Como a Alemanha lida com os tremores de Merkel
11 de julho de 2019Por que ninguém pensou mais cedo nesta simples solução? Durante a cerimônia de recepção à nova primeira-ministra dinamarquesa nesta quinta-feira (11/07), em Berlim, a chanceler federal alemã, Angela Merkel, e sua convidada Mette Frederiksen simplesmente se sentaram em cadeiras. Muito tranquila e sem apresentar tremores, Merkel escutou os hinos nacionais dos dois países.
Na véspera, a líder de 64 anos havia sofrido seu terceiro tremor dentro de poucas semanas, enquanto estava de pé no pátio principal da chancelaria recebendo o primeiro-ministro da Finlândia, Antti Rinne. Pouco tempo depois, ela se apresentou da forma como todos a conhecem por todos esses anos: calma, objetiva e sem grandes emoções.
Com um leve sorriso no rosto, ela afirmou: "Eu estou bem. Já disse outro dia que estou atualmente numa fase de tratamento desde as cerimônias militares ao lado do presidente [ucraniano Volodymyr] Zelensky", quando ocorreram os primeiros tremores, em meados de junho. "Aparentemente, essa fase ainda não terminou, mas há progressos. E eu tenho que viver com isso durante algum tempo ainda. Eu estou muito bem. Não é preciso se preocupar comigo." Merkel disse isso apenas uma hora depois de, mais uma vez, ter tremido intensamente.
A chanceler federal está doente? Suas forças estão chegando ao fim? No dia seguinte ao último episódio de tremores, o maior tabloide alemão escreveu em sua capa: "Simplesmente não para!"
De fato, Merkel recebeu o novo presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, em meados de junho e, no pátio da chancelaria, tremeu violentamente. Nove dias depois, aconteceu novamente, dessa vez no Palácio Bellevue, durante a posse da nova ministra da Justiça: a chanceler federal alemã tremeu, segurou as mãos na frente do corpo, mas logo voltou a seu estado normal.
Sobre o primeiro incidente, ao lado do presidente ucraniano, o governo alemão afirmou que Merkel havia bebido pouco líquido. De fato, o calor havia sido particularmente intenso naquele dia em Berlim. Após o segundo episódio, jornalistas souberam pela chancelaria que a causa poderia ser algum tipo de reação psicológica – o que Merkel agora confirmou oficialmente.
O que parece claro e muito compreensível, no entanto, foi tratado como assunto secreto de Estado pelo gabinete de imprensa do governo. Poucos minutos antes de Merkel afirmar abertamente que teria de viver com o tremor ocasionalmente, sua porta-voz, Ulrike Demmer, ponderou dizendo que estava tudo bem com a chanceler federal.
"Ela participou de todos os seus compromissos da melhor forma nas últimas três semanas", frisou Demmer. E isso é verdade: Merkel não cancelou nenhum compromisso e negociou até altas horas da noite durante a cúpula do G20, no Japão. A líder reiterou: "Estou bem!"
Político doente? Novidade na Alemanha
É novidade que exista uma discussão relativamente aberta na Alemanha sobre o estado de saúde da chanceler federal e sobre como ela se posiciona em relação a isso. Afinal, no passado, comunicações sobre a saúde dos chefes de governo eram uma exceção.
Willy Brandt, chanceler federal da Alemanha pelo Partido Social-Democrata (SPD) no início dos anos 1970, viveu longas fases de depressão sem que os alemães soubessem. Em 1989, pouco antes da queda do Muro de Berlim, Helmut Kohl sobreviveu a uma tentativa de golpe de críticos internos de seu partido numa conferência da União Democrata Cristã (CDU), e isso com uma dor infernal devido a uma doença na próstata. Na época, ninguém ficou sabendo da situação.
Aparentemente, os chanceleres federais sabiam o que estavam fazendo. Os alemães, para quem a confiança na política é um bem valioso, não gostam quando seus líderes ficam debilitados – e, normalmente, também não têm interesse em saber disso.
Na Alemanha, mais do que em outras democracias, os políticos usufruem ainda de uma esfera de privacidade. Em outros países, isso é visto de forma bem diferente: os Estados Unidos, por exemplo, divulgam relatórios com os níveis sanguíneos do presidente. Na França também não é impróprio falar sobre o estado de saúde do chefe de Estado, pelo menos não até hoje.
Mas o exemplo americano mostra também que nem sempre foi esse o caso: os presidentes Franklin D. Roosevelt e John F. Kennedy ficaram gravemente doentes durante seus mandatos, mas a população não ficou sabendo na época.
Agora, a relação entre opinião pública e doença está mudando também na Alemanha, e casos individuais contribuíram para isso. A popular governadora do estado da Renânia-Palatinado, Malu Dreyer, do SPD, sempre falou abertamente sobre sua esclerose múltipla. Ditaduras e democracias controladas dificilmente fazem isso.
Seja no Leste Europeu, Ásia, África ou América Latina, ditadores e autocratas não ficam doentes, pelo menos não oficialmente. Para sustentar essa imagem de líder saudável, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, anda a cavalo com seu tronco à mostra em meio a paisagens rurais.
Na Alemanha, durante as honras militares, Merkel retirou o drama do debate sobre seu estado de saúde. Ela própria disse: "Tenho que viver com os tremores agora."
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