Bundesvision: mais que um festival da canção
15 de fevereiro de 2006No próximo dia 9 de março, a Alemanha decidirá, como todo ano nesta época, que artista enviará ao Festival Europeu da Canção, o Eurovision 2006. Desta vez, há apenas três candidatos concorrendo: Vicky Leandros (que levou Luxemburgo à vitória 20 anos atrás), Thomas Anders (ex-Modern Talking) e Texas Lightning (banda de country alemã).
Mas nem todos estão contentes com isso. Stefan Raab, que começou como VJ do canal de música VIVA e é hoje um dos mais famosos apresentadores da televisão alemã, decidiu tomar uma iniciativa e criou o Bundesvision, versão alemã do festival. Por isso, ele até foi chamado por alguns de "Bob Geldof alemão".
Neste mês, a DW-Antena apresenta um perfil de cada um dos artistas participantes.
Baden-Württemberg: Massive Töne
Os três membros do Massive Töne estão juntos há 14 anos, mas foi só com o terceiro álbum que eles ficaram conhecidos para o grande público: MT3 foi o disco mais vendido de hip hop alemão em 2002 (só Nelly e Eminem venderam mais). E tudo graças ao hit Cruisen, que ficou durante semanas no Top 10 alemão. Em outubro de 2005, eles voltaram com o quarto álbum, Zurück in die Zukunft (De volta para o futuro), que vinha sendo aguardado com ansiedade. Detalhe: um dos rappers se chama João dos Santos, apelidado Ju.
Baviera: TipTop
Olli Parton e Beau Frost já se conhecem há muito tempo: afinal de contas eles são irmãos. E muitos também conhecem Beau Frost, aliás Peter Brugger, cantor e guitarrista da banda Sportfreunde Stiller, que goza de um inegável sucesso além das fronteiras da Baviera. "Representamos nosso Estado, porque senão ninguém teria coragem", resumiu Peter. Lembra da banda Trio (Da Da Da), lá de volta aos anos 80? E do Devo? São ótimas influências, embora o TipTop deixe muito a desejar.
Brandemburgo: Diane
Diane Weigmann é velha de guerra. Ela já cantava e tocava guitarra no The Lemonbabies, uma banda de garotas que se conheceram na escola e cujo primeiro show juntas foi no dia seguinte à queda do Muro de Berlim. Na época, ela tinha apenas 15 anos. Quando a banda optou em 2002 por uma pausa sem fim previsto, Diane decidiu sair em carreira solo.
Bremen: Revolverheld
Tudo aconteceu muito rápido para os cinco caras do Revolverheld. Em 2003, eles ainda tocavam sob o nome Manga, depois mudaram para Tsunami Killers e – pode-se imaginar por quê – tiveram de mudar o nome outra vez. Corriam boatos de que a banda mandava ver no palco, até que chegou o primeiro disco, que leva o nome da banda. Um hard pop de qualidade, cheio de guitarras, na linha de muitas bandas americanas. Mas cantado em alemão!
Hamburgo: OleSoul
A música soul em alemão tem um árduo caminho pela frente. Diferentemente do hip hop, que abriu uma trilha própria, cresceu e amadureceu, o soul ainda está dando seus passos iniciais, apesar do enorme sucesso de músicos como Xavier Naidoo e Die Söhne Mannheims. OleSoul é um daqueles artistas que se identificam com a cidade onde vivem. Hamburgo é sua fonte de inspiração: seu segundo álbum se chama Elbaufwärts (Rio Elba pra cima), e o primeiro single é Hamburg & Cologne.
Hessen: Nadja Benaissa
Ela ficou famosa como uma das garotas da banda No Angels, uma espécie de Spice Girls germânicas que chegou a fazer sucesso até no Brasil (lembra de Daylight In Your Eyes?). Ela agora está tentando a carreira solo e apresenta seu primeiro álbum, Schritt für Schritt (Passo a Passo). De origem marroquina, Nadja apresentou seu primeiro single, Ich habe dich. Mais uma tentativa de expansão da soul music na Alemanha. E, infelizmente, um dos pontos baixos do festival. :-(
Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental: Pyranja
Pyranja, conhecida por familiares, amigos e repartições públicas como Anja Käckenmeister, passou por cima de diversos preconceitos: ela nasceu na ex-Alemanha Oriental, é mulher e mesmo assim decidiu fazer hip hop. Embora tenha nascido em Rostock, Pyranja deixou a capital do Estado para tentar a sorte em Berlim. O primeiro álbum Wurzeln & Flügeln (Raízes & Asas) chegou a entrar nas paradas. O segundo Frauen & Technik (Mulheres & Tecnologia) passou meio batido, mas o recém-lançado terceiro disco Laut & Leise (Alto & Baixo) promete.
