Música política de Anika
26 de maio de 2011Anúncio
O mundo dos espetáculos está repleto de carreiras artísticas que começaram por acaso. Mas poucas são como a da cantora Anika. Filha de mãe alemã e pai inglês, Anika cresceu entre Berlim e Bristol e trabalhava como jornalista política e promotora de shows. Envolvida com o mundo da música, ela entrou em contato com a banda Beak, que na época procurava uma vocalista. A empatia foi imediata, mas em vez de entrar para a banda, Anika acabou gravando seu primeiro álbum.
Manobras do acaso
Beak é a banda formada por Billy Fuller, Matt Williams e Geoff Barrow, conhecido por fazer parte do Portishead. "Encontrei com eles através de um amigo em comum. Eles queriam uma vocalista com uma voz estranha e ele pensou em mim. Só fui perceber que estava trabalhando com Geoff Barrow depois do nosso terceiro ensaio", disse Anika.
Esses ensaios acabaram gerando o álbum que leva o seu nome e foi gravado em apenas 12 dias. A cantora é responsável pelas letras de parte das canções, mas o disco também conta com algumas regravações. "Gosto de interpretar textos de outros letristas com as minhas emoções. Para mim, isso é tão pessoal quanto utilizar uma palavra do dicionário para criar minhas próprias canções." Para o álbum ela gravou versões muito particulares de Bob Dylan, Yoko Ono e The Kinks.
Como fã de cantoras de voz marcante e atitude, Anika menciona Billy Holiday, Patti Smith e Janis Joplin como referências de personalidade forte e grande vulnerabilidade. Sua música tem estrutura de pop inglês dos anos 60, com um forte baixo de dub (gênero derivado do reggae, com baixo e baterias bem fortes) e atitude e produção punk. Anika canta com um forte sotaque, algo entre o inglês falado no País de Gales e o alemão. "Gosto de acentuar as palavras quando canto para não soar americana", declarou.
Insatisfação política e social
A música foi a maneira que Anika encontrou para interagir politicamente com a realidade. Sobre o processo de gravação do primeiro disco, ela diz que tudo foi espontâneo e resultou de sua frustração com a industria fonográfica. Essa atitude política extrapola as letras e influenciou a composição e a gravação das canções, que podem incomodar ouvidos acostumados a trabalhos de produção mais convencional.
"A previsibilidade, medo e vontade de agradar da industria fonográfica me irrita. Queria produzir algo que expressasse minha frustração e questionasse os modelos daquilo que conhecemos por música popular", complementa a cantora. "Quero resgatar a musica como veículo de insatisfação política e social".
Seu desejo não é agradar, mas provocar, questionar e refletir. "Toda forma de música ou arte é um risco porque questiona o que é normal", afirma a cantora. Para esse processo, o distanciamento entre pessoa e artista foi importante. "Mudei uma letra no meu nome. Foi uma forma que encontrei de não levar as críticas para o lado pessoal", complementou. A carreira de jornalista também foi posta de lado por uns tempos, já que encontrou na música uma maneira efetiva de expressar suas frustrações com a vida e a política.
"Como jornalista interagia menos com a realidade, pois eu narrava mais do que necessariamente criava. Mas eu amo o jornalismo e acho que ele tem um papel muito importante em levantar questões, provocar e informar as pessoas. Neste momento eu quero fazer música", completa. Ela também acredita que os grandes jornalistas são os que têm muita experiência em outras áreas. Ela vê nesse disco e em sua carreira musical uma possibilidade de ganhar experiência e continuar sendo política, para no futuro quem sabe voltar ao jornalismo.
Num mundo onde o público-alvo é o que conta e o nome de cantoras se transformam em marcas associadas com uma superprodução, Anika é a solução para quem não tem medo de aceitar o desafio do caminho mais difícil, mesmo que ele se assuste com as mensagens políticas, um sotaque incomum e um dub-punk sombrio.
Texto: Marco Sanchez
Revisão: Carlos Albuquerque
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