Comissão Europeia acirra debate sobre benefícios sociais na UE
12 de janeiro de 2014Um posicionamento da Comissão Europeia vem causando polêmica e dominando as manchetes dos jornais na Alemanha desde a última sexta-feira (10/01). Na interpretação de Berlim, Bruxelas condena a Alemanha por ter recusado ajuda social a imigrantes da UE, indo contra, desta forma, uma lei do bloco.
A Comissão formulou sua visão num processo entregue à Corte Europeia. O documento se tornou público na sexta-feira e acirrou o debate em torno do que se convencionou chamar de "migrantes da pobreza".
A facção conservadora União Social Cristã (CSU), do estado da Baviera, vem gerando controvérsias há semanas em torno do tema através da disseminação do slogan: "Quem der o cano, está fora". A referência é o caso de uma romena e seu filho, que vivem permanentemente desde 2010 na Alemanha e tiveram o pedido de ajuda social negado. O tribunal de Leipzig enviou a queixa aos juízes de Luxemburgo para que eles esclarecessem a questão.
"Casa da mãe Joana"
Para a CSU, a exigência de que alemães e estrangeiros provenientes de países da UE desfrutem de mesmo tratamento quando o assunto é ajuda social veio a calhar: em março próximo haverá eleições municipais nas cidades da Baviera e em maio será eleito um novo Parlamento Europeu.
"Os sistemas nacionais de segurança social não são uma casa da mãe Joana para todos os europeus que se mudam para cá", disparou Andreas Scheuer, secretário-geral da CSU em Munique. O político se diz chocado com a forma como a "União Europeia torpedeia os sistemas nacionais de segurança social".
Discussão desagradável
No contrato de coalizão de governo entre o Partido Social Democrata (SPD) e a União Democrata Cristã (CDU), há um capítulo inteiro dedicado ao tema integração e migração. "Queremos manter a aceitação da liberdade de ir e vir dentro da UE. Iremos, por isso, nos posicionar contra o injustificado recurso sobre benefícios sociais a cidadãos da UE", consta do documento.
Não está claro, contudo, de que forma o governo em Berlim imagina que "irá contra" tal situação. Nos próximos meses, um grupo de assessores de diversos ministérios irá se reunir para debater o assunto.
O porta-voz do governo alemão, Steffen Seibert, fez declarações em tom irritado a respeito da postura da UE frente à queixa movida pela romena de Leipzig: "Já disse em nome do governo alemão e da chanceler federal o que tinha a dizer sobre isso: trata-se de um processo em andamento na Corte Europeia, ainda haverá uma negociação verbal sobre o caso. Não quero me estender mais sobre esse assunto", resumiu Seibert.
Bruxelas contradiz
O porta-voz ressaltou, porém, que a legislação que regulamenta os benefícios sociais é questão a ser definida por cada país individualmente. E que a Alemanha irá manter, de início, a prática atual de ser mais restritiva na concessão de tais benefícios, no caso de imigrantes.
A Comissão Europeia, por sua vez, reagiu prontamente na sexta-feira por meio de um comunicado afirmando que a Alemanha não é de forma alguma obrigada a conceder ajuda social a todos os cidadãos da UE desempregados que vivam no país. Notícias que afirmem o contrário são "completamente errôneas", afirmou Pia Ahrenkilde Hansen, porta-voz da Comissão.
No dia 5 de dezembro, a vice-presidente do órgão, Viviane Reding, já havia deixado claro ao Conselho de Ministros do Interior do bloco que a liberdade de circulação entre os países não implica num direito automático de receber benefícios sociais.
Britânicos austeros, holandeses generosos
Nos 28 países-membros da UE vigoram legislações pouco claras a esse respeito. No Reino Unido, um requerente de benefício social tem que passar por uma prova rígida de "comprovação de necessidade". Já os holandeses são mais generosos. A Finlândia, por sua vez, declarou em um documento oficial que ajuda social é realmente apenas o "último recurso" a ser concedido. Ou seja, cada caso acaba sendo resolvido individualmente pelas autoridades municipais.
Em outros países da UE, porém, já aconteceram até mesmo deportações, quando o receptor do benefício acabou sendo acusado de estar sendo "um peso injustificado e excessivo" aos cofres públicos. Uma coisa, porém, é clara: depois que o imigrante europeu tiver permanecido cinco anos no país em questão, ele poderá requerer ajuda social ao governo local sem problemas. A Comissão Europeia alerta que prefeitos podem recorrer a fundos europeus, a fim de sanar problemas financeiros decorrentes de pedidos de cidadãos de outros países europeus.
Rumo à ilegalidade?
Na Alemanha, são as administrações municipais que respondem pela concessão de benefícios sociais. Caso a posição da Comissão Europeia seja de fato confirmada, essas prefeituras terão problema, diz Ulrich Maly, prefeito de Nurembergue, em entrevista à DW. "Aí o governo federal precisaria entrar em ação", diz ele. "Ninguém é contra a liberdade de ir e vir", completa Maly. Mas, para ele, a política social deveria continuar nas mãos de cada país, pelo menos enquanto os benefícios são tão diferentes.
Hermann Genz, responsável pelo setor de trabalho e benefícios sociais da cidade de Mannheim, vê de outra maneira o processo em curso na Corte Europeia, porque em caso de dúvida, o governo federal terá que intervir, acredita ele. "Se negarmos benefícios sociais às pessoas, estaremos empurrando-as para a ilegalidade. Em vez disso, temos é que incentivá-las e apoiá-las", argumenta Genz em entrevista à Deutsche Welle.