Começa o conclave para eleger novo papa
18 de abril de 2005Os 115 cardeais da Igreja Católica reunidos no Vaticano para escolher o sucessor do papa João Paulo II não chegaram a acordo no primeiro dia do conclave. A primeira votação realizada nesta segunda-feira (18/04) não trouxe um novo papa, como indicou a fumaça negra, que saiu da chaminé da Capela Sistina às 20h04 (15h04 de Brasília). Para ser eleito, o papa precisa de dois terços dos votos dos cardeais. E, então, a fumaça que sobe é branca.
A abertura oficial do primeiro conclave do terceiro milênio ocorreu com uma missa na basílica de São Pedro, presidida pelo cardeal alemão Joseph Ratzinger. Em seu sermão, Ratzinger traçou a linha que deve ser seguida na escolha do papa: a defesa da doutrina da igreja frente ao relativismo e aos modismos da atualidade. Após a missa, centenas de fiéis e turistas e acompanharam em telões instalados na praça de São Pedro, a entrada dos cardeais-eleitores de 52 países na Capela Sistina, onde acontecem as reuniões e votações do conclave.
Especulações continuam
Segundo alguns analistas, o conclave começou sem grandes favoritos. Apesar disso e do silêncio imposto aos cardeais nos últimos dias, a imprensa italiana insiste que os cardeais-eleitores estão divididos entre dois papáveis: o conservador alemão Josef Ratzinger e o reformista italiano Carlo Maria Martini. Uma alternativa para Martini poderia ser ainda o moderado arcebispo de Milão, Dionigi Tettamanzi.
"Ratzinger lidera claramente, mas seus apoiadores não estão conseguindo conquistar mais cardeais-eleitores para o seu lado", escreveu o jornal La Repubblica. Ratzinger e Martini são considerados figuras-chave na disputa entre os blocos conservador e progressista. Uma vez esclarecido o rumo a ser dado à Igreja, outros papáveis – principalmente latino-americanos – podem ter sua chance, avaliam vaticanistas. É que os europeus, com 58 cardeais, ainda formam o maior bloco, mas mesmo que se unam em torno de um nome não atingem a maioria absoluta de dois terços dos votos para eleger o novo papa.
Papa de transição
Dois dos 117 cardeais com menos de 80 anos – Jaime Sin (Filipinas) e Adolfo Suárez Rivera (México) – não participam do conclave por motivos de doença. A maioria dos participantes são aposentados: apenas 17 dos 117 têm menos de 65 anos – apenas cinco têm menos de 60 anos. O cardeal mais jovem é o húngaro Péter Erdö, 52, arcebispo de Budapeste. João Paulo II foi eleito com 58 anos.
A Itália tem o maior número de eleitores no conclave (20), seguida pela Alemanha, que tem seis cadeais com direito a voto: Walter Kasper, presidente do Conselho Pontifício para a Unidade dos Cristãos; Karl Lehmann, arcebispo de Mainz e presidente da Conferência dos Bispos Alemães; Joachim Meisner, arcebispo de Colônia; Georg Sterzinsky, arcebispo de Berlim; Friedrich Wetter, arcebispo de Munique e Freising; e Josef Ratzinger, ex-prefeito da Sagrada Congregação para Doutrina da Fé, que, como cardeal mais idoso, preside o conclave.
Segundo os vaticanistas, Ratzinger, que completou 78 anos no último sábado (16/04), é favorecido como papa de transição. Mas não seria um profeta bem-vindo em seu próprio país. "Americanos e alemães vetam Ratzinger", noticiou o jornal italiano La Reppublica, na semana passada. O ex-prefeito da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé teria qualidades indiscutíveis, menos uma: a capacidade de gerenciar a multinacional Igreja Católica. Teme-se que ele transferiria muito poder à Cúria Romana, o que é rejeitado não só por cardeais alemães e norte-americanos.
Um papa latino-americano?
O jornal Corriere de La Sera vê o cardeal reformista italiano Carlo Maria Martini como principal concorrente de Ratzinger. Um confronto entre os dois, provavelmente, terminaria num empate, afirma o jornal. Uma ponte entre os blocos conservador e progressista poderia ser o arcebispo de Viena, o franciscano Christoph Schönborn, de 60 anos.
Diante da divisão entre os europeus, não se descarta a possibilidade se ser eleito um papa africano, latino-americano ou até indiano. O conservador cardeal nigeriano Francis Arinze, no entanto, não acredita muito nessa hipótese. "O Ocidente ainda não está maduro para um papa negro. Um papa africano seria um desafio para a Igreja, o mundo e a mídia", disse. Os 18 milhões de católicos da Índia – no momento, uma das maiores fábricas de padres do mundo – gostariam que o arcebispo de Bombay, Ivan Dias, fosse alçado ao trono de São Pedro.
Já os principais papáveis latino-americanos – entre eles, o brasileiro dom Cláudio Hummes – são considerados fortes candidatos, mas progressistas demais para suceder o pontificado conservador de João Paulo II. Se a eleição fosse direta, Hummes certamente teria boas chances, já quem vem do maior país católico do mundo, com 125 milhões de batizados.
Eleição rápida
Apesar das apostas e especulações dos seis mil jornalistas credenciados no Vaticano, o desfecho do conclave continuará um mistério, até a fumaça branca sair pela chaminé da Capela Sistina. Existe um ditado no Vaticano capaz de anular qualquer previsão: "Quem entra como papa no conclave, sai novamente como cardeal".
O vaticanista Giuseppe di Carli, da Rádio e Televisão Italiana (RAI), no entanto, está convicto de duas coisas: o conclave será curto – os últimos seis duraram, em média, apenas três dias – e o novo papa, provavelmente, adotará o nome de João Paulo III. A eleição é por maioria de dois terços dos votos; somente a partir da 34ª votação pode ser por maioria de 50% mais um.
Surpresas no conclave não são raridade. Prova disso foi a eleição de Karol Wojtyla em 1978, o primeiro papa não italiano depois de 455 anos. Outro exemplo foi a eleição do progressista João XXIII em 1958, como sucessor do severo Pio XII.
Na opinião de alguns vaticanistas, desta vez, a eleição de um revolucionário é pouco provável. A maioria dos cardeais eleitores são "crias" de João Paulo II, isto é, foram promovidos por ele. Nem mesmo um papa africano seria uma garantia de abertura. A maioria dos cardeais daquele continente foram educados em Roma, são considerados conservadores e submissos à hierarquia do Vaticano.
Alemães querem reformas radicais
Essa perspectiva não deve agradar os alemães. Segundo uma pesquisa de opinião realizada pelo Instituto Forsa às vésperas do conclave, 94% dos alemães (não só os católicos) são contra a proibição dos anticoncepcionais pela Igreja Católica e 85% pedem o fim do celibato para padres. "Os alemães tornaram-se mais liberais e defendem posições adequadas aos tempos atuais", diz o diretor do Forsa, Manfred Guellner.
Também os católicos alemães esperam reformas radicais do novo papa: 95% querem a liberação do uso de contraceptivos, 92% aprovam a celebração da Santa Ceia junto com os luteranos, 80% são a favor da ordenação de mulheres para o sacerdócio e 78% desaprovam a rejeição radical do aborto pela Igreja. Uma eventual eleição de Ratzinger - que seria o oitavo pontífice alemão - ou outro papa conservador aumentaria ainda mais o abismo entre o Vaticano e os católicos alemães.