Ao limitar drones, Obama expõe uma de suas políticas mais secretas
24 de maio de 2013Ao dedicar boa parte de seu discurso de quinta-feira (24/05) aos aviões não tripulados, o presidente Barack Obama deu, pela primeira vez, um pouco de transparência a uma das áreas tratadas com maior sigilo – e uma das mais controversas – dentro da guerra americana contra o terrorismo.
Desde que a tática passou a ser usada, no governo George W. Bush, o Escritório de Jornalismo Investigativo estima que, só no Paquistão, mais de 360 ataques com os chamados drones tenham sido realizados, a maioria na gestão de Obama. No Iêmen, segundo a mesma fonte, os EUA teriam usado cerca 50 vezes aviões não tripulados para atingir alvos.
"É um passo importante, não apenas uma medida padrão", disse à DW Anthony Dworkin, especialista em direito internacional do Conselho Europeu de Relações Internacionais. "O governo está abordando claramente a questão dos ataques de drones e sinaliza um grande esforço para aumentar a transparência. Até o momento, o programa de aviões teleguiados vinha sendo excessivamente secreto."
Discussão renovada
No discurso, Obama fez a sua mais extensa defesa do uso de aviões não tripulados, mas assinalou que vai determinar novos padrões para a realização de ataques do tipo. Os alvos dos drones, assinalou, devem representar uma ameaça "iminente" contra os americanos e devem ser atacados apenas quando não houver qualquer possibilidade de captura.
Até agora, os drones dos EUA eram enviados para atacar e matar qualquer um que pertencesse a grupos armados – incluindo, por exemplo, insurgentes de baixo escalão lutando contra o governo iemenita. A diretiva de Obama é vista como um compromisso para reduzir os chamados "ataques de assinatura" – nos quais os EUA escolhem seus alvos baseados não em quem as pessoas são, mas onde estão e no que estão fazendo.
"Para mim, a maior objeção é a morte de pessoas fora dos reconhecidos campos de batalha", opina Dworkin. "Combatentes vistos simplesmente carregando armas em determinadas áreas são atacados e, devido às circunstâncias em que os ataques aéreos são realizados, nem sempre é fácil determinar quantas pessoas morreram."
Segundo relatório do think tank americano Conselho de Relações Exteriores, no governo Bush, a proporção dos que foram mortos por drones no Paquistão identificados em relatórios confiáveis como civis ou "desconhecidos" foi de 40%. Em 2012, no governo Obama, as taxas de acidentes com civis e desconhecidos caiu para 11%.
"Dizer que uma tática militar é legal, ou mesmo efetiva, não é dizer que é sábia ou moral em todos os casos", afirmou Obama no discurso na Universidade Nacional de Defesa, em Washington. "E, antes que qualquer ataque seja realizado, deve-se ter a maior certeza possível de que nenhum civil será morto ou ferido – o padrão mais elevado que conseguirmos estabelecer."
O discurso foi feito num momento de renovada discussão sobre o uso de drones. No mesmo dia, o procurador-geral dos EUA, Eric Holder, admitiu que um quarto cidadão americano – Anwar al-Awlaki, nascido no Novo México – foi morto por um míssil de avião não tripulado no Iêmen, em setembro de 2011. Segundo ele, as autoridades concluíram que Awlaki representava uma "ameaça contínua e iminente" aos Estados Unidos.
Os assassinatos de três outros americanos em operações antiterrorismo desde 2009 eram conhecidos anteriormente, mas a admissão – feita pelo procurador-geral em carta ao presidente da Comissão Judiciária do Senado, Patrick Leahy – parece ter sido programada para destacar a vontade do governo Obama de tornar mais transparente o programa de drones.
As medidas delineadas por Obama são parte de um guia de diretrizes políticas que ele deve assinar nesta semana. O documento deve limitar o uso de ataques aéreos não tripulados – cada um dos quais tem de ser aprovado pessoalmente pelo presidente – em países que não são evidentes zonas de guerra.
Menor participação da CIA
O movimento em direção a uma maior transparência também é enfatizado por uma mudança organizacional. No início desta semana, uma fonte do governo disse à agência de notícias Reuters que os militares – e não mais a CIA – passaram a executar a maioria dos ataques com drones, com exceção dos realizados no Paquistão.
"Eu não sei se uma diretiva generalizada vai ser tão útil quanto a diplomacia bilateral com os países em questão", disse à DW o advogado Pejman Yousefzadeh, especializado em políticas públicas. "Os governos de alguns países podem até concordar internamente com a intervenção americana, mas terão de condenar os EUA em público."
Para Yousefzadeh, Obama deveria estabelecer uma Comissão Federal de Inteligência, uma agência regulatória independente que iria avaliar qualquer alvo que a Casa Branca teria identificado. Na qualidade de comandante em chefe, o presidente ainda seria capaz de invalidar as conclusões da comissão, mas teria de informar ao Congresso que estaria fazendo isso, tornando o programa mais transparente e sujeito a um processo legal.
"Não é possível haver uma política presidencial de guerra que é completamente livre da supervisão do Congresso", afirma.
A atitude de Obama foi uma clara reação às críticas crescentes ao programa de drones – nos últimos meses reforçadas não somente por grupos de direitos humanos, mas também da direita liberal americana. O senador republicano Rand Paul apresentou na última quarta-feira um projeto de lei de sua autoria contra a intrusão governamental por meio do uso de aviões não tripulados.
O Ato de Preservação da Liberdade contra a Vigilância Injustificada, defendido por Paul, destina-se a proteger o direito do cidadão à privacidade pessoal em caso de um eventual uso de drones nos EUA.
"O uso da vigilância por drones pode funcionar nos campos de batalha no exterior, mas não é adequado para uso irrestrito nas ruas dos EUA", disse Paul em comunicado.