Bancos italianos, a próxima dor de cabeça da UE
12 de julho de 2016Quanto mais se olha para alguns problemas na Europa, piores eles parecem ficar. O setor bancário italiano é um deles. A Autoridade Bancária Europeia (EBA) estima em 200 bilhões de euros o volume de "créditos podres", ou seja, empréstimos sem cobertura concedidos por bancos italianos; outros órgãos calculam que a soma chegue a até 360 bilhões de euros.
A dimensão desse volume depende de como ele é calculado. Mas a mensagem é clara: se empréstimos dessa ordem não forem honrados, o Estado italiano não poderá arcar sozinho com as dívidas, e também a comunidade de países da zona do euro ficaria sobrecarregada.
Um problema básico é a conjuntura econômica ainda fraca na Itália. "A economia italiana quase não cresceu, estando em parte em recessão", afirma Martin Faust, professor de Economia na Frankfurt School of Finance. "A situação das empresas e das famílias italianas não é boa, e algumas já não podem pagar juros e amortizações."
Nesta terça-feira (12/07), o Fundo Monetário Internacional (FMI) reduziu seu prognóstico de crescimento para a Itália. Neste ano, a terceira maior economia da zona do euro deverá crescer "pouco menos de 1%" e, no próximo, 1%, informou o FMI. Anteriormente, a previsão de crescimento era de 1,1% para 2016 e 1,25% para 2017.
De acordo com o FMI, o referendo no Reino Unido em que se decidiu pelo Brexit – a saída do Reino Unido da União Europeia – aumentou a volatilidade dos mercados financeiros e os riscos para a Itália. O país está diante de "desafios monumentais", declarou o fundo.
Problema de longa data
Os bancos italianos vêm enfrentando dificuldades há anos. No final de 2014, nove instituições financeiras do país não passaram em testes de estresse realizados em toda a Europa. O maior buraco de capital foi verificado no Monte dei Paschi di Siena (MPS), o banco mais antigo ainda operante no mundo.
Desde então, muita coisa aconteceu, mas provavelmente não o suficiente. No início de 2015, uma diretriz da União Europeia (UE) estipulou que esses erros do passado não deveriam se repetir. Desde então, bancos não podem ser facilmente resgatados com o dinheiro do contribuinte, como aconteceu após a crise financeira de 2008. Antes de o Estado entrar em ação, acionistas e credores devem arcar com as responsabilidades.
"Detentores de obrigações bancárias e mesmo aqueles que possuem poupanças que vão além dos limites legais mínimos também têm razões para temer a perda de parte de seu dinheiro", explicou Faust. "Isso não é realmente um estímulo para a estabilidade bancária, pois agora ficou difícil para muitos investidores emprestar dinheiro aos bancos. Eles estão com medo de, no final, servirem de avalistas."
Círculo vicioso
Conjuntura fraca, investidores hesitantes – em vez de diminuir, os problemas dos bancos italianos aumentaram cada vez mais ao longo do tempo. E não há fim à vista. "É de se esperar que as perdas bancárias cresçam consideravelmente nos próximos anos", avaliou o professor da Frankfurt School of Finance.
"O problema é que os empréstimos não honrados também reduzem o capital dos bancos. E sem capital próprio, eles não podem sobreviver", acrescentou o professor. Trata-se de um círculo vicioso, pois é justamente em tempos de conjuntura fraca que as empresas precisam de bancos fortes.
No início de 2016, o governo italiano entrou em acordo com a UE sobre a possibilidade de repassar "créditos podres" para chamados "bad banks", ou seja, bancos que possam concentrar ativos tóxicos. Em abril, foi criado o fundo de resgate Atlante, que recebeu quase 4 bilhões de euros dos bancos italianos.
Pouco depois de sua criação, o Atlante teve muito que fazer: dois bancos regionais tiveram de ser ajudados, primeiramente o Banca Popolare di Vicenza, e depois o Veneto Banca. Isso consumiu metade do volume do Atlante, e desde então há uma controvérsia sobre quem vai preenchê-lo novamente. "Muitos bancos não dispõem de capital para aumentar esse fundo de resgate", disse Faust.
Nova ajuda governamental?
Durante uma cúpula da União Europeia no fim de junho, o primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi, apresentou o plano de utilizar novamente o dinheiro dos contribuintes para ajudar os bancos. Renzi pretende abastecer as instituições financeiras com até 40 bilhões de euros de capital novo, para que possam voltar a respirar. A justificativa do primeiro-ministro: a votação do Brexit criou uma situação excepcional em que tais auxílios são permitidos.
Uma desculpa, afirma Thomas Hartmann-Wendels, professor de Economia da Universidade de Colônia. "Não existe nenhuma correlação entre o Brexit e os atuais problemas dos bancos italianos."
Embora o professor defenda que os institutos financeiros italianos precisam ser saneados, ele afirma que isso deve acontecer segundo as novas regras: primeiramente, a conta deve ser paga pelos acionistas e credores, depois pelo Estado. "Após a crise financeira, prometeu-se que os contribuintes nunca mais assumissem a responsabilidade por negócios arriscados", diz Hartmann-Wendels. "Agora tudo isso é colocado em questão."
Segundo o professor, Renzi está sofrendo pressão política e as garantias estatais só incorrem em custos quando surge uma emergência. "Esta é a solução mais fácil, mas, no longo prazo, não leva a uma saída do impasse."
A próxima prova
O drama interminável mostra claramente os pontos de ruptura da união monetária. A economia da Itália não consegue avançar, porque faltam reformas fundamentais e, para as condições do país, o euro é demasiadamente caro. E quanto mais longa for a crise, mais problemas virão.
"As crises que temos na zona do euro ainda estão longe de estarem resolvidas", aponta Faust. "Nos últimos anos, os problemas estruturais só foram adiados, mas não resolvidos."
Dado o grande volume de "créditos podres" na Itália, Hartmann-Wemdels espera que, mais cedo ou mais tarde, o contribuinte europeu sirva de avalista dos bancos. "Isso será necessário. O Estado italiano não conseguirá arcar sozinho com o problema, já que está profundamente endividado."
Para recapitalizar seus bancos, a Espanha recebeu, entre 2012 e 2014, por volta de 40 bilhões de euros do fundo europeu de resgate financeiro. As negociações com vista a um programa semelhante para a Itália poderiam ser uma prova de fogo para as relações já tensas dentro da união monetária.