Combate ao terrorismo e direitos humanos: difícil equilíbrio
1 de novembro de 2006"Estamos trabalhando há algumas semanas num projeto-piloto, que está testando uma tecnologia desenvolvida para encontrar automaticamente rostos de terroristas ou outros criminosos, caso estes entram nos trens", anunciou em Munique Jens Puls, diretor do setor de segurança da Deutsche Bahn.
O projeto começou a ser desenvolvido depois das tentativas fracassadas de dois atentados a bomba em trens regionais alemães, em fins de julho último. Segundo Puls, as investigações revelaram que outros atentados haviam sido planejados e teriam sido executados durante a Copa do Mundo, não fosse o alto esquema de segurança no período.
Dados biométricos e informações adicionais
Durante um teste com a nova tecnologia, realizado em Mainz, câmeras especiais escanearam toda a estação ferroviária em busca de 200 pessoas. Estas haviam, anteriormente, aceitado ter seus rostos escaneados e armazenados num banco de dados do setor de segurança da Deutsche Bahn.
Para o procedimento, foi usado um software de reconhecimento facial biométrico. A nova tecnologia deverá ajudar as forças de segurança a localizar suspeitos entre 1,8 milhão de passageiros que viajam de trem na Alemanha por dia.
Em novembro de 2005, a Alemanha introduziu o passaporte biométrico, válido por dez anos e acoplado de um chip que armazena a foto digital. A partir de 2007, serão incluídas neste chip as impressões digitais e, em 2008, dados biométricos como a imagem da íris e informações genéticas.
Conceito de tortura
As constantes mudanças na legislação em nome do combate ao terrorismo vêm preocupando, por outro lado, organizações internacionais e especialistas dentro do país. O Instituto Alemão de Defesa dos Direitos Humanos convidou esta semana políticos e pesquisadores para um encontro realizado em Berlim sob o lema "proteção dos direitos humanos no combate internacional ao terrorismo".
O debate girou, entre outros, em torno da definição do que deve ser considerado "tortura". Mergulhar a cabeça de um interrogado na água, contra sua vontade, é, por exemplo, um método defendido como legítimo pelo vice-presidente norte-americano, Dick Cheney, e considerado tortura pura e simples por organizações como a Anistia Internacional.
Acesso ilimitado à privacidade alheia
Medidas tomadas supostamente para proteger o cidadão vêm se tornando cada vez mais comuns em vários países, inclusive na Alemanha, observaram os especialistas reunidos em Berlim. As novas leis, porém, acabam, com freqüência, cerceando a liberdade do cidadão e seu direito à liberdade. Hoje, na Alemanha, as autoridades, em nome do combate ao terrorismo, têm acesso garantido a dados relacionados a contas bancárias e telecomunicação de qualquer pessoa que venha a ser, em algum momento, considerada "suspeita".
Dificuldades de comunicação
Matthias Sonn, responsável pelo setor de combate ao terrorismo no ministério alemão das Relações Exteriores, concorda que o equilíbrio entre medidas de segurança e o respeito à individualidade do cidadão é difícil de ser encontrado.
O problema, acredita ele, é que a ideologia propagada pelos terroristas "não pode ser racionalmente discutida e resolvida num encontro à mesa, tomando um chá. Estamos no centro – ao lado de outros – de uma hostilidade implacável. Somos vistos [por alguns grupos] como o mal em sua essência", argumenta Sonn.
Erros primordiais
Todo o receio dos atentados, porém, não justifica o desrespeito à individualidade do cidadão, acredita o encarregado de questões ligadas aos direitos humanos do Partido Social Democrata (SPD), Christoph Strässer. O político critica especialmente os mais de quatro anos passados por Murat Kurnaz (cidadão de ascendência turca, nascido na Alemanha) na prisão de Guantánamo.
Strässer acredita que todo o combate ao terrorismo seguiu rumos questionáveis desde o início. Mesmo que o regime anterior à invasão dos norte-americanos no Iraque não correspondesse ao que as Nações Unidas prezam como respeito aos direitos humanos, "antes da guerra o país não exportava terroristas", conclui o político.