Bilhete único de € 9 para toda a Alemanha sucesso ou fiasco?
5 de julho de 2022Há alguns meses, o governo alemão anunciou um enorme desconto nas passagens do transporte público nacional para os meses de junho, julho e agosto. Cada bilhete permitiria aos alemães utilizarem toda a rede de transportes pelo preço de 9 euros por mês (cerca de 50 reais).
A novidade, voltada para aplacar a alta do custo de vida e do preço dos combustíveis, deixou muita gente empolgada, embora alguns tenham questionado se a infraestrutura de transportes do país conseguiria dar conta do previsível aumento do número de passageiros.
Foi significativo o fato de a Deutsche Bahn, a operadora ferroviária da Alemanha, ter se apressado em alertar de antemão os passageiros para que evitassem transportar bicicletas nos trens a partir de junho, devido à falta de espaço.
As autoridades públicas que administram as redes de transportes em todo o país dispuseram pouco tempo para se preparar. "Tivemos que ajustar nossa infraestrutura de vendas e adquirir ônibus, trens e transportes adicionais, o que, devo dizer, não foi possível em tão breve prazo", afirmou Lars Wagner, da Associação Alemã de Empresas de Transportes (VDV), a organização que representa 600 associações e empresas de transporte público da Alemanha.
Trens superlotados
Muitos anteciparam meios de transporte superlotados no feriado de Pentecostes, em junho. Eles estavam certos: inúmeros trens regionais com destino às populares costas do Mar do Norte e do Mar Báltico estavam tão cheios que tiveram de recusar passageiros. Transportar bicicletas se tornou quase impossível.
O volume de passageiros foi maior do que o esperado, relata Wagner. Afinal, Pentecostes é um feriado público e uma época em que, normalmente, muitos viajam pelo país de trem ou ônibus. A VDV certamente já contava que multidões iam se dirigir aos destinos turísticos populares, embarcar em excursões de fim de semana e visitar as principais cidades do país.
Berlim e Brandemburgo também viram um acréscimo considerável do número de passageiros. Trens que partiam para a costa do Báltico e outros destinos populares estavam lotados conta Joachim Radünz da VBB, a associação pública de transporte dos dois estados.
Falta de funcionários
O bilhete com desconto animou muitos que nunca ou raramente viajam com os transportes públicos a fazerem essa experiência. Os parlamentares alemães certamente contavam que a medida surtiria esse efeito.
Isso, porém, gerou uma nova série de desafios, segundo Wagner. Alguns desses viajantes inexperientes não sabiam, por exemplo, para onde se deslocar dentro das estações. Isso gerou atrasos, com passageiros desnorteados saindo nas plataformas para tentar se orientar, bloqueando, assim, quem queria sair ou entrar nos vagões.
Os funcionários de algumas estações ajudavam os passageiros, de modo a minimizar os atrasos. "Em Colônia, vi gente ajudando outros a embarcarem rápido, para que elas próprias também pudessem embarcar", afirmou Dennis Junghaus, a Aliança Ferroviária Alemã, uma organização que defende mais investimentos em infraestrutura.
Ele ressaltou que serão necessárias melhoras nas próximas semanas e que espera ver um número bem maior de funcionários ajudando os viajantes nos principais centros de transporte do país.
Sucesso de vendas
Até o momento, houve uma enorme demanda pelos bilhetes de 9 euros. Mais de 21 milhões foram vendidos entre maio, quando tiveram início as vendas, e julho, segundo a VDV. Além disso, 10 milhões de portadores de assinaturas para a rede de transporte também receberam o desconto.
As vendas, assim como a quantidade de passageiros, ultrapassaram a expectativa do setor. Em junho a Deutsche Bahn registrou um aumento de 10% na utilização dos trens regionais. enquanto Berlim e Brandemburgo tiveram 25% a mais no fluxo de passageiros em determinadas rotas, afirma Radünz, do VBB.
Assim, o volume de passageiros quase retornou aos níveis de antes da pandemia. Em toda a Alemanha, "o bilhete de 9 euros nos colocou aproximadamente de volta a onde estávamos antes da covid", concorda Wagner.
Qual é o veredito?
Radünz analisa que o bilhete único foi um sucesso retumbante em Berlim e Brandemburgo, onde muitos escolheram utilizar os trens ao invés de andar de automóvel. Os cidadãos usaram o vale nos finais de semana, levando suas crianças para o norte da capital, para a floresta do Spree e outros destinos.
O veredito de Wagner, da VDV, por outro lado, é um pouco mais ambivalente: embora elogie o bilhete de 9 euros por encorajar mais cidadãos a utilizarem o transporte público, ele critica o financiamento do esquema.
"O Ministério dos Transportes fornece 2,5 bilhões de euros dentro de três meses para compensar a perda de rendimentos gerada pelo bilhete artificialmente barato, mas, até agora, nenhum dinheiro foi liberado para a contratação de pessoal extra, ônibus ou trens."
Desse modo, ele não vê como o esquema poderá ser viável depois de agosto. Pelo menos não ao preço de 9 euros mensais.