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Abusos na Igreja

6 de abril de 2010

Jornal alemão "Die Zeit" divulga atas secretas que sugerem o escamoteamento de caso de pedofilia em diocese nos EUA. Responsabilidade pesa sobre secretário de Estado do Vaticano e braço direito do papa, Tarcisio Bertone.

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Processo judicial contra pedófico foi suspenso após consulta com Tarcisio BertoneFoto: AP

O site do jornal alemão Die Zeit divulgou atas secretas do Vaticano que documentam a protelação de medidas eclesiásticas contra um padre acusado de cometer abuso sexual contra 200 crianças no condado de Milwaukee, Wisconsin (EUA), entre os anos de 1950 e 1970.

O caso Murphy levou recentemente o diário norte-americano New York Times a acusar o atual papa de negligência na punição de casos de abuso sexual dentro da Igreja. Afinal, Joseph Ratzinger – prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé durante o papado de seu antecessor, João Paulo 2º – era o destinatário de diversas cartas que o arcebispo de Milwaukee enviou ao Vaticano nos anos de 1990, a fim de pedir – em vão – providências em relação a Murphy.

Na época, o caso foi assumido por Tarcisio Bertone, então secretário da Congregação para a Doutrina da Fé e vice de Ratzinger.

Os documentos foram interpretados pelo jornal alemão como uma tentativa – por parte de Bertone, atual secretário de Estado do Vaticano e principal auxiliar do papa – de escamotear o caso Murphy.

As atas divulgadas pelo Die Zeit fazem parte da correspondência entre o Vaticano e o arcebispo de Milwaukee, Rembert Weakland, então responsável pelas investigações. Os documentos foram cedidos ao semanário alemão por advogados de antigas vítimas de Lawrence Murphy, diretor de uma escola católica para deficientes auditivos, acusado de ter cometido abuso sexual contra 200 crianças surdas entre 1950 e 1974, muitas vezes durante a confissão.

Processo judicial suspenso após reunião no Vaticano

A ata de uma reunião presidida por Tarcisio Bertone no Vaticano em maio de 1998 contém as seguintes acusações relatadas pelo arcebispo de Milwaukee, Rembert Weakland:

"1) Há um grande número de vítimas de abuso por parte de Murphy, nem todas identificadas; 2) em 1974, houve uma intervenção contra Murphy, mas nada foi registrado nos arquivos da arquidiocese [isso ocorreu após a ameaça de um julgamento civil que culminou na imposição de uma punição ao acusado e provocou a transferência do padre para uma outra diocese, ou seja, a Superior]; 3) a comunidade dos surdos mostra grande indignação em relação ao caso e recusa qualquer solução pastoral; 4) em decorrência do longo tempo passado desde a ocorrência desses fatos, não é mais possível iniciar um processo civil no estado de Wisconsin; 5) Murphy não tem nenhum senso de remorso pelo ocorrido (...) 6) além disso, há o perigo de um grande escândalo se o caso for divulgado pela imprensa. De acordo com testemunhas, os abusos de Murphy eram inicialmente cometidos durante a confissão."

Menos de três meses após essa reunião, realizada no Vaticano a pedido do arcebispo Weakland, ele voltou a escrever a Tarcisio Bertone para comunicar que então "suspenderia formalmente o processo judicial iniciado contra Murphy" e iniciaria apenas um processo administrativo para impedir o padre em questão de ministrar os sacramentos.

Com a disponibilização desses documentos, o semanário alemão Die Zeit corrobora a cobertura do New York Times sobre o protelamento da investigação e da punição de casos de abuso sexual dentro da Igreja Católica. Seja qual tenha sido o motivo, os documentos divulgados pela imprensa sugerem que os apelos dos delatores não encontraram ouvidos no Vaticano.

Uma onda de denúncias sobre a prática sistemática de abuso sexual e agressão física em instituições católicas vem abalando a Alemanha desde janeiro deste ano. Na Irlanda, os casos revelados também assumiram grandes proporções. Durante a Páscoa, o Papa Bento 16 foi acusado pela opinião pública internacional de silenciar sobre um dos maiores escândalos que vem ameaçando a credibilidade da Igreja Católica.

Autora: Simone Lopes
Revisão: Rodrigo Rimon

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