha uma demanda crescente por parte dos empregadores por pessoal qualificado para praticamente todas as áreas do setor de negócios", observou.
Os militares ainda têm o problema de ter que atrair os mais jovens, o que implica em "preencher as expectativas da chamada geração Z", o que significa um alto grau de flexibilidade e de liberdade individual no trabalho, explicou.
Essas expectativas costumam bater de frente com a rígida hierarquia militar e estrutura de comando. A adoção de padrões mais rígidos para garantir a igualdade de oportunidades entre os gêneros é parte da estratégia da Bundeswehr para ampliar o recrutamento.
Outro desafio que os militares dividem com o setor privado é de garantir a segurança no local de trabalho, especialmente para as mulheres.
A questão do assédio sexual na Bundeswehr, por exemplo, é algo que ainda perdura em suas fileiras. Entre 2018 e 2020, foram quase 850 casos, segundo a ONG de direitos humanos Terre des Hommes.