Belo Monte
2 de junho de 2011O presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Curt Trennepohl, reconheceu que a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, vai significar danos ambientais. Trennepohl afirmou que, "se, por um lado, há uma perda ambiental, por outro lado há um ganho socioambiental muito grande".
Como exemplo de benefícios que poderiam surgir com a construção da usina, ele citou o município de Altamira, cidade polo na região, que ainda não tem saneamento básico total e que passará a ter com a obra. A declaração do presidente do Ibama foi feita durante o anúncio oficial, em Brasília, da licença que autoriza o início das obras da usina hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, no estado do Pará, região Norte do Brasil.
A principal reclamação ouvida em Brasília depois do anúncio foi o descumprimento de condicionantes, ou exigências preliminares que precisariam ser atendidas para a concessão da licença. De acordo com Marcelo Salazar, coordenador adjunto do projeto Xingu da organização Instituto Sócio Ambiental (ISA), o Ibama emitiu essa licença com base em estudos da própria Norte Energia, empresa que conduzirá as obras, e a partir de uma vistoria de campo que durou 11 dias. "Quando a gente vai para o detalhamento dessas condicionantes e começa a entender a complexidade delas, a gente vê que é impossível", disse Salazar.
Como exemplo de uma exigência não atendida, Salazar citou o sistema de saneamento de Altamira e cidades próximas. A visão do ISA é que, ao contrário do que disse o presidente do Ibama, essa estrutura de saneamento deveria estar pronta antes da concessão da licença. "A licença está saindo e a gente não tem a região preparada e também não conseguimos ver um indicativo de que essa região vai estar preparada até o início da instalação", alertou Salazar. A estimativa do governo é que a obra gere 20 mil empregos diretos e 80 mil indiretos, o que poderá aumentar significativamente o número de moradores na região.
O Ibama garante que vai estar atento ao cumprimento de todas as normas ambientais e pode interromper as atividades caso haja algum descumprimento. Curt Trennepohl explicou que muitas das condicionantes só serão cumpridas ao longo das obras. "Das 40 condicionantes estabelecidas para a emissão da licença de instalação, o Ibama considerou todas em condições satisfatórias para a emissão da licença.
Comunidades indígenas
O ministro brasileiro de Minas e Energia, Edison Lobão, foi enfático ao dizer que as comunidades indígenas estão fora de perigo, já que, segundo ele, a mais próxima da usina fica a 31 quilômetros. "Nenhuma reserva indígena será alagada por Belo Monte. Nenhum índio terá que sair de onde se encontra hoje. Não há, portanto, o que falar em torno de prejuízo das comunidades indígenas, que queremos sempre preservar. Nenhum índio será afetado pelo lago de Belo Monte", garantiu Lobão.
Mas não é essa a situação descrita por Renato Santana, representante do Conselho Indigenista Missionário. Segundo ele, "o povo Arara vive do rio Xingu e o impacto na Volta Grande vai ser forte para a comunidade". Santana alerta sobre uma situação semelhante para outras tribos: "Os caiapós também vão perder boa parte das condições de subsistência com as barragens que vão ser construídas".
"Revolução econômica e social"
O tom adotado pelo governo com o anúncio é o de valorização do desenvolvimento da área onde será instalada a usina. O ministro Edison Lobão disse que "haverá uma revolução econômica e social" ao redor de Belo Monte. "Jamais aquela região, em curto prazo, teria condições de crescer tanto, de evoluir tanto, de ter tamanhos benefícios se não fosse a existência que começa agora de Belo Monte", disse Lobão.
Esta perspectiva de desenvolvimento está amparada no Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável (PDRS) do Xingu, detalhado pelo governo logo após o anúncio da autorização para o início das obras. O plano, segundo Brasília, tem o objetivo de "promover o desenvolvimento sustentável da região do Xingu, a participação da população em sua gestão e a presença dos principais órgãos governamentais de forma visível, permanente e coordenada".
O pacote de medidas socioambientais envolve três ações principais. A primeira é a instalação do Comitê Gestor do Plano, formado por representantes dos governos federal, estadual e municipais, comunidades indígenas, movimentos sociais, organizações ambientais, entidades sindicais dos trabalhadores rurais, urbanos, de pescadores e entidades patronais. O Comitê, que deverá iniciar as atividades nesta sexta-feira (03/06), será responsável pela definição de prioridades e pelo monitoramento da execução das ações do Plano.
A segunda medida anunciada é a instalação, em Altamira, da Casa do Governo Federal. Será uma espécie de representação local dos principais órgãos do governo para agilizar a resolução de demandas futuras. A terceira medida é a operação Cidadania Xingu, um mutirão de dois dias que vai oferecer serviços básicos à população local, como emissão de documento, orientação para empreendedores individuais e regularização ambiental.
Pará move ações judiciais
O Ministério Público federal no estado do Pará já entrou com 11 ações na Justiça contra o projeto da Usina. Na semana passada, o órgão enviou uma recomendação ao Ibama, solicitando o adiamento da concessão da licença até que todas as ações de prevenção e redução dos impactos socioambientais do projeto estivessem cumpridas.
Em resposta a um possível questionamento judicial para a licença permanente, a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, disse que o licenciamento está "robusto" e o governo está "tranquilo" e preparado para uma possível batalha judicial. Ela reconheceu, também, que o Ministério Público tem o direito de acionar, eventualmente, a Justiça em relação ao licenciamento.
A assessoria de imprensa do Ministério Público Federal no Pará disse à Deutsche Welle que o órgão só irá se pronunciar depois de analisar os detalhes da concessão anunciada pelo Ibama.
Autora: Ericka Galindo
Revisão: Roselaine Wandscheer