Começa processo para proibição de partido neonazista
8 de outubro de 2002Mais uma vez, o ministro do Interior, Otto Schily, e os secretários de Segurança Günther Beckstein ( Baviera), e Heiner Bartling, (Baixa Saxônia), tiveram que depor sobre o requerimento de proibição do Partido Nacional Democrático da Alemanha (NPD), de tendência neonazista, ou mais especificamente, sobre os desdobramentos de haver informantes infiltrados no NPD. A questão central a esclarecer é: até que ponto os informantes pagos pelo Departamento Federal de Defesa da Constituição (BfV) são responsáveis pelo perfil do mesmo partido, cujas atividades o governo quer agora vedar.
O processo iniciou-se nesta terça-feira (08), sem testemunhas nem as audiências de praxe. Pela primeira vez na história do Tribunal Constitucional, os juízes primeiro convocaram os postulantes para uma "consulta de esclarecimento", em Karlsruhe. De seu resultado depende a continuação ou não do processo.
Segundo dados oficiais, praticamente um em cada sete, dentre os 200 altos funcionários do NPD, trabalhava há anos para o BfV. O fato viera à tona em janeiro deste ano, ao se constatar que um dos 14 funcionários do NPD convocados a depor era também informante do serviço de inteligência. A revelação levou à sustação do processo.
Hitler e o diabo
Desde então, o representante dos neonazistas no processo, Horst Mahler, alega que o órgão de defesa da Constituição haveria manipulado o NPD, numa verdadeira conspiração dos serviços secretos, inclusive da CIA, para acabar com o partido. Segundo ele, o NPD foi tomado como bode expiatório de uma classe política que quer impedir, com todos os meios, a crítica à idéia de uma sociedade multicultural.
A meta seria oprimir o NPD, impedindo-o de participar do sistema democrático: "Adolf Hitler e os seus adeptos representam hoje em dia o mesmo que o diabo na Idade Média", comentou Mahler. Ele rechaça radicalmente a proposta dos postulantes de esclarecer sigilosamente a questão dos informantes, ou seja, somente perante o tribunal, excluindo-se as demais partes envolvidas.
Antes de unir-se à extrema direita, Mahler foi um dos fundadores da Facção do Exército Vermelho (RAF), de extrema esquerda. Por uma estranha ironia, ele e o ministro do Interior se conhecem pessoalmente: na década de 70, Schily foi advogado da RAF, defendendo, entre outros, a terrorista Gudrun Ennslin.
Prática comum
Na audiência preliminar em Karlsruhe, o governo alemão negou haver dirigido os destinos do NPD nos últimos anos, com a ajuda dos informantes. Segundo o representante dos iniciadores do processo – o Parlamento (Bundestag), o Conselho dos Estados (Bundesrat) e o governo federal –, Wolfgang Löwer, os colaboradores foram pagos apenas para fornecer informações. Ao contrário do que alega Mahler, eles jamais foram instrumentalizados para radicalizar o partido e "fabricar" as provas necessárias para a sua proibição: "O comportamento dos informantes não chama a atenção, justamente por estar em consonância com o programa do partido", ressalva Löwer.
Os serviços secretos só revelaram a identidade de oito dos 12 informantes pagos – cujos testemunhos ajudaram a provar a anticonstitucionalidade do partido –, negando-se a desmascarar os quatro restantes, apesar das exigências dos juízes. Os órgãos federais classificam como exagerada a celeuma em torno dos informantes, já que grande parte do material incriminador se comporia de informações de acesso público, como programas partidários e de treinamento. O ministro Schily continua vendo boas chances de uma proibição do NPD.
Raras proibições
Nos 53 anos de existência da República Federal da Alemanha, somente dois partidos foram banidos: o Partido Socialista do Reich (SRP), em 1952, após um ano de processo, e o Partido Comunista da Alemanha (KPD), em 1956. Neste caso, a ação judicial durou cinco anos. Somente o Tribunal Constitucional possui poderes para proibir um partido político. Este é o chamado "privilégio partidário", já que outros tipos de organizações podem ser dissolvidas por um ministro ou secretário do Interior.
Para vetar um partido é preciso comprovar que "suas metas ou o comportamento de seus afiliados visam prejudicar ou anular a livre ordem democrática". Esta ordem básica inclui: os princípios da democracia e do pluripartidarismo, do direito estatal e da divisão de poderes. A legislação também veda a criação de organizações substitutivas, com o fim de dar continuidade ao grupo considerado anticonstitucional.