ChatGPT revolucionará o ensino em universidades e escolas?
20 de janeiro de 2023A professora Doris Wessels se lembra bem de 2 de dezembro de 2022. Como especialista em sistemas de informação na Universidade de Ciências Aplicadas de Kiel, no norte da Alemanha, ela pesquisa há anos sobre os efeitos dos chamados modelos de linguagem de inteligência artificial (IA) na área de educação. Mas quando acessou o ChatGPT pela primeira vez, sentiu que aquele era um "momento mágico".
O ChatGPT, um novo sistema de chat baseado em IA, foi lançado em 30 de novembro de 2022 pela empresa americana OpenAI. Localizada no Vale do Silício, na Califórnia, ela tem Elon Musk entre seus fundadores.
Com o sistema, qualquer um pode interagir com a inteligência artificial na internet: basta introduzir perguntas ou comandos numa janela de chat, e o ChatGPT responde adequadamente a (quase) tudo. Em cinco dias, 1 milhão de usuários se inscreveram para usar a plataforma – em comparação, o Instagram levou mais de dois meses para atingir esse número.
O ChatGPT consegue explicar, programar e argumentar. Doris Wessels também se surpreende ao dar à IA os primeiros comandos: "Estamos entrando num outro mundo." A seu ver, a magia dessa IA é difícil de descrever: "Você mesmo deve experimentá-la e vivenciá-la."
Para Mike Sharples, o GPT-3, um precursor do ChatGPT, já era um dos poucos "grandes avanços" que ele testemunhara em seus 40 anos de carreira como pesquisador de IA.
Mas o professor emérito britânico da Open University também afirma que "o GPT democratiza o plágio". Agora, os estudantes podem simplesmente dar comandos ao programa para que textos sejam escritos para eles com uma linguagem perfeita – quer dizer, um "escritor fantasma" agora disponível de forma gratuita para todos.
ChatGPT ameaça a educação nas universidades?
O ChatGPT pode ser usado para escrever textos acadêmicos, por exemplo. Mike Sharples fez a IA escrever um artigo científico que "conseguiria ser aprovado numa revisão inicial". Na internet, multiplicam-se relatos sobre estudantes que usam inteligência artificial para fazer seus deveres de casa.
Isso preocupa Doris Wessels, que também foi uma das fundadoras do centro de competência virtual Escrever, Ensinar e Aprender Com IA da Universidade de Ciências Aplicadas de Kiel.
Segundo ela, as faculdades e universidades alemãs correm o risco de ficar para trás: pela indústria de software, que desenvolve sistemas de IA cada vez mais poderosos, e por seus próprios alunos, que aprendem a usar essa tecnologia cada vez mais inteligente e mais rápido do que os professores. Os estudantes geralmente descobrem esses desenvolvimentos tecnológicos em tempo real nas mídias sociais – e muito mais rápido do que as gerações mais velhas.
Wessels desenha um possível cenário de terror: alunos ligados em novidades tecnológicas e um professor desavisado que acha que eles fizeram um excelente trabalho porque, de repente, não viu erros nos deveres de casa.
Segundo Debarka Sengupta, que dirige o Centro de Inteligência Artificial Infosys, do Instituto de Tecnologia de Informação Indraprastha de Nova Déli. "todos na Índia conhecem o ChatGPT". O professor teme que o programa crie um círculo vicioso: se alunos não conseguirem aprender mais a escrever textos sozinhos e usarem apenas o ChatGPT, eles podem se tornar "extremamente incompetentes e dependentes" da tecnologia.
No entanto, não há ainda levantamentos de dados que apoiem a opinião, até devido ao pouco tempo desde o lançamento do ChatGPT. Mas, assim como outros pesquisadores, Sengupta também enfatiza que "plágio e trapaça sempre existiram". Porém, a motivação dos alunos não pode ser subestimada. Ou como crê Mike Sharples, "os alunos querem aprender e não trapacear".
Como IA pode ajudar os estudantes
No entanto, Sengupta vê o ChatGPT como algo muito positivo. O caso de Bernadette Mathew mostraria que a IA pode ajudar seus alunos. Para seu doutorado em biologia, ela pesquisa o crescimento do câncer e precisa analisar uma enorme quantidade de dados. Mas, para isso teria que saber programar – um problema, pois nunca aprendeu programação em seus estudos.
Sengupta ouviu falar dessas dificuldades e mostrou o ChatGPT. Agora, Mathew dá tarefas ao programa, deixe que ele encontre erros em seu código e, finalmente, aprende linguagens de programação com a ajuda da IA.
De acordo com ela, a plataforma funciona em "99% dos casos". E o melhor de tudo é que o ChatGPT faz não apenas o trabalho dela, mas também a ajuda a realmente entender sobre programação.
A IA a fez sentir "capacitada" para trabalhar de forma independente, pois não precisa pedir sempre ajuda aos outros: "Conversar com o ChatGPT é como falar com uma pessoa real. Se eu soubesse disso antes, poderia ter me poupado muito trabalho."
Ela acredita que a IA também revolucionará o trabalho de outros biólogos, pois eles poderiam, agora, concentrar-se exclusivamente na pesquisa – e não em aprender a programar. Mas Mathew também tem medo de não poder mais usar o ChatGPT em algum momento, pois no futuro o uso da IA deverá ser cobrado.
Doris Wessels conta que o ChatGPT também pode ajudar os alunos de outras áreas, resolvendo bloqueios de redação ao reduzir o medo da folha branca e escrevendo o que muitos consideram as palavras mais difíceis: o primeiro parágrafo de um texto. Para a professora, um assistente digital como o ChatGPT pode ajudar na inspiração.
Inteligência artificial não é realmente inteligente
O psicolinguista canadense Daniel Lametti, da Universidade Acadia, na província de Nova Escócia, compara a importância da IA como o ChatGPT para textos acadêmicos com a invenção da calculadora para matemática, que mudou o ensino de forma fundamental.
Antes, apenas o resultado final – quer dizer, a solução de uma equação – era o que importava. Aí não apenas a solução se tornou decisiva, mas o caminho como se chegou a ela.
No futuro os trabalhos acadêmicos não poderão mais ser avaliados de acordo com a sua forma final, mas com base em como os alunos melhoraram e complementaram um texto originalmente criado pela IA.
Assim como outros especialistas, Lametti ressalta que os textos gerados por inteligência artificial não refletem a realidade, mas apenas a linguagem em que a tecnologia se baseou.
O ChatGPT, porém, não entende o significado dessa linguagem – como um papagaio que ouve conversas na sala de uma professora e em algum momento começa a proferir frases inteligentes.
Assim, parte do que o ChatGPT escreve é bom de ler, mas completamente errado. E por isso a revisão feita por humanos é tão importante: ela é geralmente um desafio e requer conhecimento real – e os alunos poderiam ser avaliados dessa maneira no futuro.
Para especialistas, uma coisa é certa: essa tecnologia não vai desaparecer. O ChatGPT se tornou um desafio para o ensino, mas, ao mesmo tempo, oferece às universidades oportunidades que elas e seus alunos podem aproveitar.
Debarka Sengupta já tem um palpite sobre qual país vai se destacar em particular nesse tema: sua terra natal, a Índia, uma amante da tecnologia.