Bauhaus promove seu primeiro projeto internacional em favela do Rio
15 de março de 2002O endereço do primeiro projeto da Fundação Bauhaus de Dessau no exterior será: Favela do Jacarezinho, Zona Norte, Rio de Janeiro, Brasil. Para o diretor Omar Akbar, o Bauhaus retorna desta forma a suas raízes, ao "tema básico dos fundadores". Ele relembra os prédios de apartamentos de Walter Gropius, na década de 1920: "Na Europa, as condições de moradia das classes mais pobres melhoraram muito, de lá para cá. Porém ainda há, em todo o mundo, 1,5 bilhão de pessoas vivendo em guetos".
Trabalho e cultura –
O programa Célula Urbana consiste na construção de um quarteirão residencial em forma de cunha, para cerca de mil moradores. Ao redor de dois amplos pátios internos estarão distribuídas lojas, bares, oficinas de artesanato, ateliês, escritórios de advocacia, uma escola de samba, uma academia de ginástica e até um salão de massagem. Com tamanha oferta, seus criadores esperam que a Célula Urbana adquira, pouco a pouco o status de um novo centro do bairro.Os arquitetos alemães estão também conscientes da força do esporte no Jacarezinho: afinal, lá cresceu o campeão Romário. Por isso, eles previram a instalação de um telão na fachada do prédio principal, onde se projetarão filmes e partidas de futebol, a serem assistidos do lado de dentro ou de fora, conforme o tempo.
Um ambiente saudável –
Porém o alvo final do projeto carioca continua sendo proporcionar aos moradores do Jacarezinho uma qualidade de vida mais aceitável: quebrar a arquitetura em caixotes, abrir novos espaços, deixar entrar luz, ar e frescor no ambiente sufocante dos guetos. Enfim, integrar a área com o resto da cidade, demolindo os muros circundantes e construindo pontes para pedestres. Desta maneira, os arquitetos querem fazer jus ao lema da escola arquitetônica, cuja tradição remonta a 1919: integrar perfeitamente forma e conteúdo."Nossa interferência será minimalista, mas com ela abriremos amplas saídas e passagens de acesso", promete Akbar. "Fornecendo chances de trabalho e apresentando arte nos pátios, faremos os moradores olharem mais para fora. Ao mesmo tempo, a oferta cultural convidará as pessoas de fora a tomar coragem e visitarem o bairro."
O urbanista de Berlim Frank Möhr funciona como mediador entre o Bauhaus e as autoridades locais. Ele se ocupa do planejamento das obras, assim como da adaptação do projeto às normas brasileiras. As primeiras escavadeiras já começarão a rolar em maio. Com 32 anos de idade e mais de dez de experiência no Brasil, Möhr já trabalhou com Roberto Burle Marx, o paisagista de Brasília. O alemão aprendeu a respeitar o Jacarezinho: quem entra na favela tem que observar as leis do submundo.
Traduzindo "favela" para o alemão
O FAZ explica o que é o Jacarezinho: como outras tantas favelas, nasceu da ocupação ilegal por migrantes das regiões rurais ou desclassificados do proletariado urbano. De início, os barracos eram todos de tábuas e papelão, já que até 1985 o regime militar não permitia outros materiais.
Freqüentemente expulsos, seus habitantes sempre retornaram. Hoje, as casas da favela plana, ao longo de um malcheiroso canal ("cloaca maxima brasiliana", segundo o jornal), são de tijolo ou de concreto armado e os becos, asfaltados. Há também luz e encanamentos, porém a água só corre entre as duas e as cinco da madrugada. Atualmente contando 58 mil habitantes, o Jacarezinho é considerado uma das piores, numa cidade que não carece de áreas pesadas.
Programa Favela-Bairro -
O Célula Urbana faz parte do programa Favela-Bairro, que já custou, até agora, 300 milhões de dólares, 60% dos quais financiados pela prefeitura do Rio, o restante pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). O FAZ aponta a arquiteta brasileira Maria Lúcia (Lu) Petersen como a orgulhosa – ainda que um tanto colérica – mãe do Favela-Bairro.Seus esforços tornaram possível o financiamento do ambicioso programa de integração entre as áreas mais carentes e perigosas e a cidade. "As favelas só se tornarão bairros de verdade se ganharem um rosto, um núcleo cultural", explica Lu Petersen. "Não acredito que as pessoas irão ao teatro armadas de revólver".