China
4 de março de 2011O governo chinês anunciou nesta sexta-feira (04/03) que o orçamento de defesa do país terá alta de 12,7% em 2011, atingindo um total de 601,1 bilhões de iuanes (65 bilhões de euros).
Segundo analistas, a notícia desencadeou entre alguns países, especialmente aqueles vizinhos à China e nos Estados Unidos, o medo de uma retomada da corrida armamentista na Ásia.
O valor, anunciado pelo porta-voz do Parlamento, Li Zhaoxing, na véspera da abertura da sessão plenária do Congresso Nacional do Povo, foi considerado por Li como "relativamente baixo".
De acordo com a Constituição chinesa, o Parlamento (intitulado Congresso Nacional do Povo) é o órgão mais alto na hierarquia do país. No entanto, no primeiro artigo da última versão da lei máxima, aprovada em 1982 e em vigor até hoje, fica determinada a supremacia do Partido Comunista.
Sendo assim, os quase 3 mil delegados reunidos na grande arena do povo – sob um retrato enorme de Mao Tsé-Tung, diretamente na Praça da Paz Celestial, no coração de Pequim – mantêm todos ligações com o partido.
Essa é a razão por que esse grupo de deputados – que numericamente compõem o maior Parlamento do mundo – nunca rejeitou um projeto de lei sequer, em toda sua história, ou rechaçado qualquer relatório.
Ou seja, as decisões fundamentais no que diz respeito ao país são tomadas entre os grêmios do Partido Comunista, que, durante conferência de seu Comitê Central em outubro último, chegou a um acordo sobre o plano do país para os próximos cinco anos. O aval do Congresso do Povo não passa de uma mera formalidade.
Abismo entre desejo e realidade
Willy Lam, observador do desenvolvimento político chinês há décadas, acredita que as mudanças mais substanciais do novo plano estão na previsão de reestruturação da economia. "Tenta-se abandonar uma produção industrial muito atrelada ao trabalho intenso e nociva ao meio ambiente, em prol da adoção de setores de alta tecnologia, próximos do capital e do uso tecnológico intenso", diz ele.
Significativo, na opinião do especialista, é também o fato de a meta de crescimento econômico já ter sido reduzida a 7% pelo Congresso do Povo, antes mesmo da próxima assembleia. Entretanto, Pequim já havia tentado, por ocasião da aprovação do último plano, reduzir o crescimento para 7,5%, e mesmo assim a economia chinesa cresceu em média 11% no período.
Os custos desse crescimento a qualquer preço não podem, hoje, ser esquecidos: o meio ambiente está devastado, os recursos tornam-se mais escassos, a inflação galopa. Com isso, a estabilidade social também corre risco.
Para Peter Qiu, jornalista em Hong Kong, o conceito central a ser debatido pelas lideranças chinesas deveria ser o do "balanço social". Para manter esse balanço, o governo precisaria estar em condições de deixar os cidadãos felizes, contanto que os recursos financeiros fossem distribuídos de forma justa.
Promessas ao povo
As preocupações a respeito da instabilidade social e o temor de distúrbios é um elemento central da conduta do governo chinês – e já antes dos recentes tumultos no norte da África.
Willy Lam percebe tais receios também no novo plano quinquenal, no qual o governo tenta satisfazer as classes sociais mais baixas, proporcionando às mesmas vantagens pessoais. "O governo diz a elas que grande parte da receita nacional do país é investida no sistema de saúde, na construção de habitações populares, na previdência e por aí vai", analisa Lam.
A ampliação da segurança social é importante para o governo, tendo em vista outra meta sua declarada: o fortalecimento do mercado interno. Pequim quer eliminar a extrema dependência do mercado das exportações, com todas as suas oscilações e divergências com os parceiros comerciais. Mas enquanto os chineses continuarem preventivamente guardando suas economias para serem gastas em tempos de vacas magras, a demanda interna só vai se aquecer lentamente.
Surpresas indesejadas
O Partido Comunista costuma preparar as sessões do Congresso do Povo de nos mínimos detalhes, a fim de evitar surpresas. Nesse momento, as medidas de segurança, já normalmente altas, são acirradas ainda mais. No entanto, alerta o jornalista Frank Sieren, especialista em questões relacionadas à China, de forma tão rígida o governo também não consegue controlar o Congresso do Povo.
"Trata-se de um Parlamento não eleito, uma espécie de pseudoparlamento", diz ele. Mas não se pode esquecer que no Congresso do Povo estão reunidas quase 3 mil pessoas, vindas de diversas províncias do país. E elas, segundo Sieren, levam suas reclamações a Pequim e se intercomunicam a respeito.
Sendo assim, acredita o especialista alemão, é teoricamente possível que os membros do Congresso se reúnam em torno de determinados temas e gerem certas controvérsias, sobretudo nas sessões e conferências do Parlamento. Mas tais cenas só acontecem a portas fechadas. Do lado de fora, quase ninguém percebe nada.
SV/dw/dpa
Revisão: Augusto Valente