Caos sobre rodas
24 de junho de 2003Anúncio
A comparação não poderia ser mais trágica: segundo o semanário Die Zeit, as artérias do sistema rodoviário alemão estão tão entupidas, que encontram-se à beira de um infarto. E, pelo que parece, não há safena capaz de salvar o caos que vem se instalando em proporções cada vez maiores. Em Colônia, por exemplo, a quarta maior cidade do país, 360 mil veículos passam diariamente pelos meros 52 quilômetros que circundam a cidade. Por falta de espaço, não é de se admirar que qualquer imprevisto – obras, presença de policiais em ação, um mero carro com defeito – acabe causando um congestionamento.
Modernidade às avessas -
As vítimas representam todo o leque social: homens de negócios, pais e mães transportando crianças, profissionais a caminho do trabalho, motoristas de ônibus e caminhão, sem contar um constante bom número de pessoas a caminho das férias. Por ironia do destino, as premissas da modernidade encarnadas pelo automóvel – mobilidade, flexibilidade e velocidade – acabam surtindo o efeito oposto.Por lazer -
Apesar da malha de rodovias (Autobahnen) ter crescido em alguns milhares de quilômetros nos últimos anos, o número de carros em circulação no país aumentou ainda mais. E há de se notar que os alemães, com o passar do tempo, percorrem distâncias cada vez maiores com seus automóveis. Muitas vezes, isso se dá por mero prazer: mais de 40% do tráfego sem fins comerciais no país é em função do lazer. E isso sem contar o caminho das férias.Trens e ônibus vazios -
Frente a um panorama como esse, não é de se admirar que as estradas estejam sempre cheias e muitas vezes "entupidas". Enquanto isso, vários ônibus e trens andam às moscas. Um bom exemplo é o setor de vendas de caminhões, que cresce constantemente, enquanto o transporte de cargas no setor ferroviário quase não registra lucros. O resultado não poderia ser outro: o caos nas rodovias.Planejamento -
Especialistas creditam a culpa não à ausência de estradas, mas à falta de um melhor planejamento dos transportes no país, que, até hoje, ainda faz do automóvel uma das alternativas (financeiras) mais atraentes (leia-se mais baratas) de locomoção. Além disso, o país que prima por projetos ecológicos é um dos grandes "pecadores" em relação ao meio ambiente no que diz respeito ao amor de seus habitantes pelo automóvel.Símbolo de liberdade -
"A idealização do carro e do transporte individual remete até o Terceiro Reich, quando as estradas eram construídas visando uma velocidade cada vez maior, ao contrário do que aconteceu na Holanda, por exemplo. Além disso, há ainda nossa relação problemática com a liberdade. O carro simboliza a liberdade e a aventura. Quanto mais nos sentimos presos, mais procuramos por nichos como esse", comenta o psicanalista Micha Hilgers ao Die Zeit.Ilusão -
Da sensação de liberdade, no entanto, os congestionamentos não guardam muito. No entanto, como observa Hilgers, "a velocidade real não é tão importante quanto a sensação que as pessoas têm de que poderiam confortavelmente andar em um carro de luxo, com um motor potente e rápido. Elas compram mais a ilusão do que a possibilidade real de fazer isso".Anúncio