Alvo de protesto, presidente da Funai deixa evento em Madri
21 de julho de 2022O presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Marcelo Xavier, foi alvo de um protesto durante uma reunião realizada nesta quinta-feira (21/07) na sede do Ministério das Relações Exteriores da Espanha, em Madri, e deixou o evento às pressas.
O incidente ocorreu durante a assembleia geral do Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e Caribe (Filac), que contava com a presença de indígenas e organizações que lutam em favor dos seus direitos.
Ricardo Rao, ex-funcionário da Funai e ativista pelos direitos dos indígenas, estava no auditório onde o encontro era realizado. Ele dirigiu-se à frente da sala e, em voz alta, acusou Xavier de ser "miliciano" e responsável pelas mortes do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips, ocorridas em junho, no Vale do Javari, na floresta amazônica.
"Este homem não é digno de estar entre vocês. O Itamaraty é um vergonha, está sendo babá de miliciano", afirmou Rao. "Marcelo Xavier é um miliciano. Esse homem é responsável pela morte de Bruno Pereira. Esse homem é responsável pela morte de [Dom] Phillips. Você é um miliciano, Xavier. Bandido, vai para fora", disse.
Assim como Pereira, Rao era indigenista na Funai. Em 2019, ele preparou um dossiê detalhando o corte ilegal de madeira em terras indígenas no estado do Maranhão. Mas, com medo de se tornar alvo de criminosos, fugiu para a Noruega. "Pedi asilo à Noruega, porque sabia que os homens que eu estava acusando teriam acesso ao meu nome e iriam me matar, assim como aconteceu com Bruno", disse ele à agência Associated Press em junho.
Foi na gestão de Xavier à frente da Funai que Pereira foi exonerado do cargo que ocupava na coordenação geral de índios isolados do país. "Aparelharam tudo (...) eles botaram as vísceras para fora de toda a estratégia deles de avançar sobre a política de índios isolados brasileiros", afirmou Pereira à DW Brasil em 2020.
Quem é Marcelo Xavier
Ex-delegado da Polícia Federal, onde foi alvo de duas investigações internas e chegou a ser afastado de uma operação em terras indígenas, Xavier comanda a Funai desde julho de 2019 e vem implementando a política do presidente Jair Bolsonaro de não demarcar novas terras indígenas.
Em setembro de 2021, ele virou réu na Justiça do Pará por descumprir uma ordem judicial que o obrigava a dar continuidade à demarcação do território indígena Munduruku. No mês seguinte, foi alvo de um pedido de afastamento por improbidade administrativa, entregue pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) à Justiça Federal de Brasília, que o acusou de trabalhar para inviabilizar a demarcação de terras indígenas, facilitar a grilagem e ser omisso na defesa judicial dos direitos indígenas.
Em junho, o Conselho Nacional de Direitos Humanos, ligado ao Ministério da Justiça, recomendou que ele fosse afastado do cargo, na sequência da morte de Bruno Pereira e Dom Phillips. Uma comissão temporária criada pelo Senado para investigar a criminalidade no Norte do Brasil, especialmente na floresta amazônica, também aprovou em 6 de julho um pedido para o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, afastar Xavier da presidência da Funai.
Funai repudia intervenção
Em nota, a Funai repudiou o protesto de Rao e afirmou que "tais atitudes são irresponsáveis, violentas e antidemocráticas, inviabilizando, assim, qualquer tipo de diálogo sadio e producente".
"O manifestante que proferiu de forma agressiva os ataques verbais foi funcionário da Funai até o ano de 2020, tendo sido exonerado na ocasião por não ter cumprido as condições de estágio probatório", afirmou a nota.
A Funai disse que Xavier decidiu sair voluntariamente do auditório e que Rao será "objeto de ação judicial por crime contra a honra e ação de indenização por danos morais".
bl (Lusa, DW, ots)