Carnaval
6 de março de 2011"Se você vive aqui e não gosta deste país, mas sim dos euros, me envergonho disso", ouve-se de um turco, em alemão perfeito. Uma chamada que, de cara, prende a atenção dos espectadores, pois alude a um dos temas mais repetidos na Alemanha de hoje: a integração dos estrangeiros.
A crítica é voltada tanto para os próprios quanto para as autoridades, que dificultam a situação, pagando intérpretes para aqueles que se recusam a aprender a língua do país, para, mais tarde, reclamarem que os mesmos não falam o alemão.
Sem ligar para o politicamente correto
A corrupção na cidade, a incapacidade das autoridades em Berlim, as angústias daqueles que recebem ajuda do Estado e paródias do ministro, com sua tese de doutorado fraudulenta, são apenas alguns dos assuntos levados ao palco na chamada Immisitzung ("reunião de imigrantes", em tradução livre), no carnaval de Colônia. Immi, para os colonenses, é todo aquele que vem de fora, seja "de Berlim, do Benim ou de Medellín".
A apresentação é uma mistura de teatro de variedades e elementos carnavalescos, com uma característica especial: não estar nem aí para o politicamente correto. Já de início, Katjia Solange Wiesner, que apresenta o espetáculo, avisa: "Sou 50% africana e 50% alemã, uma 'menina cor de chocolate', como sempre ouvi na minha infância".
As paródias passam, entre outros, pelos gregos que vivem na Alemanha e brincam com os problemas de seu país. "Os deuses abandonaram a Grécia", reza a máxima: sendo assim, os gregos têm que parar de enganar o Estado, deixando de receber salários duplos; os taxistas de Atenas terão que dar recibos de suas corridas e para cada piscina construída em casa deverão ser pagos impostos, são algumas das alfinetadas ouvidas.
Atriz brasileira leva plateia às gargalhadas
"Festejar juntos o carnaval de Colônia, como nós, colonenses descendentes de estrangeiros, foi a motivação inicial", conta a diretora do espetáculo, Selda Akhan, à Deutsche Welle. Filha de turcos, a atriz, formada em Artes Cênicas, cresceu em Colônia e já atuou em palcos de diversas cidades do país.
Ao lado de 13 outros atores, músicos, bailarinos e comediantes, esses "estrangeiros nativos" quiseram criar uma "festa colonense de imigrantes para todo mundo", diz Akhan. E foi com essa inspiração que iniciaram, há dois anos, o espetáculo, do qual fazem parte atores turcos, gregos, uma alemã com raízes nos Camarões, um suíço, um norte-americano, um francês, alguns alemães e a brasileira Myriam Chebabi.
A atriz carioca parodia no palco os inacreditáveis erros gramaticais cometidos pelos estrangeiros quando falam alemão. Chebabi é responsável por um dos pontos altos do espetáculo: ela apresenta uma "Noite de Gala para Ajudar os Intrigantes" (paródia de imigrantes) em um alemão tão truncado que o público chora de tanto rir.
Autoironia
Ironizar a própria situação é uma das pérolas do espetáculo, no qual os imigrantes criticam a si mesmos, sem qualquer medo de recriminação alheia.
O assunto "terrorismo", por exemplo, é uma verdadeira "bomba", que não pode ser tocada normalmente por qualquer um no dia-a-dia. Aqueles que se suicidam em atentados, há de se lembrar, são, em sua maioria, estrangeiros e também muçulmanos, como vários dos atores no palco. "Não queremos ferir aqui nenhuma convicção política, religiosa ou social", acentua Akhan.
Em uma paródia do Grande Prêmio Eurovisão, o espetáculo coloca mulás como anfitriões que recrutam homens-bomba. Neste contexto, surge uma mulher de burca vermelha, que deixa entrever suas belas pernas, enquanto interpreta o clássico Ich hab´noch ´nen (Spreng!) Koffer in Berlin – Ainda tenho uma maleta (de explosivos) em Berlim, parodiando uma canção imortalizada na voz de Marlene Dietrich.
Na sequência, um homem-bomba sonha com uma viagem a São Francisco e um outro, que comete um atentado em Colônia, espera que se concretize a promessa do mulá de que 75 virgens irão recebê-lo, com carícias, no além. É quando ele se dá conta de que o enganaram, embora já seja tarde demais.
Autor: José Ospina-Valencia (sv)
Revisão: Marcio Damasceno