CIP é ponto de encontro de judeus alemães refugiados em São Paulo
23 de dezembro de 2012Antigamente, a casa ficava aberta. Hoje, um portão alto bloqueia a entrada do prédio. Quem quer entrar na sede da Congregação Israelita Paulista, conhecida entre seus membros por CIP, precisa tocar a campainha e se identificar perante o porteiro.
São as medidas de segurança comuns em São Paulo, uma cidade onde todo prédio de melhor categoria têm cercas elétricas e arame farpado para garantir a segurança. E onde câmeras vigiam as portarias e os carros ficam guardados em garagens subterrâneas, depois de passarem por dois portões de controle. A taxa de criminalidade na cidade é alta e o medo de sequestros, enorme.
Bem no centro
A CIP fica localizada numa pequena rua, não muito distante da movimentada Avenida Paulista, com suas quatro pistas e suas infinitas torres de concreto, que parecem concorrer umas com as outras para tocar o céu. Em 1936, quando a comunidade judaica na cidade foi fundada, a região ainda era tranquila, sem arranha-céus, sem a poluição deixada pelos carros e com crianças que ainda brincavam nas ruas.
A Congregação Israelita Paulista foi fundada pelo médico alemão Dr. Lorch, que já vivia em São Paulo com sua esposa, Luisa, desde os anos 1920: um homem prestativo, como contam todos os que com ele conviveram. Ele recomendou com veemência muitos amigos e conhecidos, que ainda se encontravam na Alemanha sob o regime nazista, a deixarem o país o quanto antes. E salvou, desta forma, a vida de muita gente. Em 1936, Lorch fundou a CIP, aberta a todos os que chegavam, mas sobretudo ponto de apoio e lugar de conforto para os refugiados alemães vítimas do Holocausto.
Ponto de fuga: São Paulo
Os judeus alemães migravam para São Paulo porque a cidade tinha feições europeias, conta Henrique Cohen, nascido em 1928 em Hamburgo. E também porque o clima era mais fresco do que o do Rio de Janeiro. Além do fato de a cidade oferecer empregos na indústria. Henrique Cohen foi durante 40 anos diretor comercial da CIP. "As pessoas me chamam de 'memória da comunidade'", conta ele com um sorriso. E desta memória fazem parte as histórias sobre os primeiros anos da comunidade judaica na cidade.
Antigamente, lembra Cohen, os funcionários voluntários da CIP recebiam regularmente no porto de Santos os imigrantes que chegavam. E os levavam para São Paulo, onde ajudavam na organização dos documentos necessários, bem como na busca de trabalho. Na sede da CIP, os recém-chegados recebiam o conforto emocional necessário e podiam também se divertir, jogando ou ouvindo música, por exemplo.
A casa que servia de sede à comunidade foi por muitos anos o centro da vida de muitos imigrantes. Ali eles se reuniam nas noites de sexta-feira para o shabbat ou em dias de festa. E havia grupos para mulheres, idosos e crianças. É impressionante como muitos homens ainda hoje se lembram, com um brilho nos olhos, das aventuras de seus tempos de escoteiro.
Comunidade em transformação
Os judeus vindos da Alemanha eram cultos, tinha boa formação educacional e uma consciência acirrada para a justiça e responsabilidade social, diz o rabino Ruben Sternschein, desde 2008 na comunidade judaica de São Paulo. Eles vinham, continua ele, de uma tradição liberal de quase um século, tendo sido formados pelo pensamento de Moses Mendelssohn, Martin Buber, Kant, Hegel e Nietzsche. "Tudo isso eles trouxeram para cá", diz o rabino. Para a comunidade e para a cidade.
A Congregação Israelita Paulista é a maior comunidade judaica da América Latina, com um total de aproximadamente 1500 famílias e 8 mil pessoas. A CIP tem grupos de jovens, idosos e diversos grupos de estudos, além de abrigar diversas festividades durante o ano e sediar cerca de 50 casamentos. Mas algo mudou no decorrer das últimas décadas: os judeus provenientes da Alemanha e seus descendentes integraram-se à sociedade brasileira. A CIP já não é mais o centro de suas vidas.
Hoje, diz o rabino Sternschein, a comunidade enfrenta novos desafios, tendo que se perguntar como o judaísmo pode manter seu significado e como ele pode contribuir para responder às grandes questões do homem moderno. Algumas destas questões estão, por exemplo, relacionadas às formas de vida atuais. "Se encontrarmos boas respostas, teremos sucesso no futuro", prevê o rabino.
Autora: Silke Bartlick (sv)
Revisão: Roselaine Wandscheer