Baixa Saxônia: Marlon
Ele tinha apenas 14 anos quando gravou um videoclip com velhas estrelas da música pop alemã – leia-se Nena, Udo Lindenberg e Peter Maffay – para arrecadar fundos para as vítimas das enchentes que maltrataram o país em 2002. Hoje com 18 anos e segundo grau completo, Marlon volta com seu segundo álbum. Ainda com cara de bom moço e penteado comportado, deve cantar em um alemão per-fei-to, como se espera de alguém que cresceu em Hannover.
Renânia do Norte-Vestfália: AK4711
Na verdade, Anja, Cindy, Caro e Kerstin têm tudo pra dar certo. O nome, pra começar, já é ótimo: AK-47 é o nome de um rifle automático da época da guerra fria e 4711 é o nome da verdadeira água de colônia. É como num anúncio de jornal: quatro meninas bonitas, com roupas, penteados e maquiagem legais, com atitude, estilo próprio e letras interessantes, procuram votos em festival de música pop. À toa: as meninas do AK4711 ficaram em último lugar na competição. Nem mesmo os compatriotas da Renânia do Norte-Vestfália lhe deram o maior número de pontos. Maior injustiça!
Renânia-Palatinado: 200Sachen
Os "duzentas coisas" têm muito do bom e velho rock'n'roll: bastam poucas notas tocadas em alto volume, muita gritaria e a festa está armada. Os gritos ficam por conta da vocalista Katta Strophe, que no refrão do single Sekt zum Frühstück berra pedindo champanhe no café da manhã. Embora a banda seja de Wiesbaden, capital de Hessen, eles representam no festival o Estado vizinho, cuja capital fica apenas do outro lado do rio.
Sarre: Reminder
Foi no Sarre que nasceu a cantora Nicole, única artista alemã a ganhar o Festival da Canção Eurovision (em 1982, com a música Ein bisschen Frieden). Do Sarre vêm também os meninos do Reminder, uma típica banda de indie rock, com letras em inglês e cabelos de lado (ou de chapéu!). Michael, Matthias, Thomas e Sascha tocam juntos desde abril de 2000 e a faixa Augen zu (und rein) é a última do novo álbum Basement Stories.
Saxônia: Die Raketen
Eles estão há quatro anos juntos e definem sua música como electronic comedy. Na verdade, o que eles fazem é um electro pop simples, mas bem humorado, com letras em alemão. Na verdade, a banda está em casa na capital Berlim, sendo que apenas o vocalista é original saxão. No festival, eles apresentaram a faixa Popsong, mas o refrão já adverte: "this is not a popsong"! Crise de identidade?
Saxônia-Anhalt: Toni Kater
Desde os 13 anos ela queria fazer música. Mas demorou até que foi descoberta pelo duo berlinense 2raumwohnung, cujo apoio foi essencial para que Toni Kater pudesse gravar seu primeiro álbum Gegen die Zeit (Contra o tempo/2004) e cuja influência é indiscutível, embora deixe a desejar em qualidade e originalidade. No ano passado, Toni voltou com o segundo disco, Futter (Ração/2005).
Schleswig-Holstein: TempEau
Dois amigos de infância montaram uma banda ainda na escola, quando tinham apenas nove anos. Mas depois seguiram caminhos opostos: Marek Harloff virou ator e Jan Plewka montou o Selig, uma das mais importantes bandas de rock alemão dos anos 90. Tempos depois, um amigo incumbiu Plewka da trilha sonora de seu filme, com o propósito de criar uma banda que traduzisse de forma autêntica a experiência de um cantor de rock. A amizade e o bom resultado fizeram com que TempEau perdurasse mesmo após a filmagem.
