Analistas atribuem queda de Marina a ataques e fim da comoção nacional
26 de setembro de 2014As intenções de voto em Marina Silva (PSB) parecem passar por um refluxo. Depois de um crescimento vertiginoso em agosto, mês em que a candidata entrou na disputa pela Presidência da República, pesquisas recentes indicam tendência de queda.
Para os especialistas, o desgaste político da campanha, somado ao esgotamento da comoção nacional gerada pela trágica morte de Eduardo Campos, explicam a piora no desempenho da ambientalista nas pesquisas. Com a tragédia, Marina havia sido alçada ao centro da corrida eleitoral.
"A tragédia lhe deu muita atenção da mídia. Ela passou horas e horas na televisão, como nunca tinha aparecido na sua vida, e foi catapultada para uma posição muito forte. É o que chamamos de efeito anabolizante", diz o diretor do Centro de Estudos de Opinião Pública da Unicamp, Valeriano Costa.
Subida rápida
Os estudiosos lembram que Marina já tinha um grande potencial de voto, de cerca de 20% do eleitorado, desde as eleições de 2010. Entretanto, no início de setembro, a candidata chegou a aparecer com 33% numa pesquisa do Ibope, a apenas quatro pontos de Dilma Rousseff (PT), e bem à frente de Aécio Neves (PSDB).
"Os indecisos, que não queriam votar nem em Aécio nem em Dilma, optaram por Marina. Ela politizou gente que tinha se despolitizado e assim cresceu muito nas intenções de voto", afirma Renato Janine Ribeiro, o professor de ética e filosofia política da Universidade de São Paulo.
Menos de um mês depois, em um novo levantamento do instituto, Marina caiu para 29%. Ao mesmo tempo, Dilma e Aécio se recuperaram, atingindo 38% e 19%, respectivamente.
"Agora há um refluxo. Muitos dos votos que a Marina havia roubado de Dilma e Aécio voltaram para esses candidatos. Além disso, os indecisos, que tinham diminuído, voltaram a aumentar", explica Costa.
Os especialistas avaliam que, a esta altura, boa parte do encanto e do entusiasmo iniciais com a candidata passaram. O eleitorado que havia migrado para Marina não a conhecia tão bem, e agora parte dele voltou atrás. Aqueles que já eram fiéis à ambientalista continuam a apoiá-la. "Ela caiu porque subiu depressa demais", opina Ribeiro.
Desgaste da campanha
Por ter entrado tarde na campanha, Marina enfrentou dificuldades que outros candidatos não enfrentaram, mas também foi beneficiada pela situação. O principal deles foi o de ter escapado de críticas e ataques por mais de um ano. Isso explicaria a alta intenção de voto da nova candidata, que tinha um índice de rejeição muito baixo.
"Quem entra no final tem uma vantagem, porque entra incólume. Ela não sofreu a pancadaria política que Dilma, Aécio e o próprio Eduardo Campos sofreram", diz Janine Ribeiro.
Já dentro da campanha eleitoral, a realidade era diferente, e Marina perdeu votos. "Ela passou a sofrer o desgaste natural de ser uma candidata como outro qualquer, começou a ser criticada, cobrada e avaliada pelo eleitorado", aponta Costa.
Além disso, Marina conta com pouco tempo no horário eleitoral gratuito, em comparação aos outros candidatos. Isso, segundo o especialista, torna a campanha bastante desigual – e ainda mais desgastante para a ambientalista.
Fragilidades da candidatura
De acordo com os especialistas, Marina expôs fragilidades de sua candidatura durante a campanha. Inconsistências em seu programa de governo e recuos públicos teriam criado incertezas em relação a ela.
"Isso já era previsto. Ela não tinha coordenação de campanha, equipe coesa nem programa de governo. Tudo isso foi feito apressadamente, e as contradições vieram a público, assim como os conflitos internos em seu próprio grupo de apoio", afirma o cientista político Marco Antonio Teixeira, da Fundação Getúlio Vargas.
Os recuos da candidata foram rapidamente aproveitados pelas campanhas de Aécio e Dilma e ajudaram a desconstruir a imagem de Marina. Na avaliação dos analistas, as propagandas dos opositores foram decisivas para a queda das intenções de voto na ambientalista.
Marina afirma que não se preocupa com as pesquisas e que é vítima de ataques mentirosos dos adversários. "PT e PSDB estão unidos pela primeira vez na história do país em uma cruzada contra mim", afirmou recentemente.
Costa, entretanto, afirma que a ambientalista apenas passa por um movimento natural de refluxo. "Não existe esse poder de acabar com um candidato somente com campanha. O eleitor não é bobo, ele desconfia da propaganda", afirma.
Como lembram os especialistas, a própria campanha de Marina evidenciou suas fraquezas. "As campanhas do PT e do PSDB ajudaram, mas não foram do nada, elas aproveitaram as contradições da candidata", ressalta Teixeira.
Costa menciona a independência do Banco Central como um erro estratégico. Segundo ele, incluir um tema polêmico como uma das principais bandeiras de campanha é muito arriscado. Ele lembra que nem Aécio, considerado o candidato mais neoliberal, fez essa proposta.
Ele compara a situação a uma luta de boxe. "O campeão, que seria Dilma, pode ficar na defensiva. Mas o desafiador, a Marina, tem que dar a cara a tapa. Só que não pode cometer erros. A Marina abriu muito o flanco, se expôs demais e apanhou muito", avalia.
Tendência de estagnação
Entre os especialistas há dúvidas se a candidata vai continuar perdendo votos. Para Costa, o eleitorado da ambientalista "desinchou" e voltou ao seu patamar natural, de 2010. E alerta: Marina não vai sumir do mapa eleitoral.
"A política não é essa montanha-russa. Às vezes o cenário se altera repentinamente, como ocorreu nessa campanha, que teve eventos espetaculares. Mas a base de preferência do eleitor é mais estável e segue outro ritmo, de longo prazo", defende.
Teixeira concorda que o cenário tende a se estabilizar. A grande incerteza, agora, passa a ser o segundo turno. "Aí sim a Marina perdeu muito, cerca de 11 pontos", lembra.