Como a política migratória europeia mudou desde 2015
4 de março de 2020"Vamos conseguir!", era o slogan da chanceler federal Angela Merkel em agosto de 2015, diante do crescente número de refugiados. Pouco depois, por algumas semanas a partir de 4 de setembro, foi possível o ingresso em massa na Alemanha de refugiados, requerentes de refúgio e migrantes, através da Hungria e Áustria.
As críticas ao fato de migrantes não registrados terem entrado pela rota dos Balcãs foram rechaçadas por Merkel alguns dias após sua decisão: "Se agora tivermos que pedir desculpas por mostrarmos um rosto amigável frente a uma situação de emergência, então este não é meu país."
Hoje o tom é outro: os eventos de 2015 – ou seja, o afluxo de quase 900 mil refugiados, requerentes de refúgio e migrantes para a Europa Central – não devem se repetir – é agora o refrão do governo alemão. O "descontrole" de então não deve se repetir, diz a chefe de governo da Alemanha.
Diante dos desenvolvimentos na fronteira entre a Grécia e a Turquia, onde milhares estão aglomerados, Merkel fala agora de um "beco sem saída" em que se encontram refugiados e migrantes. Aparentemente, ela não vê uma "situação de emergência" como a de Budapeste em meados de 2015, quando milhares permaneceram reunidos na estação ferroviária.
2020 não é 2015 – ou é?
O que mudou nesses cinco anos? A União Europeia aposta hoje muito mais na proteção de suas fronteiras externas do que em 2015. Repetidamente os chefes de Estado e de governo decidiram tornar as fronteiras mais impenetráveis para refugiados e migrantes. Numa cúpula em junho de 2018, a defesa e a segregação foram elevadas a objetivos da política comum de migração.
Portanto o fechamento da fronteira por parte da Grécia é consequente. O líder da bancada dos partidos conservadores cristãos no Parlamento Europeu, Manfred Weber, também disse considerar justificado o uso de gás lacrimogêneo contra alguns que tentavam entrar. "A fronteira externa deve ser protegida", afirmou na emissora ARD: se os refugiados jogam pedras, o uso de gás lacrimogêneo é justificado. Além disso, o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, seria o culpado pelo ocorrido, já que ele enviou os migrantes de ônibus para a fronteira.
Nesse ponto há um paralelo com os eventos em setembro de 2015. Na época, o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, enviou os refugiados de ônibus para a fronteira com a Áustria, pressionando Viena e Berlim. Em 2020, Erdogan fez o mesmo, usando os refugiados como instrumento de pressão política.
Hoje, no entanto, a resposta é diferente de 2015: não se deve perder o controle sobre as fronteiras, que devem permanecer fechadas, diz-se. O governo grego chegou a suspender a possibilidade de solicitar proteção ou refúgio. O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) critica o fato como violação das convenções pertinentes e do direito europeu.
Em meados de 2015, a maioria dos países-membros da UE decidiu distribuir provisoriamente, por meio de quotas, refugiados e requerentes de asilo na UE. A Hungria e outros três países votaram contra, e a decisão nunca foi realmente implementada. Cinco anos depois, essa é a opinião da maioria dos Estados-membros: rejeita-se um sistema de cotas permanente, como exigido pelos países na fronteira externa europeia Itália ou Grécia.
Planejava-se reformar o Sistema de Dublin da UE já em meados de 2015. Basicamente ele estipula que o Estado-membro onde houve o primeiro ingresso é responsável pelos refugiados, procedimentos de refúgio e também pelo eventual repatriamento de migrantes declarados ilegais. Na época, Merkel dizia considerar "Dublin" obsoleto. Hoje não se fala mais nisso. Nos últimos anos, as regras da Convenção de Dublin foram detalhadas em alguns pontos, mas em princípio nada mudou.
Também em 2020, a Grécia será a única responsável por todos que lá chegarem, seja no continente ou nas ilhas. Há anos – e ainda mais agora – o país está sobrecarregado com o número de migrantes, mas distribuí-los por toda a União Europeia está fora de questão para os demais Estados-membros da UE.
"Este não é um problema grego, mas europeu", disse a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen. Isso soa um pouco vão, dada a prática política dos últimos cinco anos. As mudanças exigidas pela Comissão da UE nas regras de Dublin, nos procedimentos de refúgio e nos sistemas de distribuição são constantemente rejeitadas pelos Estados-membros.
Nem as imagens de Idomeni, na fronteira da Grécia com a Macedônia no fim de 2016, nem o acampamento improvisado conhecido como Selva de Calais, na França, trouxeram qualquer mudança à situação.
Dissuasão e defesa
"É preciso aceitar que as pessoas não querem mais acolher novos refugiados ou migrantes", disse um político alemão de alto escalão, já anos atrás em conversas a portas fechadas em Bruxelas. É triste, mas verdade, completou, e a política teria que lidar com o fato, não apenas na Alemanha, mas na maior parte da UE. Nos últimos anos, os êxitos eleitorais dos partidos de direita e ultradireita em todo o bloco europeu confirmam essa tese.
Como em 2015, também em 2020 os países-membros da UE se esforçarão em transferir a outros a responsabilidade pela questão da migração e dos refugiados. Grécia, Croácia, Eslovênia, Itália, Hungria, Áustria e outros países do bloco europeu deixaram seguir adiante os que ingressaram em 2015, embora isso infringisse claramente a Convenção de Dublin.
Desde então, muito se fez para melhorar o registro de requerentes de refúgio em seu primeiro país de entrada e impedi-los de prosseguir para outros países da UE. Hoje é preciso perceber que isso só funciona em parte.
Segundo o Serviço de Estatística da União Europeia (Eurostat), a Alemanha e a França são os países da UE com mais pedidos de refúgio por parte de sírios, afegãos e agora venezuelanos no terceiro trimestre de 2019. Na Alemanha, foram cerca de 35 mil requerentes. A maioria deve ter estado em outro país seguro da UE, que seria o responsável por eles segundo o Sistema de Dublin.
Entre 2015 e 2020, a UE desenvolveu vários modelos sobre como as decisões sobre o status de refugiado, procedimentos de refúgio ou mesmo o repatriamento para o Norte da África poderiam ser tomadas já nas plataformas de desembarque ou centros de acolhimento em cidades portuárias do bloco. Nada disso foi implementado. Houve apenas o "acordo" com a Turquia: Ancara concordou, em troca de cerca de 6 bilhões de euros e outros benefícios, em manter migrantes e requerentes de refúgio em seu território.
Do ponto de vista da UE, esse conceito de dissuasão funcionou muito bem até o fim de fevereiro. Mas o que fazer agora que o presidente Erdogan não se atém mais ao acordo? São necessárias decisões, como em meados de 2015, quando Merkel cedeu em poucas horas à pressão da Hungria e aos pedidos da Áustria, declarando que a Alemanha se dispunha a acolher os migrantes.
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