Turíngia: In Extremo
O objetivo da banda é criar uma ponte entre o rock e a Idade Média. Mas chamá-los de banda é pouco. Assistir a uma apresentação sua ao vivo é como ir ao teatro: cada show é uma performance. O texto mais antigo que eles musicaram data do século 8 e um dos mais jovens, do século 15.
Eles atendem por nomes como O Último Unicórnio (vocal, harpa e cítara), Dr. Piemonte (gaita de foles, harpa, charamela, flauta), Flex o Maleável (gaita de foles, charamela, flauta), Pífaro Amarelo (gaita de foles, charamela, harpa), St. Sebastian (guitarra), Estrela da Manhã (bateria, percussão) e Lutter (baixo, percussão). Eles também se vestem a caráter, e, como se não bastasse, fabricam eles mesmos suas roupas e instrumentos.
Leia mais na próxima página sobre a banda vencedora do Festival Bundesvision.
Berlin: Seeed
Seeed se escreve com três Es e 11 homens: três MCs seguram a onda no palco, o resto manda ver na guitarra, no baixo, na bateria e no teclado, tudo isso acrescido de dois instrumentos de sopro e dois DJs.
Embora o único jamaicano de verdade seja o percussionista Alfi, desde 1998 o Seeed propaga por toda a República uma atmosfera cheia de vibes jamaicanos, carregada de graves e grooves. O som do grupo é uma mistura de influências, todas de origem semelhante, mas com efeitos os mais diversos: reggae da velha guarda, um pouco de ska e dub, uma pitada de hip hop e muito, mas muito dancehall. Os três MCs – Enuff, Eased e Ear – rimam misturando inglês e alemão, às vezes com charme de patois, outras com o avesso sotaque de Berlim.
Parece incrível, mas o Seeed nasceu literalmente nas ruas de Kreuzberg: a banda foi montada às pressas para participar do Carnaval das Culturas, uma parada que acontece todo ano em Berlim e antecipa a chegada do verão. Nada mais compreensível, já que a banda sempre esteve intrinsicamente ligada à capital.
Já o primeiro single, Dickes B, que saiu antes ainda do lançamento do álbum de estréia, New Dubby Conquerors, e catapultou a banda para o alto da parada, é uma homenagem declarada a Berlim. Mas o disco caiu no gosto da nação, chegando ao 17º lugar da parada e segurando a onda por meses. A banda chegou até a fazer o show de abertura da turnê do R.E.M. na Alemanha e, em 2002, levou dois prêmios Echo, o maior da indústria fonográfica alemã.
Enquanto o próximo disco não saía, o Seeed lançou em abril de 2002 o EP Waterpumpee, que o tornou a única banda alemã a entrar na parada de sucessos de Trinidad & Tobago.
Enquanto isso, já na turnê de 2002, os fãs puderam escutar algumas das músicas do próximo disco, Music Monks, que saiu em 2003. Não só o público gostou e emplacou o álbum na quarta posição das paradas, mas também a crítica, que reconheceu nele um estilo próprio e uma prova de que o Seeed deixara de ser apenas outra banda de reggae.
Em 2004, eles tocaram pela primeira vez fora da Europa, na abertura do Festival de Cinema Sithengi, na Cidade do Cabo, e também em Johanesburgo e Middelburg. Em 2005, pintou a honra de subir ao palco do renomado Festival de Glastonbury, na Inglaterra.
Com o terceiro álbum, Next!, que chegou às prateleiras no ano passado, a banda sentiu que estava madura o suficiente e que era hora de abrir as perspectivas – se nos outros discos o processo de composição girava em torno dos três MCs, desta vez todos os 11 membros participaram. "As idéias eram todas gravadas em CD e apresentadas aos outros. Uns criavam batidas, outros compunham melodias" e assim por diante.
Com contribuições de cada um dos membros, o álbum é certamente um caldeirão de influências. Mas uma coisa é certa: o denominador comum entre todos eles continua sendo a cidade: "Berlim ainda é o centro de gravidade no nosso processo de composição. Aqui ninguém tem que seguir tendência alguma, todo mundo sempre encontra um nicho. Esta cidade é muito especial e é certamente um tema para cada um de nós e o que nos interliga".