Brasil e Rússia
5 de setembro de 2011A visita à Rússia do ministro brasileiro do Exterior, Antonio Patriota, aconteceu num momento de relações comerciais delicadas entre Brasília e Moscou. Autoridades russas mantêm há mais de um mês um embargo contra quase 100 frigoríficos brasileiros. Ao longo do fim de semana (3 e 4/09), Patriota e seu colega de pasta, Serguei Lavrov, tocaram na problemática, mas deixaram as "negociações pesadas" para os órgãos competentes.
Uma delegação técnica brasileira irá à Rússia nos próximos dias para acelerar o processo de suspensão do embargo, imposto a carnes do Mato Grosso, Rio Grande do Sul e Paraná. Já os russos pretendem voltar a fazer inspeções nos frigoríficos – para suspender ou estender a proibição.
O veto russo ao maior exportador mundial de carne é resultado de novas regras do Serviço Veterinário da Rússia, que não foram observadas ou não esclarecidas por completo pelas autoridades brasileiras junto ao governo russo, afeta principalmente os produtores suínos.
A Rússia é hoje o 16º parceiro comercial do Brasil. Em 2010, houve um aumento de 42% no fluxo de negócios entre os dois países, totalizando 6 bilhões de dólares, e com saldo positivo para o lado brasileiro. O mercado russo é o maior consumidor da carne bovina brasileira, segundo dados da Câmara de Comércio Brasil-Rússia, e a suinocultura nacional exporta 43% de sua produção para o país euro-asiático.
"Apesar do embargo atual, a nossa corrente comercial com a Rússia deve chegar aos 7 ou 8 bilhões de dólares até o final deste ano. Queremos agregar outros valores a essa corrente, que consiste basicamente de produtos primários: agropecuários na exportação brasileira e fertilizantes na importação", prevê Gilberto Ramos, presidente da Câmara de Comércio Brasil-Rússia.
Approach entre os BRICS
Distantes geograficamente, mas unidos intimamente pelos interesses comuns aos BRICS (grupo de emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), Brasília e Moscou visam novas áreas de aproximação: aviação, energia e máquinas pesadas são setores promissores. Segundo os cálculos de Gilberto Ramos, o potencial de investimentos recíprocos é de 50 bilhões de dólares no prazo de oito a dez anos.
A produtora russa de veículos pesados Kamaz, por exemplo, estuda sua entrada no Brasil e busca um local para se instalar. No início do ano, as siderúrgicas Mechel e Severstal tornaram-se coproprietárias de empresas brasileiras e "já investiram algumas centenas de milhões", comenta o presidente da Câmara. A Severstal, a maior fabricante de aço da Rússia, adquiriu 25% do capital da brasileira SPG Mineração, por 49 milhões de dólares.
A Gaztrom deve ser a próxima a estrear em solo brasileiro: a maior empresa de gás do mundo já abriu um escritório de representação no Rio de Janeiro, e está de olho na parceria com a Petrobras.
Também há empresas brasileiras no mercado russo: JBS Friboi, um dos maiores produtores de carne do mundo, inaugurou um centro de distribuição no ano passado, a Metalfrio também atua naquela região, e a Marcopolo, fabricante de carrocerias de ônibus, tem planos de ingressar no país.
Jogo político
Mas não só a economia é um item importante na agenda comum dos dois parceiros, embora as agruras nesse setor possam ter consequências não desejáveis. "O governo brasileiro tem que manejar com certo jogo de cintura porque às vezes os entraves econômicos desembocam em obstáculos políticos", comenta Adriana Erthal Abdenur, coordenadora do BRICS Policy Center, centro de estudo com base no Rio de Janeiro.
Brasileiros e russos querem aproveitar o cenário favorável de 2011. Entre permanentes e não permanentes, os cinco países do BRICS são membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas até o fim do ano. "É um momento particularmente interessante para o Brasil porque esses agrupamentos, como o BRICS e G20, estão tentando articular a reforma do sistema global financeiro, entre outros assuntos importantes para os emergentes", adiciona Abdenur.
Moscou busca apoio brasileiro para acelerar seu processo de entrada na Organização Mundial do Comércio, OMC. A Rússia ainda tem a condição de país observador, e atua apenas em consultas informais. Já o Brasil é membro desde a criação do órgão, em 1994, e tem poder de decisão dentro das disputas e acordos negociados pela organização.
Em abril último, Dilma Rousseff demonstrou pessoalmente interesse de estreitar os laços, ao lado do presidente russo, Dimitri Medvedev, durante o encontro paralelo à terceira cúpula dos BRICS na China. Em maio, foi a vez do vice-presidente, Michel Temer, ser recebido pelo primeiro-ministro russo, Vladimir Putin. E a expectativa é que a presidente do Brasil visite a Rússia ainda em 2010.
Autora: Nádia Pontes
Revisão: Roselaine Wandscheer