Antecipação das eleições deve acontecer, garante especialista
4 de julho de 2005Em entrevista à Deutsche Welle, o renomado cientista político Peter Graf Kielmansegg, professor da Universidade de Mannheim e ex-vice-presidente do Tribunal Constitucional Federal, falou sobre a atual situação política na Alemanha, depois que o Parlamento rejeitou o voto de confiança pedido pelo chanceler federal Gerhard Schröder, na sexta-feira (01/07).
Deutsche Welle: O chanceler federal da Alemanha perdeu a moção de confiança. Agora o presidente do país, Horst Köhler, precisa decidir se dissolve o Parlamento e convoca novas eleições. Na sua opinião, ele fará isto?
Peter Graf Kielmansegg: Eu acho bastante provável. Ele está sob enorme pressão. Se ele não agir desta maneira, afundará de tal maneira a política alemã como nenhum outro presidente ousou fazer até hoje. Deste modo, eu penso que ele tomará esta decisão, o que não significa que ela seja constitucional.
Isto com certeza será examinado pelo Tribunal Constitucional Federal. Uma queixa já está sendo preparada. Seria possível que Köhler dissolvesse o Parlamento e os juízes dessem um parecer contrário à decisão do presidente?
Sim, é possível, mas pouco provável. O Tribunal sempre analisa as conseqüências políticas de suas sentenças. Considerar inconstitucional a decisão do presidente alemão de dissolver o Parlamento seria uma intervenção tão séria que eu posso antever que o Tribunal, assim como ocorreu em 1983, encontrará um caminho para considerar esta decisão constitucional.
Não seria o momento de reformar a Carta Magna, incluindo o direito de autodissolução?
Sim, é verdade. Agora vivenciamos pela terceira vez na Alemanha a experiência na qual os argumentos a respeito uma dissolução do Parlamento são elaborados com extrema dificuldade, muitas voltas e distorção, percorrendo rumos que não estavam previstos. Existe uma constelação política que exige novas eleições. E para tornar isto viável é preciso que haja um meio pelo qual se possa orientar. Não caminhos tortuosos pelos quais é preciso lutar para finalmente conseguir o que se almeja, através de argumentos hipócritas.
Como o senhor avalia a atitude do chanceler federal Gerhard Schröder? Trata-se de um gesto político de um chefe de governo, uma espécie de renúncia, ou apenas um ato de desespero?
A meu ver, não é nem uma nem outra coisa. Talvez sejam as duas ao mesmo tempo. Existem bons motivos para se afirmar que o país chegou a um ponto em que é necessário um recomeço político. Pode-se dizer que quando o chanceler deixa o caminho livre e renuncia a mais um ano de governo, está tendo um gesto de estadista. Por outro lado, é preciso ressaltar também que ele, com certeza, analisou e percebeu que esta intervenção lhe é mais conveniente do que permanecer ainda um ano no governo.
As grandes reformas implantadas por Schröder fizeram com que o SPD, partido governista, deixasse de apoiá-lo incondicionalmente. O que o chanceler fez de errado?
Ele caiu em uma situação histórica onde se viu forçado a tomar decisões políticas que eram bastante ou totalmente incompatíveis com a postura do SPD. Foi justamente o partido dos social-democratas que reestruturou o Estado social e promoveu mudanças sérias no direito tributário. Foram medidas difíceis de contar com o apoio de um partido com tamanha tradição. Mas é preciso dizer que nos últimos anos ele conseguiu manter certa disciplina dentro de seu partido. O pedido do voto de confiança se baseia nisso, no fato de ele não contar o apoio da maioria, de não ser mais tão confiável.
Os social-democratas em outros países, na Espanha, Escandinávia e Reino Unido, revisaram seus programas e posturas nos anos 90. O SPD não. Teria a mentalidade dos social-democratas alemães parado nos anos 80 ou 70?
Essa renovação a que você se refere nos outros países aconteceu basicamente durante a fase em que faziam oposição ao governo. Isto é evidente no Partido Trabalhista inglês. Blair assumiu com um partido recém-reestruturado. Em comparação mundial, os social-democratas alemães despertaram muito tarde. Isto, entretanto, não vale apenas para os social-democratas. Toda a política alemã acreditou durante muito tempo que poderia continuar agindo de acordo com sua tradição. Muito do que se faz necessário hoje deveria ter sido feito pelo governo Kohl. Portanto, falamos mais de um atraso ou mesmo cochilo da política alemã como um todo do que a negligência específica de um partido.
Setenta por cento dos alemães dizem que o Estado do bem-estar social precisa sofrer reformas mais profundas do que as adotadas até agora, mas não querem que estas reformas comecem com eles. Como governar um povo que pensa assim?
Suponho que, se alguém tiver uma resposta para esta pergunta, pode pode vendê-la por um alto preço. Eu não a tenho. De fato, esta contradição interna é bem clara e, em si, não é difícil de explicar. Existe a convicção básica de que algo precisa mudar. Por outro lado, o povo não quer que as mudanças ocorram com ele. Os políticos devem aprender a argumentar de modo diferente do que têm feito até agora. Eles talvez precisem esperar para que a situação aponte com mais evidência a necessidade de mudanças. Mas eles têm que realmente lutar para convencer os eleitores de uma forma que não fizeram até agora.